Os relógios marcavam quatro da tarde quando Getúlio Vargas entrou no comboio de inauguração do Conjunto Arquitetônico da Pampulha, em maio de 1943. Na delegação estavam vários políticos, entre eles o jovem prefeito de Belo Horizonte que tinha idealizado a criação de um centro de lazer ao redor de uma lagoa artificial: Juscelino Kubitschek.
Ao chegarem na Orla, JK e Getúlio encontraram cerca de 20 mil pessoas, gente que estava ali para assistir a cerimônia de inauguração. O detalhe é que na época a capital mineira tinha apenas 200 mil habitantes – uma multidão saiu de casa para testemunhar aquele dia histórico.
Décadas mais tarde, o Conjunto Arquitetônico da Pampulha – ou, se preferir, Conjunto Moderno da Pampulha – foi declarado Patrimônio Mundial pela Unesco. “A Pampulha foi o início de Brasília”, disse o arquiteto Oscar Niemeyer, o escolhido para projetar os primeiros prédios do centro de lazer. E na pratica foi mesmo, uma espécie de ensaio geral da dupla que cerca de 15 anos mais tarde invadiu o planalto central e tirou Brasília do plano das ideias.
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Na lagoa belo-horizontina, Niemeyer projetou uma igreja, um cassino, uma casa noturna e um clube, além de projetos menores. Nos anos seguintes foram acrescentados dois estádios, o jardim zoológico e um parque ecológico, que ocupa uma área da lagoa que sofreu assoreamento. Lugares que formam um dos cartões-postais mais famosos de Belo Horizonte (pelo menos é o meu favorito).
A Lagoa com sua inesquecível Igrejinha de São Francisco, com o Mineirão e o Mineirinho, a roda-gigante do Parque Guanabara, e claro, a Serra do Curral lá trás, marcando o fim da outra ponta da cidade. É essa a primeira imagem que surge na minha memória quando penso em BH. Linda, né?
Passei a maior parte da minha vida na Pampulha, que não é um bairro, mas uma região que envolve 41 bairros, 16 vilas e 250 mil habitantes, tudo isso ao redor dos 18 quilômetros de orla da Lagoa. Se você está numa ponta da Pampulha, por exemplo, pode ser mais fácil chegar ao centro da cidade do que na parte oposta.
Distância que é um convite para caminhada e, por que não, para uma volta de bicicleta. É possível alugar bikes em vários pontos da orla – há uma loja na esplanada do Mineirão onde a hora sai por R$ 10. Além disso, existem as bicicletas do Bike BH, as laranjinhas que se espalharam por todo o Brasil. Nesse caso o aluguel é mais barato: R$ 3,90 ou R$ 9,90 no plano mensal.
Neste texto falarei das atrações da Pampulha pensando num roteiro de bike que sai do Mineirão e segue sentido Igrejinha da Pampulha (há uma ciclovia ao redor de toda a lagoa). Mas, devo dizer, mesmo sendo plana, a rota é cansativa, principalmente para os sedentários. Se preferir, você poder conhecer muitos desses lugares caminhando, de ônibus ou e carro. Vamos lá?
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O Mineirão já foi palco de finais de Libertadores, brasileiros e até um mundial de clubes, mas o jogo mais importante realizado ali vai ser, para sempre, o do 7 a 1. A construção de um grande estádio de futebol em BH entrou nos planos ainda na década de 1940, quando os três principais times da cidade tinham estádios próprios, todos na região central, e com capacidade acanhada.
O Mineirão foi inaugurado só duas décadas mais tarde, em 1965, e seus projetistas foram os arquitetos Eduardo Mendes Guimarães Júnior e Gaspar Garreto. Reformado para a Copa do Mundo de 2014, o estádio ganhou uma esplanada com algumas lanchonetes – e lá que ficam um dos pontos de aluguéis de bicicleta na Pampulha, a Bikemania. Além disso, o estádio conta com um Museu do Futebol. Se você estiver visitando BH, não perca a oportunidade de ver um jogo por lá – e peça o tradicional tropeiro, vendido dentro e fora do estádio, nos bares dos arredores.
O Mineirão pode ser visto de vários pontos da Pampulha e até de regiões ao redor, com sua coroa tomando conta da paisagem.
Foto: Shutterstock
Em 1980 chegou o Mineirinho, estádio poliesportivo e palco de shows e outros eventos, com capacidade para receber até 25 mil pessoas. Mas na prática ele é tão grande que muita gente, ao se deparar pela primeira vez com a fachada do estádio, pensa estar de cara com o Mineirão. Durante a Copa o Mineirinho foi centro de imprensa, por isso foi construída uma passarela suspensa que liga o ginásio ao estádio. Além disso, toda quinta e domingo o estacionamento do Mineirinho recebe uma tradicional feira de artesanato.
Entre na Avenida Oscar Paschoal e dessa para a orla da Lagoa da Pampulha, que está pertinho. Siga para a esquerda e em 1,5 quilômetro você chegará em outro ponto importantíssimo da Lagoa, um dos edifícios projetados por Niemeyer e encomendados por JK, lá na década de 40: a Igreja de São Francisco de Assis.
Com painéis de Portinari e jardins de Burle Marx, a Igrejinha da Pampulha causou polêmica, tanto por conta de suas curvas quanto por causa de um cachorro sem raça definida que Portinari colocou num dos painéis, ao lado de São Francisco – o companheiro tradicional do santo é um lobo. Com isso, a celebração da primeira missa só ocorreu 17 anos depois da inauguração do templo, quando BH tinha um novo arcebispo.
A entrada é de graça e a Igreja abre para visitação de segunda a sábado, das 8h às 17h, e também aos domingos, das 12h às 17h. Missas aos domingos, sempre às 10h, e às terças-feiras, às 20h.
