O Círio Fluvial e os barcos em romaria, em Bélem


“Observem do lado esquerdo a Corveta H-37, da Marinha do Brasil. É nela que está a imagem de Nossa Senhora de Nazaré”, anunciou o locutor, pelo sistema de som da embarcação. O alvoroço foi tão grande que, segundos depois, ele precisou dar outro aviso: “não venham todos para o lado esquerdo ao mesmo tempo. Por segurança e distribuição de peso é melhor observar de onde você está”. Embora o nosso embarque tenha sido cerca de duas horas antes, no Terminal Hidroviário de Belém, aquele era o início do Círio Fluvial, a terceira das 12 romarias do Círio de Nazaré.

Era manhã do sábado anterior ao Círio. A imagem da Santa embarcou na Corveta da Marinha no porto de Icoaraci, um distrito de Belém que é conhecido nacionalmente pela produção de artesanato. Fogos de artifício marcaram o momento em que o Círio Fluvial começou. Acompanhada por pelo menos 400 barcos e 40 mil pessoas, a Santa navegou pelos rios da Amazônia.

Batizada de Garnier Sampaio, a corveta H-37 assumiu a concorrida função de levar a Santa de volta para Belém. O curioso é que o navio já fez parte da Marinha Britânica, onde atendia pelo nome de HMS Ribble. Comprado pelo Brasil em 1995, 10 anos depois o barco passou a ter função hidrográfica, sendo encarregado de percorrer a Bacia Amazônica para as mais diversas tarefas. Para os fiéis, nenhuma delas é mais importante que a do Círio Fluvial.

O destino final da romaria era a Estação das Docas, em Belém, a 18,5 quilômetros dali. Durante o percurso, músicas, orações e missas davam o tom animado, porém religioso, dentro da embarcação. Também impressionava a decoração dos barcos vizinhos, muitos deles repletos de balões ou com faixas de agradecimento para Nossa Senhora de Nazaré. A cada comunidade ribeirinha por onde passávamos, mais homenagens em terra firme.

O Círio Fluvial é uma etapa relativamente recente da festa. A primeira edição ocorreu em 1985, uma tentativa de envolver as comunidades ribeirinhas nas festividades. Desde então, a festa nos rios cresceu e se tornou um dos momentos mais marcantes e esperados do Círio. No ano passado, o número de barcos (e consequentemente de pessoas embarcadas) foi até maior: mais de 500. Por segurança, este ano a Capitânia dos Portos resolveu limitar as vagas, mas isso não quer dizer que pequenas embarcações, canoas e até caiaques e jet skis tenham ficado de fora da festa.

Tomamos café da manhã no barco enquanto nos aproximávamos de Belém. Assim que os prédios do centro da cidade começaram a surgir no horizonte, a romaria atingiu seu momento mais bonito. No Ver-o-Peso, no Ver-o-Rio, na Estação das Docas e em vários pontos da Baía do Guajará estava uma multidão de pelo menos 100 mil pessoas, gente que aguardava a chegada da Imagem Peregrina.

Depois de passar pelo Ver-o-Peso e pelo Forte do Presépio, a corveta que levava a Santa deu meia-volta e seguiu para a Estação das Docas. Lá, a imagem desembarcou e foi recebida com honras de Chefe de Estado. Mas ela não ficou muito tempo por ali: a quarta romaria do Círio de Nazaré estava prestes a começar. Cerca de 15 mil motociclistas aguardavam para acompanhar Nossa Senhora de Nazaré num percurso de 2,4 quilômetros, até o Colégio Gentil Bittencourt.

Como participar do Círio Fluvial

Diversas agências de turismo e empresas de navegação oferecem pacotes para o Círio Fluvial. Em geral, a forma mais fácil é embarcar no Terminal Hidroviário de Belém, no começo da manhã, chegando em Icoaraci na hora da romaria. O Círio Fluvial toma toda a manhã de sábado e o pacote custa a partir de R$ 200, incluindo a passagem, uma camiseta e um kit de café da manhã. Eu fui no barco da Rocha Brasil.

Também é possível participar a partir de Icoaraci, onde a Imagem da Santa chega no sábado de manhã, depois da Romaria Rodoviária, a segunda etapa do Círio. Nela, motoristas escoltam Nossa Senhora de Nazaré por um trecho de 24 quilômetros, entre Ananindeua, cidade vizinha de Belém, e o porto Icoaraci, onde começa o Círio Fluvial. Segundo a organização da festividade, 250 mil pessoas acompanharam a Romaria Rodoviária em 2017.

Leia os outros textos da Série Círio de Nazaré: 

O Círio de Nazaré e o chorar sem entender

As romarias do Círio de Nazaré e como organizar sua viagem

A corda do Círio de Nazaré e a fé de milhões

O sagrado e o profano no Círio de Nazaré

*O 360meridianos viajou a convite da Secretaria de Turismo do Pará. 

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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