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Companhia aérea low cost é realmente mais barata?

“Uma companhia aérea low cost (de baixo custo, ou LCC) quer dizer que os custos dessa empresa são baixos, não necessariamente que as tarifas são baixas” – explica o jornalista e especialista em indústria aérea, Simon Calder, para uma reportagem da BBC. “Uma companhia aérea low cost pode ter tarifas muito altas. Uma companhia aérea de alto custo pode ter tarifas baixas. O que é crucial sobre as low costs é que quando você diminui seus custos, é mais provável que você seja capaz de lucrar e oferecer – na maior parte do tempo – um valor decente para seus consumidores”.

Morando na Europa há pouco mais de dois anos, comprovei algumas vezes as frases acima. Já voei pela Ryanair ou Easy Jet por 19 euros e já paguei 140 euros pela mesma empresa e mesmo trecho (ainda assim, era o mais baixo de todos). E já deixei de voar em empresas do tipo em troca de uma companhia aérea padrão porque o voo da low cost estava muito mais caro. A verdade é que eu prefiro o conforto de não voar low cost, mas estou, na maioria das vezes, disposta a pagar bem menos para ir do ponto A até o B.

Este post, confesso, foi pensando inicialmente para questionar o fato de que as companhias aéreas low cost não necessariamente são tão baratas assim, porque acabam te forçando a pagar mais caro – se eu não viajasse de mala de mão de até 10kg, não buscasse sempre usar transporte público do aeroporto para o centro, não fizesse check in online, não me importasse com onde irei me sentar no avião, provavelmente todos os custos extras sairiam mais caros do que num voo de empresa “comum”, como TAP ou Briitsh Airlines.

Uma matéria muito legal do The Telegraph, em que o repórter deu a volta ao mundo por 1.653 libras, só voando de low costs, conta que 25% do lucro das LCC no mundo vem do custo dos extras nas viagens: marcação de assento mais confortável, check in antecipado, bagagens despachadas, comida no avião e outras coisas que eles colocam como venda casada no site: seguro, aluguel de carro e reserva de hotéis.

Até rifa eles vendem no voo

Ou seja, não necessariamente um bilhete barato é realmente barato. Se precisar levar uma mala maior, tem que pagar com antecedência. Se a sua mala pesar um quilo a mais na hora do check in, esse quilo a mais tem um preço exorbitante. Se você não fizer o check in e imprimir o cartão de embarque, paga mais uma taxa alta por isso. Não tem conversa nem desculpa. Se você quer garantir que vai sentado junto com outra pessoa, pode ter que pagar mais caro para selecionar o seu assento – ou isso será aleatório. Se quer um espaço um pouco maior, também paga.

Não é à toa que 1/4 do lucro dessas empresas sai desses custos extras. Elas fazem de tudo para diminuir os custos de operação e uma parte disso sai do bolso dos clientes. E também é bom lembrar que muitas vezes as LCC voam para aeroportos mais distantes dos centros: ou seja, às vezes você vai ter que pagar mais caro para ir desse aeroporto distante para a cidade. Quem paga o custo da distância é você.

Outra coisa: os embarques das low costs costumam ser mais longos e confusos – isso é, de todas as coisas, a que mais me irrita. Isso acontece na maioria das vezes porque o avião fica o menor tempo possível no solo. Ou seja, o avião chega, os passageiros anteriores descem, eles fazem uma limpeza rápida e você já entra para o voo seguinte. E, por fim, se quiser alterar ou cancelar seu voo, não existe nenhum tipo de reembolso. Às vezes, comprar outro sai até mais barato.

Mas por que não tem companhia aérea low cost no Brasil?

A verdade é que mesmo com todas essas críticas, pago bem barato pelas minhas viagens. E é por isso que eu disse ali em cima que este post começou com essa expectativa de explicar quais são as críticas às companhias de baixo custo, mas acabou mudando um pouco de perfil quando comecei a pesquisa para escrevê-lo, porque toda essa discussão sobre a mudança nas regras da ANAC em relação às bagagens me fez refletir sobre a relação dos brasileiros com aviação.

Duas questões: é impossível para uma companhia aérea low cost de verdade operar no Brasil com as atuais regras de aviação. Isso pensando na definição de low cost lá do início no texto – a Gol e a Azul seriam nossas low cost, em teoria. É impossível uma empresa aérea brasileira baixar seus custos radicalmente como ocorre para empresas europeias, americanas e asiáticas.

Um dos motivos para isso, dentre os milhões que envolvem a gestão das empresas, os subsídios do governo, o preço dos combustíveis, o preço do dólar e o perfil dos consumidores, é justamente uma das polêmicas recentes sobre as regras da ANAC sobre voos: com a obrigatoriedade das bagagens, nunca nenhuma empresa aérea brasileira vai poder se propor a esse modelo de negócios.

A verdade sobre os custos extras das LCC é que eles parecem injustos e muitas vezes tem um quê de “espírito de porco”, principalmente se ficam escondidos nas linhas finas, mas na empresa aérea padrão a gente paga, independente de usar ou não, o custo de cada mala despachada e cada amendoim distribuído – despache você ou não, seja alérgico a amendoim ou não.

Como bem argumentou o Lito Souza, especialista em aviação comercial do blog Aviões e Músicas, até 2002, quando o governo ainda regulamentava os preços das passagens, eles eram muito mais altos: “Ninguém lembra, mas o preço médio de uma passagem aérea em 2002 era de R$ 670,92. O preço médio em 2016 é R$ 322,44 mesmo com a inflação destes anos todos” afirmou ele, criticando a ideia de que o Senado estaria protegendo o consumidor. Segundo ele, 35% das pessoas que voam levam só bagagem de mão (dados de 2015).

