Como é a vida das mulheres na Índia

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Perguntei a uma colega de trabalho, grávida de nove meses, se ela já sabia o sexo do bebê. Uma pergunta, pensei eu, inocente, para saber mais sobre a gravidez.

A resposta veio com um olhar assustado:

– Não posso saber o sexo do bebê. É contra a lei.

Demorou uns dez segundos para cair a ficha: é contra a lei. Uma lei que existe para evitar uma taxa assustadora de infanticídio feminino. A Índia matou mais de 10 milhões de bebês mulheres nos últimos 20 anos.

O Punjab, localizado no nordeste do país, tem a maior taxa de nascimento de homens versus mulheres na Índia e supera até mesmo as conhecidas taxas chinesas.

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Dados sobre a vida das mulheres na Índia

Segundo o Censo Indiano de 2011, a taxa de nascimento de meninas em relação a de meninos é de 914 para 1000. Segundo o jornal The Times of India, isso significa que para cada 1000 meninos, cerca de 70 meninas menores de seis anos são mortas.

Ainda segundo o jornal, a diferença de nascimentos entre homens e mulheres é mais discrepante nas áreas mais ricas e com maior índice de educação.

Mulheres na Índia

Ao sair do aeroporto de Délhi, você tem a impressão de que existem muito mais homens do que mulheres nas ruas. A impressão se traduz em números. São 623.7 milhões de homens e 586.5 milhões de mulheres. Matemática simples: são 6,3% de homens a mais.

Apesar da diferença porcentual não ser tão alta, a verdade é que não há tantas mulheres nas ruas. Durante o dia, elas andam em grupinhos, criando verdadeiros Clubes do Bolinha e da Luluzinha da vida real. Na estação de trem ou na rodoviária, a impressão que temos é que são cinco mulheres e 9832 homens.

Mulher indiana

O conselho que ouvi antes de viajar e agora reforço para qualquer mulher que deseja se aventurar pela Índia é não venha sozinha, a não ser que você já esteja bastante acostumada a fazer viagens do tipo por conta própria.

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Se você prestou um pouco de atenção nos dados que eu falei no começo do texto, deve ter entendido que essa é uma sociedade bastante machista. E isso vai das pequenas coisas que vemos no dia a dia até as grandes coisas que de certa forma são institucionalizadas.

A questão do dote e casamentos indianos

Existe um provérbio na Índia que diz “Raising a girl is like watering the neighbour’s garden”. Ou em bom português: “criar uma menina é como regar o jardim do vizinho”.

As mulheres são criadas para se casarem. E se casar significa ter um casamento arranjado. E que a família vai ter que bancar uma incrível festa que dura uns três dias e, apesar de ser uma prática criminosa desde 1961, pagar pelo famoso dote.

Família na Índia

O dote gera outro tipo de crime muito comum: o assassinato de noivas. Uma estatística de 2008, feita pelo escritório nacional de dados sobre crime (NCBR) diz que 8.172 mulheres foram assassinadas naquele ano vítimas do crime do dote.

A maioria dos casos, entretanto, não é sequer reportada à polícia, é tomada como acidente – como jogar uma panela de óleo na noiva e colocar fogo enquanto a sogra “ensina” a nova nora a cozinhar.

Tão triste e comum que existe até um jogo no Facebook para conscientizar a população, mostrar que as noivas são boas pessoas e podem te fazer bem. Ou seja, por isso você não deveria cobrar uma fortuna para se casar, ou muito pior, matá-las.

Diferenças entre homens e mulheres

Apesar de atualmente as mulheres trabalharem tanto quanto os homens e estarem nas empresas ocupando cargos equivalentes, elas ainda são vistas como inferiores.

A mulher é tão desvalorizada que, na estação de esqui que visitamos no final de semana, o seguro para o caso de acidentes era assim: 1 milhão de rúpias para mulheres, 5 milhões de rúpias para homens.

Mulheres na Índia

Na rua, homens fazem xixi onde querem, se vestem como querem, falam e riem quando querem. As mulheres são contidas e tímidas. Não podem deixar nada do corpo de fora, nem andar por aí com o cabelo solto.

As mulheres são criadas recatadamente para se casarem e ficam trancadas em casa na maior parte do tempo para se preservarem. A maioria das colegas de trabalho que tivemos em Chandigarh fica em casa aos finais de semana. Segundo relato de uma moça, o pai não deixa ela sair em eventos como por exemplo, o réveillon ou o Holi. O motivo? É muito perigoso.

