*Atualização: Tem uma discussão muito interessante na caixa de comentários sobre as graves falhas históricas na exposição da Casa dos Terrores em Budapeste. Sugiro que vocês dêem uma olhada na conversa.
O nome lembra aquelas atrações de parque de diversões: uma casa mal-assombrada em que pessoas fantasiadas ficam escondidas pelos cantos, prontas para te dar um susto. Mas a verdade é que a Casa do Terror (Terror Háza, em húngaro) é bem mais assustadora que isso. Exatamente porque, ao contrário dos parques de diversões, ali não tem nada de divertido. É um endereço onde pessoas viveram terrores reais, desses de deixar qualquer um apavorado.
Em 1944, na Av. Andrássy, n. 60, funcionou o quartel general do partido nazista húngaro, chamado de Arrow Cross. Depois, entre 1945 e 1956, quem assumiu o comando do endereço foram as polícias de terror comunistas: a ÁVO e ÀVH. Com isso, o museu e memorial Casa do Terror homenageia as vítimas desse período e serve como lembrança desse passado terrível e não tão distante assim.
Foto: divulgação TerrorHaza
Esse foi um dos passeios que eu mais gostei de fazer em Budapeste. Por mais terrível e doloroso que seja, eu gosto muito de estudar a história do século 20. E toda a montagem da exposição é bem feita para ser informativa sem ser cansativa, com muito material multimídia.
Curioso é saber, por exemplo, que a avenida Andrássy é um Boulevard chique em Budapeste. Ligando o centro à Praça dos Heróis, ali ficam residências elegantes, lojas caras, restaurantes finos e até a Ópera da cidade. Mas foi ali que os dois governos ditatoriais escolheram para posicionar o quartel general de suas polícias de terror. O prédio do número 60 foi construído em 1880, por um arquiteto famoso. Ou seja, mesmo com os horrores que ocorriam ali dentro, por fora, essa era uma bela casa que se misturava na paisagem.
Foto: Shutterstock
O Partido Nacional Socialista da Hungria alugou o espaço em 1937. Para quem não está reconhecendo esse nome, esse era o partido nazista do país. Seu símbolo era a Arrow Cross, uma cruz com as pontas em forma de seta, e o líder um homem chamado Ferenc Szálasi. Foi ele quem deu o nome à casa de “Casa da Lealdade”.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o governo húngaro apoiou os nazistas alemães com o objetivo de tentar recuperar o território perdido por conta da Primeira Guerra (até hoje, aliás, tem húngaro reclamando que a Transilvânia é deles). Com esse alinhamento, a Hungria fez com que os judeus do país usassem insígnias como a estrela amarela, para marcar sua condição, e fossem forçados a viver em guetos.
Foto: divulgação TerrorHaza
Em 1944, a Hungria, cada vez mais desesperada, faminta e sofrendo derrotas terríveis contra o exército soviético, começou a querer sair da guerra. Os alemães não gostaram nada dessa ideia e acabaram invadindo o país e derrubando o então Primeiro Ministro. E foi assim que começou o curto, porém sangrento, domínio da Arrow Cross.
Eles estavam determinados a exterminar todos os judeus da Hungria. Em oito meses, só em Budapeste, a população judia diminuiu de 200 mil para 70 mil pessoas. Foi também nesse período que pessoas eram alvejadas na beira do Danúbio, durante o inverno, deixando apenas seus sapatos para trás. No subsolo da “Casa da Lealdade” centenas de pessoas eram torturadas e assassinadas.
Foto: divulgação TerrorHaza
E então a guerra acabou, mas não o reinado de terror. Em 1945, a Hungria foi ocupada pelo exército soviético. Uma das primeiras atitudes durante a entrada das forças armadas foi tomar o prédio na Andrássy 60. O antigo quartel general da Arrow Cross passou a ser o Escritório de Segurança Estatal (ÁVO) e depois Autoridade de Segurança Estatal (ÁVH).
Foto: divulgação TerrorHaza
O líder que comandava tais organizações era Gábor Péter. A lógica de seu poder era reduzir pessoas a sujeitos que tinham medo da política soviética e, em consequência, tinham medo umas das outras. A ordem geral era matar sem hesitação, torturar brutalmente em interrogatórios e mandar inimigos e vítimas para a forca, prisão ou campos de trabalho forçado (muitos desses aproveitados dos antigos campos de concentração nazistas).
Foto: divulgação TerrorHaza
Além disso, o governo transformava pessoas em informantes. Não se podia confiar em ninguém ou falar nada fora da linha sem que alguém soubesse. No final do regime, pelo menos uma pessoa a cada três famílias foi morta, abusada ou aleijada pelo regime comunista na Hungria.
Foto: divulgação TerrorHaza
Com o passar dos anos, a ÁVH cresceu para além da casa no Andrassy 60. Em meados dos anos 1950, já ocupava todo o quarteirão, com os porões dos prédios vizinhos formando uma labirinto de celas. Somente em 1956, após a revolução, que a agência deixou o endereço.
A visita a Casa do Terror em Budapeste
Desde que foi transformada em museu, em 2002, a Casa do Terror conta detalhes de toda essa história. A exposição é dividida em quatro andares, com objetos, videos, fotos, esculturas e instalações multimídia. É recomendável ter pelo menos duas horas para visitar tudo. E se prepare para encontrar fila na porta.