Sim, sou a primeira a concordar que é irritante – e às vezes até abusivo – ser cobrada por um copo d´água, não poder levar uma bolsa pequena além da mala (cada low cost tem sua regra de bagagem, já contamos aqui), me sentir o tempo inteiro compelida a gastar mais. Mas, ao mesmo tempo, sou agradecida por poder voar para um monte de destinos pagando pouco.

É, sem dúvida, muito mais confortável voar no Brasil que na Europa. Mas eu, que praticamente só viajo com mala de mão, prefiro mil vezes trocar esse conforto por voos mais baratos. E preferiria apostar na possibilidade de que nos próximos anos a concorrência abaixaria as tarifas (como ocorreu em 2002) do que ter a certeza de que esses 23kg de bagagem vão manter os preços como estão: sem taxa extra nenhuma, mas também sem a possibilidade de escolher pagar menos.

*Crédito fotos: Shutterstock

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Luiza Antunes

Luiza Antunes é jornalista e escritora de viagens. É autora de mais de 800 artigos e reportagens sobre Viagem e Turismo. Estudou sobre Turismo Sustentável num Mestrado em Inovação Social em Portugal Atualmente mora na Inglaterra, quando não está viajando. Já teve casa nos Estados Unidos, Índia, Portugal e Alemanha, e já visitou mais de 50 países pelo mundo afora. Siga minhas viagens em @afluiza no Instagram.

Ver Comentários

  • Meu comentário se extendeu por demais. Outra observação: o dono da Rayanair foi entrevistado pela TV israelense e afirmou q no futuro os vôos serão gratuitos (!!). O custo será coberto por fornecedores de serviços com "vendas casadas". Serão oferecidos pacotes incluindo hotel, vôo, carro e etc.
    Na realidade, hj há 1 série de pacotes q se vc tentar montar sózinho sairá bem mais caro do q o oferecido na Net.

  • Oi, gente.
    Como estou fora do Brasil há quase 5 decadas posso apenas comentar sobre o low cost no Exterior.
    Eu pessoalmente ainda prefiro o sistema antigo. Há 1 série de formas de busca de vôos baratos, não necessariamente low cost. O temoo de vôo, as trocas de aviões, a distancia minima entre as filas (gordo de estatura média é suficiente para 1 péssima viagem...) e outros quesitos mais não justificam a provavel economia. Por exemplo eu poderia ter comprado passagens TLV-LIS-TLV por apenas $195/pax, antes dos acrescimos. Indo pela Ucraina com mais de 20 hs ao invés de menos de 10 hs pela Alemanha. O custo da Ukranian seria ao final das contas cerca de $280/pax. Paguei +$80/pax incluindo bagagem, marcando lugar em todas as "pernas" e tendo 1 responsavel por qq problema (atraso para conexão, tempo, greve e etc).
    Como disse, é tudo 1 questão de escolha pessoal

    • Oi Yaron,

      Tb acho que é uma questão de gosto pessoal. Eu gosto de viajar com a Ryanair? Sinceramente, não. Mas muitas vezes, é a única opção que eu posso pagar. E eu nunca levo mala despachada, então para mim nunca tneho esse custo extra.

  • Nao existe companhia low cost porque existe um lobby no paìs das companhias áreas e também porque nao ha associação de defesa do consumidor como temos em vários paises na europa.
    A unica companhia low cost que existiu no brasil era a webjet, so que foi autorizada a venda da da webjet a Gol, Gol comprou e deixou falir a Webjet voluntariamente para eliminar a concorrência low cost. O governo nao deveria ter autorizado essa venda pois a webjet era a única companhia low cost do paìs, que seja a gol ou a azul temp precos absurdamente altos e ainda a gol nqo tem nem vergonha de oferecer servico low cost fazendo pagar as bebidas e comidas.
    Na epoca da webjet conseguia viajar por um valor muito bom. Esses ultimos anos o preco das passagens so subiram e bastante as vezes ate triplicou enquanto o preco do petróleo no mercado internacional estava baixo como nunca. Consumidor brasileiro so é explorado como sempre.

  • Na teoria isso seria muito bom. Atualmente eu pago um valor X pela bagagem despachada, mesmo não fazendo isso. Na prática, com a alteração, eu continuaria a pagar o valor X sem despachar a mala. E quem vai despachar, paga X + Y (valor adicional para despachar malas). Se houvesse algum tipo de fiscalização sobre o preço das tarifas, se realmente houvesse uma redução, seria o primeiro a apoiar. Num panorama geral, apoio todas essas mudanças da flexibilização do mercado da aviação no Brasil. Mas quando a gente vai pensar na prática, parece que o consumidor vai ser lesado não importa o que aconteça. :/

    • Oi Matheus,

      O problema é que em 2002 as pessoas tinham o mesmo discurso que não iria abaixar o preço sem a regulação e o preço caiu pela metade. Do jeito que está não só não vai mudar, como impede qualquer empresa nova de investir realmente no modelo de low cost no Brasil

  • Eu falo que a ideia deles de não ser obrigatorio que bagagens despachadas sejam de grraça ótimo DESDE que as empresas deixem as passagens mais baratas. Afinal concordo com você hoje quando viajamos pelo Brasil despachando ou não mala estamos pagando por isso.

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Luiza Antunes

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