A vida das mulheres na Índia

Já ouvi casos de meninas que passaram pela desagradável situação de ver homens se masturbando na frente delas. E o pior deles, de mulheres que são assediadas em grandes aglomerações, seja em ônibus, trens lotados ou numa festa. Ainda segundo dados do NCBR, em 2018, foram registrados 33.977 casos de estupro em todo o território indiano. Um dado bastante subnotificado.

Combate ao machismo

É importante dizer que todas as questões relatadas não resumem o país e nem é a realidade de todos os homens e mulheres na Índia.

Afinal, são 1.2 bilhão de habitantes, uma cultura muito rica e cidades lindas e interessantes. Isso, aliás, não é exclusividade da Índia, uma vez que várias coisas descritas ali em cima também acontecem no Brasil – machismo e misoginia são uma epidemia global, infelizmente.

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As soluções encontradas pelas autoridade indianas são separar as filas de homens e mulheres, ter vagões especiais e cadeiras exclusivas nos ônibus e trens ou proibir que o ultrassom revele o sexo do bebê.

São todas medidas necessárias, mas que não mudam uma cultura geral na qual a mulher vale menos, que só gera custos, vai abandonar a família para se casar e, se tiver um bebê mulher, é uma vergonha para a família do marido. E que as estrangeiras são putas.

Os indianos com que convivo, no meu trabalho e em minha casa, se mostram tristes e impotentes com esses relatos. Ficam envergonhados com essas situações. Infelizmente, uma parte da rica cultura milenar deste país não é motivo de orgulho para ninguém.

Mulheres na Índia

Quanto a quem vem visitar a Índia, valem os cuidados que eu aprendi a ter por aqui. Não usar roupas curtas, nem decotadas, nem com os ombros de fora. Evitar grandes aglomerações de gente, principalmente quando elas incluem muitos homens. Não ficar na rua à noite. Só viajar sozinha se você tiver muita experiência.

A perda de liberdade, a sensação de estar sendo encarada o tempo inteiro e de ter que conviver com os fotógrafos de plantão são bem ruins. Mas, por outro lado, (realmente não estou tentado amenizar, é verdade) superando esse fato é possível ter uma experiência enriquecedora, aprender a cultura e conhecer pessoas fantásticas nessa incrível Índia.

Saiba como funciona o sistema de castas na Índia.

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Luiza Antunes

Luiza Antunes é jornalista e escritora de viagens. É autora de mais de 800 artigos e reportagens sobre Viagem e Turismo. Estudou sobre Turismo Sustentável num Mestrado em Inovação Social em Portugal Atualmente mora na Inglaterra, quando não está viajando. Já teve casa nos Estados Unidos, Índia, Portugal e Alemanha, e já visitou mais de 50 países pelo mundo afora. Siga minhas viagens em @afluiza no Instagram.

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172 comments

Gostaria de saber se voce pode me informar como é a vida economica de uma mulher na India?? Se elas trabalham, ou quantos % ganham a menos que os homens….

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Minha filha, de 19 anos, viaja na semana que vem para a India para um intercâmbio de 4 meses. Confesso que fiquei um pouco (muito) assustada com o que li. De qualquer forma, sabíamos que ela teria que tomar cuidado. O que me preocupa é que o choque é tao grande que talvez minha filha nem perceba algo que não possa ser feito, justamente porque aqui no Brasil isso é normal. Choque e desabafo a parte, espero que tudo ocorra bem nessa viagem, até porque a riqueza cultural é imensa. Valeu!

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Oi, desculpa incomodar… Estou fazendo um trabalho sobre a Índia e vi que no seu texto você cita um jogo no Facebook mas não fala o nome. Teria como você me falar, por favor. Queria colocar como curiosidades no meu trabalho… Desde já, agradeço!!!

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boa tarde estou namorando um indiano há aproximadamente 1 ano ele queria que eu fosse pra índia conhecer ele só que ainda não sei falar a língua deles por isso optei pra ele vim ao Brasil primeiro e ele concordou e e está vindo agora em janeiro você acha que fiz a escolha certa ?

