São 7h30 da manhã no Brasil, nem um minuto a mais ou a menos para tomar banho, terminar de fechar a mala, tomar café da manhã e seguir minha jornada. Claro que esse cálculo de tempo não conta também os imprevistos, esses que sempre teimam em acontecer. O dessa manhã foi especialmente ruim. O elevador, aquele que nos levaria do sexto andar até a garagem, estava quebrado.
Isso tinha que acontecer justo naquela viagem, a primeira desde 2009 em que eu carregava duas malas pesadas. Eu, a defensora do fim da permissão de duas malas de 32kg, estava com uma mala de 18kg e outra de 27kg, além de uma mochila que devia estar pesando uns 7kg ou 8kg. Basicamente toda a minha mudança. Lá fomos nós, eu e minha mãe, cada uma com uma alça em mãos, descemos os não-sei-quantos degraus, só para depois subi-los novamente e descer tudo de novo com a outra mala.
Passado esse sufoco, um tanto quanto suadas, seguimos para o Aeroporto de Confins. Novamente um pequeno esforço para colocar as malas do porta-malas para o carrinho. E em seguida do carrinho para a esteira no check-in. Ufa, estava livre daquele peso até chegar no meu destino. Ou melhor, ainda não: “Você precisará pagar a peça extra”, disse a funcionária da cia aérea, com seu sotaque espanhol carregado.
“Mas como?” Pergunto eu, incrédula. “E a tal regra brasileira sobre bagagens? Tá aqui, escrito no site”, digo e mostro para ela o aplicativo da outra cia aérea, a internacional, que me vendeu as passagens, sobre a exceção brasileira. Ela chama o supervisor, que explica o problema: como comprei um voo que saiu de Portugal para o Brasil, a lei que valia para a minha bagagem era a europeia, não a brasileira. Por lá, mala extra, só pagando.
Lá fui eu para o outro lado do saguão ver quanto seria a facada ao mesmo tempo em que esperava o call center da empresa estrangeira me dar uma resposta sobre a confusão de tarifas. Fui atendida ao mesmo tempo, no telefone e pessoalmente. Ambas as vozes, a da minha frente e a no celular, com a mesma resposta: não tem jeito, vai ter que pagar. E foi assim que eu fiquei 370 reais mais pobre para me livrar daquele peso todo.
Uma hora depois, a primeira parte da viagem concluída: aeroporto de Guarulhos. As seis horas de espera até o voo seguinte foram apaziguadas pela possibilidade de almoço com amigos. Encontrei com o Rafa no saguão do aeroporto – ele faria um bate-volta em SP para um compromisso do blog – e de lá fomos para o Mocotó almoçar com outro amigo, o Ismael.
Na hora de ir embora, depois de mais uma despedida até-breve-não-sei-quando, vejo que meu motorista do Uber é, na verdade, ela. Daniela me conta, animada e um pouco atrapalhada, que é seu segundo dia trabalhando. Havia passado quase sete meses desempregada, cuidando da avó que ficou doente. “Ela era quase minha mãe”. A avó, por coincidência do destino, era portuguesa. E deixou uma herança cá na terrinha para a família. Ela, a filha, a irmã e a mãe viriam a Portugal cuidar do inventário em junho. Queriam talvez se mudar de vez para o país.
Quando ela soube que eu estava a caminho do aeroporto para voltar para Portugal, se empolgou tanto na conversa que erramos o caminho duas vezes. “Tudo bem, ainda tenho bastante tempo até meu voo”, expliquei. Quando chegamos de volta em Guarulhos, dei a ela o último cartão do blog que tinha na bolsa e desejei sucesso. Ganhou nota 5 e uma tag de “boa de papo”.
E então só faltavam duas horas para embarcar, que passaram até rápido. O embarque também foi bastante rápido, condizente com a eficiência suíça da cia aérea. Já o avião, bem, podia ser melhor. Era velho. A enorme simpatia e prestatividade dos comissários de bordo não mudavam o pouco espaço para as pernas e, pior ainda, meu sistema de entretenimento de bordo que teimava em se desligar a cada 10 minutos de filme. Sugeriram me trocar de lugar logo após o serviço de jantar, mas não foi preciso. Alguns minutos depois, metade do avião estava sem entretenimento de bordo funcionando. Troquei o filme dublado por duas garrafinhas de vinho e a promessa de uma noite inteira dormindo.