O museu Casa do Terror abre diariamente, exceto segunda-feira, de 10h às 18h, porém a bilheteria fecha às 17h30. Verifique no site oficial informações sobre abertura em dias de feriado. A entrada inteira custa 2000 ft (cerca de 6 euros), com descontos para estudantes, crianças e idosos. É possível alugar um audioguide por 1500 ft (4,70 euros).
Foto: divulgação TerrorHaza
Quando eu fui fazer a visita, porém, todos os audioguides estavam ocupados. Em todas as salas eles oferecem folhas em inglês com a descrição completa das informações. E há também a possibilidade de fazer uma visita guiada: o guia custa 8000 ft, por grupo.
*Foto Imagem Destacada: Shutterstock
Parabéns pelo detalhe da matéria.
Fomos hoje visitar e gostamos muito da exposição, a única coisa é que parece que o horror ainda é predominante por lá, pois todos funcionários são extremamente grosseiros e arrogantes, sem exceção. Vale a pena conhecer.
Resposta à crítica de que há mais espaço dedicado ao Comunismo do que ao Fascismo:
Criticism has also been raised that far more space is given to the terror of the communist regime than the fascist one. One answer to these criticisms was that while the German occupation and fascist regime of Ferenc Szálasi lasted less than a year, the Hungarian Communist regime lasted for 40 years. The museologists of the museum also reminded critics that the Hungarian Holocaust has its own museum, within three kilometres distance, so there is no need to repeat its content.
Honestamente, para mim quem não tem credibilidade são as vozes que se unem para criticar uma crítica ao Comunismo. Infelizmente estamos vivendo uma época em que a “intelectualidade” e uma grande parcela da juventude estão, mais uma vez, flertando com esse regime genocida e abraçando cada vez mais posições políticas autoritárias, impostas pela força. Acho saudável que países que viveram por duas gerações o horror desse regime mostrem ao mundo a realidade do que é viver sob ele.
Estou em Budapeste e após ler todos os comentários decidi que não irei conhecer essa bosta, hahaha. Prefiro ser ignorante a prestigiar ignorantes!!
Adorei ler tudo!
?
Fui acreditando que o museu retrataria o período Nazista e Stalinista, no entanto, dos tres andares, somente uma parte de uma pequena sala fala sobre o nazismo, que muito atingiu a cidade.
O museu é chato. São varias salas com videos da era Stalinista e folhas impressas em papel ofício, com letra tamanho 12, muitas vezes frente e verso, contando a história do período. É como passear pela Wikipedia. Também não segue uma lógica em que você entenda o que realmente aconteceu, quando começou ou terminou e por que cada período. Aliás, nem sempre dá pra entender que periodo algumas salas retratam, você acha que está vendo vídeos do Stalinismo e nasala ha fotos de Hitler, sem ser feita uma relação. É preciso ter bom domínio do inglês para acompanhar as salas e ter paciência de ler cada papel em cada uma delas. Exceto pela reprodução de uma pequena prisão de guerra no subsolo e pela beleza de alguns ambientes, esse é um dinheiro que não vale a pena. Eu investiria no museu de BelasArtes, que é lindo e também interessante.
Penso que deveriam criar uma Casa do Terror no Brasil e colocar lá todos os professores de história, embalsados, para que possam ficar igual aos seus discursos, insensíveis à evolução. O Museu só conta uma parte da história?
Não é verdade. Se o Museu tem um foco maior no terror da ditadura comunista, isso não deixa de ser importante para história. Não existe lado bom em nenhuma ditadura.
Adorei os comentários. Na verdade sou bióloga, mas gosto de história. Como não consigo ler sobre os diversos lados da mesma história, sempre fico com a impressão de que alguém quer me vender uma visão especifica. Fico sempre desconfiada, mas sem saber exatamente porque. Adorei! Me confundiu mais ainda e isso é ótimo! Parabéns pelo blog, Luiza e por aceitar, compartilhar e elogiar visões diferentes do que primeiramente você escreveu.
Estive em Budapeste em junho desse ano e é claro que a Casa do Terror estava nos planos…Li os outros comentários e independente de “coitadismos”, “vitimismos”, ocorreram violências contra pessoas, tanto na época do nazismo quando posteriormente quando da ocupação soviética. A história deve ser preservada e mostrada e a nós cabe questionar e pesquisar para termos a verdade o mais próximo possível. Ouvi história semelhante quando estive em Dachau..da vitimização..mas os fatos estão lá e mesmo que uns que outros possam parecer exagerados, é chocante o que ocorreu por lá…muito interessante sua publicação e de uma maneira clara e sucinta compartilhou sua experiência e o mais importante , despertou curiosidade. Obrigado. Abraço.
Se fosse um local que mostrasse mentiras, por que ainda estaria aberto?
Por que a Veja ainda está aberta? hahaha
Desculpa, mas é muita ingenuidade.
Oh my sweet summerchild…
Procura “Victor Orbán” no google.
Cara, se você quer aprender a história do século XX, evite esse lugar. Eu estudo história e em uma aula de História Contemporânea outro dia o meu professor estava justamente falando sobre como a Casa do Terror é uma falsificação histórica e uma propaganda política. É assim que ele é conhecido internacionalmente por basicamente qualquer um do meio.
Gostava de conhecer! Que local tão interessante para ficar a saber mais da História do Mundo.