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oi suziane eu também estou nakorando um indiano mais eu não sei falar a lingua dele ! por favor se o seu namorado vim ao brasil me fala ..meu Email . elainnyferreira2015@gmail.com
quero muito conhecer a india mais tenho medo , se vc um dia for para conhecer eu quero ir junto com vc apezar de nós duas não se conhecer mais eu gostari muito . meu fone 62 9122-1545

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Fiquei horrorizada! Nunca me senti tão feliz por ser brasileira

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Oi gente, tudo bom?Estou pretendendo ir para india com meu namorado em outubro, porem eu AMO muito usar vestidos e shorts (nada muito absurdo de curto, mostrando a polpa da bunda e etc), mas curto nos padrões conservadores. O que devo fazer?Eu vou evitar usar nos lugares mais conservadores, mas infelizmente não consigo abrir mão do que gosto de vestir, pois sou muito preguiçosa, então sempre opto por um vestido HAHAHA Me ajudem, porque os olhares dos homens eu posso até aguentar, afinal, andar de saia no Brasil ultimamente é quase sair pra guerra, mas tenho medo de abuso, mesmo estando com meu namorado. Mais uma vez, o que devo fazerrrr?

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Luiza, conheci o blog hoje e estou adorando ler os posts de vocês.
Estou querendo fazer um intercâmbio voluntário de 4 semanas para a Índia no início de 2016 (quero trabalhar com crianças e também conhecer alguns pontos turísticos), mas agora fiquei com medo 🙁
Irei sozinha (mas por agência), só que fico meio assim pq fico pensando “Será que terá alguém que vai na mesma época que eu? ou ficarei sozinha por 4 semanas na índia?” Realmente não sei pq nunca fiz intercâmbio e até o presente momento nunca viajei para o exterior.

obs: A princípio ficarei 4 semanas pq irei aproveitar as férias do meu trabalho, inclusive fiquei sabendo da AIESEC pq uma menina que “conheço” fez um trabalho voluntário na Índia agora em fevereiro e foi o que me animou mais ainda e me deixou com muita vontade de fazer também, mas o mínimo são 6 semanas pela AIESEC 🙁 então provavelmente irei fechar com uma agência (um pacote de trabalho voluntário + turismo), mas antes quero pesquisar muito bem e até quero ver se descubro alguém que já fez esse tipo de intercâmbio (de preferência por essa agência que estou pesquisando).

Aguardo suas dicas 🙂

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Oi entre em contato comigo, tenho interesse em ir, mas nao quero ir só, elyemathews@gmail.com

guardo retorno
Bjs

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OI gente, também estou interessada em ir sozinha, mas bateu preocupação agora. Gostaria de manter contato, quem sabe a gente possa ir juntas?
Aguardo o retorno.

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Oi Leila bom dia entre em contato comigo, pelo e-mail: elyemathews@gmail.com, você pretende ir quando?

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Que horror… nem de graça eu visito esse país… ou qualquer outro onde mulheres são tratadas como lixo.

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estou apaixonada por um indiano ele quer casar em Bangladesh estou com medo porque não falo Inglês ,nem ele sim quero que me ajudem o que fazer ?

alguém sabe me falar o que e give me bissau ?

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Cícera, tome muito cuidado! Não fique encantada apenas pelo fato do cara ser estrangeiro e estar propondo casamento. Pode ser muito perigoso. A pessoa que está do outro lado da tela pode ser qualquer um…inclusive um agente de tráfico de mulheres para prostituição, um dos negócios que mais dá dinheiro no mundo, infelizmente. Ou não, claro… Pode ser que seja um cara apenas que quer uma namorada. Mas tome cuidado, menina! Não é fácil sair do seu país e encarar uma vida numa cultura diferente, sem família e outras pessoas que você conheça. Na Índia existe muito machismo e a vida das mulheres por lá não é de todo um mar de rosas…. “Give me” significa “Me dê”…”bissau” eu não sei.

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* um dos negócios que mais dá dinheiro no mundo PARA OS TRAFICANTES. As mulheres usadas como prostitutas são escravizadas.

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Oi Luiza, adorei o blog e encontrei muitas dicas sobre a Ìndia. Estou indo para Shennai/ Madras com meu namorado que vai a trabalho. Você teria algumas dicas da região como costumes, modos de vestir e alguns pontos turísticos?
Obrigada pela atenção, Bianka

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