Acordei faltando duas horas para o pouso. Como as telas a nossa frente não funcionavam, restava fazer o que era utilizar o arcaico método de entretenimento que é bater papo com desconhecidos. Felizmente, a moça do meu lado merecia, tal qual a motorista da Uber, 5 estrelas e a tag de boa de papo. Morava há muitos anos em Berlim e ficamos falando sobre a vida de imigrante. Só paramos para comer o café da manhã e observar a gloriosa vista na janela. Põe gloriosa nisso, aliás. Pois nunca tinha visto os alpes assim, com vista panorâmica.
Minha aventura não tinha acabado, porém. Perto da hora do pouso descobri que teria 50 minutos para trocar de terminal e pagar meu próximo voo. Não adiantava pedir licença para os passageiros dentro do avião, então me restou correr e desviar nos corredores do aeroporto de Zurique até o primeiro obstáculo: o Raio X. Claro que com o pouco tempo que eu tinha, era a minha mochila, aquela pesada e lotada, que eles iam querer revistar meticulosamente. Quando acabaram de verificar cada bolsinho, já tinham se passado uns 15 minutos e eu ainda tinha que recolocar cada um dos objetos na posição correta para conseguir fechar aquela coisa.
Segui correndo até a próxima parada: imigração. Com sorte, não tinha nenhuma fila. E não perguntaram nada, carimbaram meu passaporte em menos de três minutos. Segui correndo escada rolante acima para o ponto do trem do aeroporto e mais uma correria até achar o meu portão de embarque – que sempre parece ser o mais distante possível. Cheguei faltando 10 minutos. Vitória. E então foi mais um voo e mais alguns alpes para avistar pela janela, até desembarcar em Lisboa.
Apesar da jornada de aeroporto estar terminando ali, ainda me restava mais uma escala por terra – a de Lisboa para Coimbra. Mas antes, claro, teria que recuperar as minhas queridas malas. Claro que meu instinto ansioso me dizia que elas haviam sido extraviadas. O elevador quebrado, o excesso de bagagem, a escala apertada. Tudo isso fazia com que o sinal vermelho apitasse na minha cabeça. Não ajudou nada também que os meus dois trambolhos vermelhinhos não aparecessem na esteira nos primeiros 10 minutos. Na verdade, nem nos 50 minutos seguintes. Fiquei exatamente uma hora plantada lá esperando minhas malas chegarem. Só não fiquei mais desesperada porque boa parte do meu voo também estava esperando.
Chegaram as bagagens, afinal. E depois disso ainda veio uma corrida de Cabify – dessa vez um motorista português gago e simpático que fez questão de estacionar o carro e me ajudar a levar as malas até o ônibus – uma viagem de duas horas até Coimbra. Mais uma viagem de táxi até a casa de uma amiga para ela guardar a mala mais pesada, e depois três lances de escada acima para chegar na casa do namorado, tomar um banho e tirar um cochilo para descansar às 17h30 em Portugal, quase 30 horas depois de sair de casa.
*Por Silvia Paladino No dia 12 de outubro de 2023, eu cheguei ao acampamento base…
– Aí estão vocês, eu estava esperando! Venham!, disse, apontando para um beco que parecia…
Chegar no povoado Marcelino é uma atração à parte na visita aos Lençóis Maranheses. Depois…
A Domestika é uma comunidade criativa e que oferece diferentes categorias de workshops: do desenho…
“Na Pedra Furada, abaixo de um local onde havia pinturas, escavamos tentando encontrar marcas do…
“Muita gente acha que comer saudável é cortar açúcar, por exemplo, entrar num mundo de…
Ver Comentários
Parabéns pelo blog e que viagem, muito bem contada, adorei. Os três são contadores de histórias...
:)
Não consigo entender porquê as cias aéreas colocam as escalas com intervalos tão apertados!!! Que raiva a gente ser obrigada a correr no aeroporto! Qdo Fábio e eu voltamos de Portugal, quase perdemos o voo que saía de Paris pro Brasil, pq nosso avião pousou exatamente na hora do embarque do próximo voo... que infartei pra chegar. Qdo chegamos, o voo estava encerrado, mas conseguimos embarcar mesmo assim. Beijão! Adorei o relato detalhado!
Eu tb não entendo não. Na verdade, se os dois voos forem comprados juntos e vc perder por culpa da cia, eles que tem que se virar para resolver. O problema é ficar ainda mais tempo esperando ne?
bjs
Adorei o relato. como sempre, texto primoroso. E que aventura!!!! Parabéns...
Obrigada Daniela
Quando terminei ler fiquei até sem fôlego hahaha
Ufa! Chegar é sempre um alívio – que estresse os voos e traslados, né?
Ah, algumas imagens do post não estão carregando.
:)
Obrigada por comentar Daise!
Vou checar essa questão das imagens