A armadilha dos Top 10 na hora de viajar

Tudo começa com um clichê, que costuma ser uma variação do ditado “ir a Roma e não ver o Papa é o mesmo que não ir a Roma”. Ou seja, não se deve deixar de ver a atração mais importante de uma cidade. Exemplos:

“Você esteve em Paris e não subiu na Torre Eiffel? Que absurdo! Então você não esteve em Paris”.

“Como assim você não viu a troca da guarda, em Londres?”

“Meu Deus! Você não foi ao Louvre? Sério?”

E por aí vai. Na esteira dessa busca pelo mais importante, guias de viagem e sites fazem rankings com os lugares imperdíveis de cada cidade. Quando eu estava na Índia, alguns estrangeiros tinham uma fixação em ver os 10 highlights – ou pontos altos – do país, segundo uma seleção do Lonely Planet.

“Taj Mahal, check. Varanasi, feito. Agora vamos correr pro sul porque a lista garante que precisamos ir ao Kerala.”

É claro que esse tipo de seleção é útil, afinal normalmente os lugares são famosos por algum motivo. O Taj Mahal está no topo de locais imperdíveis da Índia porque é um monumento fantástico. Fato.  Por isso, até aqui no blog você vai achar algumas seleções desse tipo. Já te contamos, por exemplo, quais são as 10 cidades da Índia que mais valem uma visita. Fizemos o mesmo ranking com a Tailândia, além de costumeiramente fazermos uma seleção de pontos turísticos em cada cidade que visitamos.

Dito isso, chegamos ao ponto deste texto: por mais que essas listas sejam importantes e úteis, não é preciso segui-las cegamente na hora de planejar seu roteiro.  Eu já estive em Roma, mas não vi (e nem tentei ver) o Papa. Isso significa que eu não conheço a cidade eterna? Claro que não, só não conheço o Francisco. A mesma coisa vale para Paris. Nas duas vezes em que estive lá, admirei a vista do alto da Torre Eiffel. Se eu não tivesse feito isso, minha experiência em Paris seria menos válida? Provavelmente não.

Há uns meses eu conversava sobre Paris com meu avô. Ele morou na França durante alguns anos e viveu o dia a dia parisiense. E nunca esteve no alto da Torre Eiffel.

“Mas por que não, vô?”

“Ahhh, não fiz questão.” Ele e provavelmente muitos parisienses, gente que nasce e vive a vida inteira na cidade, mas nunca teve curiosidade de subir no mais famoso cartão-postal da casa deles. Para eles, Paris é rotina. Por isso, é óbvio que eles conhecem um pouquinho mais da cidade do que os turistas que ficam só uns dias por lá, mesmo ignorando um ou outro ponto turístico.

Tem quem não queria ir ao Louvre por não gostar de museus. Outros podem não encarar as filas da Torre Eiffel. Ou achar a construção feia. Ou ter medo de altura. Ou preferir investir o tempo em outra atração, tipo tomar um vinho na beira do rio Sena. Ou então nem passar por Paris, por mais que todos garantam que a cidade é linda.

A beleza de uma viagem está nas descobertas, claro, mas também na possibilidade de, uma vez por ano, tirarmos férias de tudo que não nos interessa. São os seus 30 dias. Sua época de relaxar e fazer aquilo que gosta, seja um jantar no restaurante que fica no alto da Torre Eiffel ou tomar uma cerveja em algum bar do Montmartre. Ou então correr para um país pouco conhecido e ignorado turisticamente, mas que tem tudo a ver com você.

Consulte sim os guias e rankings, veja tudo que a cidade oferece de bom de acordo com vários pontos de vista. Esteja aberto ao novo, pronto para fazer coisas que você nunca tinha pensado. Mas, no fim, o mais importante é fazer aquilo que você gosta e te deixa feliz. Numa viagem, o item mais importante de um check list não é fazer alguma coisa para dizer que fez ou porque todo mundo faz, mas realizar sonhos, mesmo que eles sejam diferentes dos desejos da maioria.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

Ver Comentários

  • Oi Rafael!
    O post traduziu exatamente o que estou sentindo ao planejar minhas férias, e me deu mais coragem para realmente seguir pelo que realmente quero e abrir mão do que não quero.
    "Viajar é tirarmos férias de tudo que não nos interessa".
    Obrigada! :)

  • Rafael, quando estive em Paris não tive a menor vontade de enfrentar as horas na fila para subir na torre Eiffel, porque para mim o mais interessante está na visão dela. Para ver toda Paris há uma opção melhor e mais barata, a Montparnasse. Os parisienses costumam dizer que a única beleza da Montparnasse é a visão que nos dá da Torre Eiffel.
    Abraço.

    • Haha! Já ouvi isso mesmo. É a melhor vista da cidade, afinal é o único ponto de Paris de onde você não vê o Montparnasse. ;)

  • Tem toda a razão. Moro em Poços de Caldas, cidade turística (não como Paris, mas...), e a grande maioria dos habitantes nunca entrou no prédio da Thermas Antonio Carlos. No local há banhos com águas sulfurosas, razão da existência da cidade!

    • Isso é sempre assim, Edival. Quem mora muitas vezes não bate cartão em pontos turísticos. Mas nem por isso conhece pouco a cidade.

  • Apesar de gostar de planejar bem meu roteiro, anotar todos os lugares que quero ver, muitos 'imperdíveis' ficam de fora, porque não tenho interesse (nunca vou visitar um estádio, por exemplo, odeio futebol) ou porque na hora não me deu vontade.
    Como em Buenos Aires que não fui ao Caminito nem vi show de tango, e no Rio não fui ao Pão de Açúcar nem Cristo Redentor... nem me arrependo!

    • Cada um tem sua opinião! Fui ao Rio de Janeiro e adorei conhecer o cristo e o pão de açúcar. Fui a Amsterdã e não fui ao museu da Anne Frank, me arrependo profundamente, de não ter enfrentado a fila. Os pontos turísticos tem um Q de especial, sim! Pra mim, valem a pena serem conhecidos!

      • Oi, Cecilia.

        De forma nenhuma este texto quer dizer que não vale a pena conhecer os pontos turísticos. Até porque eu mesmo vejo e adoro conhecer muitos deles.

        A questão aqui é a pessoa fazer o que quer, o que gosta, não apenas ir a uma série de pontos turísticos só porque todos os guias, blogs de viagem e amigos dela dizem que ela precisa ir.

        Sonha em ir ao Pão de Açúcar? Vá! Agora, ninguém conhece menos o Rio só porque escolheu não ir lá. ;) Cada pessoa é diferente e tem suas próprias preferências.

        Abraço.

    • E não tem que se arrepender mesmo, Bethânia. O importante é fazer e visitar lugares que a gente gosta.

      Abraço e obrigado pelo comentário.

  • Oi Rafael, adorei o post! Meu pai é um carioca de mais de 60 anos que nunca foi ao Pão de Açucar. Eu sempre coloco "minha opnião" nas minhas listas ou roteiros pq o que eu possa achar imperdível não é necessariamente para outra pessoa.bjs

    • Oi, Flávia.

      Que bom que gostou do post! E blog tem que ter opinião mesmo, assim ajuda o leitor a entender vários pontos de vista.

      Abraço!

  • Coincidência topar com este post justo hoje. Mais cedo, comentei no Facebook que estava fazendo o que mais gosto em viagens: "gazeteando" os pontos turísticos ditos obrigatórios e bisbilhotando a vida cotidiana de Córdoba. Claro que fui ver a mesquita e o alcazar, mas o que mais fiz por aqui foi bater pernas à toa, sem rumo e não só pela Juderia, onde é "aceitável" andar sem rumo, segundo os manuais de viagem -- e estou usando a palavra "manuais" de propósito. Tem gente que toma os guias e blogs de viagem ao pé da letra e aí eles viram manuais, mesmo. Só que viajar não é operar um equipamento.
    Só subi a Torre Eiffel na minha segunda visita a Paris. E, mesmo assim, porque fiquei três semanas na cidade e meu repertório de vagar à toa estava se esgotando :) Todas as vezes que fui ao Louvre eu tive mais vontade de fugir dos bandos de adolescentes barulhentos do que prazer na contemplação do maravilhoso acervo. Não conheço o Red Light District de Amsterdã, nem a Capela Sistina, nem o cemitério de Perre Lachaise...
    E não é por preconceito, nem por esquisitice. É porque, na hora, meu coração pediu pra eu ir fazer outra coisa.
    Se eu não puder fazer só o que o coração pede quando estou de folga, a vida fica muito sem graça, ne?
    Parabéns pelo post

    • Oi, Cyntia.

      Olha só uma história da época que a gente era mais bobo: Roma foi uma das primeiras viagens internacionais que nós fizemos. No penúltimo dia nos demos conta que não tínhamos passado pela Capela Sistina. A gente até queria, mas num era uma coisa de fazer questão, sabe?

      Acabamos indo no último dia, no meio de uma correira enorme e quando já estávamos esgotados, só porque nossas famílias garantiam que aquilo era obrigatório.

      Hoje eu não faria isso de jeito nenhum. Ia preferir gastar o último dia relaxando e curtindo outras coisas de Roma.

      O bom é que pelo menos a gente aprende com a experiência.

      Abraço!

    • seu coração é bem mandão, heim!
      somente minhas pernas e costas, (e meu bolso) ordenam fazer outras coisas em viagens...

  • Rafael, realmente às vezes a gente fica dividido, como se passar pelas experiências do Top 10 fosse uma obrigação a ser relatada e dividida no blog (nem que seja dizer que não voltaria, rs). Mas a verdade é que, se você se impuser obrigações, não curte o melhor de uma viagem, que é sentir o lugar que você está, e não apenas correr de uma atração à outra para tirar uma foto e dizer que foi.
    Hoje também sou adepta de seguir minha intuição e aproveitar cada momento dentro do meu timing. Cada um sabe o estilo de viagem que o satisfaz e esta, sim, é a verdadeira obrigação quando se viaja: ser feliz lá. Ótima reflexão.
    Bjs,
    Carla

  • visitar o Louvre exige muita paciencia, disposição e amor a arte! conseguimos ficar + - 5 hs no museu, e vimos 1/5 das coisas! conseguimos ver a maioria da arte antiga, como a egipcia, etrusca, e tb os tops, como a niqué, a venus de milus e a gioconda!
    msm 8 dias em Paris, hospedados muito perto, ñ conseguimos ver o père lachaise...passamos em frente e hesitamos ao entrar, pois, queriamos ir na decathlon, e os outros dias passeamos em outros lugares!
    *a decathlon de Paris deixa muito a desejar!
    **conseguimos ver o papa em roma!
    ***londres, taj majal, tô juntando $$ pra isso!

    • Fala, Marcelo!

      Sempre bom receber seus comentários por aqui. Pois é, o Louvre demanda muito tempo mesmo - e mais de uma visita. Para quem gosta de museus, é um ótimo passeio.

      Só fui ao Père Lachaise na minha segunda passagem pela cidade. Um post, inclusive, aqui ainda não apareceu por aqui. Mas em breve devemos escrever algo a respeito.

      Muitas viagens para vocês!

      Abraço.

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Publicado por
Rafael Sette Câmara
Tags: Reflexões

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