Dica importante: de frente para a Igrejinha fica o Parque Guanabara, conhecido (e amado) por muitas crianças belo-horizontinas. Vale dar uma passada lá nem que seja só para curtir a vista da Roda-Gigante. Tente ir na hora do pôr do sol.
Igreja de São Francisco no Conjunto Arquitetônico da Pampulha. Foto: Shutterstock
950 metros separam a Igrejinha da Pampulha da Casa JK, outro projeto de Niemeyer, mas esse encomendado por Juscelino para uso particular: o prefeito e sua família usavam essa casa com teto em formato de asa de borboleta como residência de campo. O político vendeu a casa para um casal de amigos ainda na década de 40, a família Guerra, que viveu ali até 2004, quando o local foi desapropriado pela prefeitura e transformado em museu. A entrada é de graça e a Casa Kubitschek funciona de terça à sábado, das 10h às 17h.
E não deixe de parar também no Mirante Bandeirantes, em frente à Casa Kubitschek, que tem uma vista linda da Lagoa e que recentemente ganhou uma nova atração – as estátuas em tamanho real de Juscelino Kubitschek, Oscar Niemeyer, Cândido Portinari e Burle Marx. Diz a lenda que JK ancorava seu barco num cais que existia ao lado desse mirante, depois de dar uma volta pela lagoa, e de lá seguia para casa.
Veja também: Casa Kubitschek, o lar de JK na Pampulha
Interior da Casa Kubitschek
O trecho entre a Casa JK e o Mirante Bem-te-vi é um dos mais agradáveis da orla – existem quatro mirantes ao longo dos 18 quilômetros da Avenida Otacílio Negrão de Lima, a via que contorna toda a lagoa. Depois de uma pausa para tomar água, siga até a entrada do Parque Ecológico (entre a Casa JK e o Parque são 3,7 km).
Eu só descobri isso ao pesquisar para este texto, mas a área da lagoa que foi assoreada tem um nome: Ilha da Ressaca. O Parque Ecológico da Pampulha foi criado no final da década de 90, para reaproveitar essa área, e tem 300 mil metros. Além da área verde, destaque para o memorial da imigração japonesa, inaugurado em 2008 para celebrar os 100 anos da imigração japonesa no Brasil. A entrada é de graça e o parque abre sempre às 8h30, mas o fechamento varia de acordo com a época do ano, mas sempre é perto da hora do pôr do sol.
Dois quilômetros separam o Parque Ecológico da Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte, onde funcionam o Zoológico, o Aquário da Bacia do Rio São Francisco e o Jardim Botânico da cidade. O funcionamento é de terça a domingo, das 8h30 às 16h, e há taxa de entrada. Confira os valores aqui.
O curioso é que a sede da fundação Zoo-Botânica também foi projetada por Niemeyer e tem teto em forma de asa de borboleta, tal qual a Casa Kubitschek. É que o plano de JK era que essa área fosse o Golf Club da cidade, projeto que até foi implantado, mas não durou. O Zoológico veio na década seguinte.
Essa é a parte mais complicada da volta, tanto por ser a que tem o maior trecho assoreado – o que diminui a beleza das pedaladas – quanto por conta da distância. Entre o Zoológico e o Museu de Arte da Pampulha são cerca de seis quilômetros, mas há mirantes e lugares para comprar água no meio do caminho. Outra possibilidade é aproveitar que você está nessa parte da lagoa e fazer um desvio até o Xapuri, um dos restaurantes mais tradicionais da cidade.
Se preferir seguir em frente, logo você encontrará o Museu de Arte da Pampulha, o prédio mais imponente do conjunto arquitetônico. Niemeyer dizia que projetou esse prédio em uma única noite, tamanha foi a pressão que JK colocou no assunto. Museu de Arte da Pampulha há 70 anos, nos planos de JK e Niemeyer a edificação teria outro uso: seria um cassino. E foi assim durante três anos, até que o governo do Presidente Dutra declarou o jogo ilegal no Brasil, deixando o prédio no abandono.
O Museu veio dez anos depois do fim da jogatina e hoje conta conta com um acervo de 1600 obras de artistas brasileiros. Funciona de terça a domingo, das 9 às 17h.
Foto: Shutterstock
Não dá pra negar a beleza da Igreja de São Francisco, mas meu prédio favorito no Conjunto Moderno da Pampulha é a casa do Baile, que está a 2,6 km do MAP – você passará pela barragem da lagoa para chegar lá. Sim, barragem, porque a Pampulha é uma lagoa artificial, criada inicialmente, entre outras funções, para o abastecimento da capital, mas depois transformada em área de lazer.
Mas voltemos ao que interessa. A Casa do Baile foi criada para continuar a lista de atrações noturnas da Pampulha. A ideia é que do cassino os jogadores fossem dançar no salão circular, projetado numa ilha artificial acessível por uma ponte de concreto. As curvas, claro, não negam – e até gritam: esse é mais um projeto do Niemeyer. O problema é que o fechamento do cassino acabou prejudicando a Casa do Baile, que perdeu clientela – vale lembrar que a cidade cresceu em direção à Pampulha nas últimas décadas e que naquela época havia pouquíssimas casas nessa região.
O prédio chegou a funcionar como um restaurante, até a década de 90, e depois foi transformado em Centro de Referência de Urbanismo, Arquitetura e do Design. Mas, numa boa, seria muito melhor que a Casa do Baile tivesse alguma função próxima da original, sendo de fato usada pela população belo-horizontina.
Museu de Arte do Conjunto Arquitetônico da Pampulha. (Foto: Henry Yu / Belotur)
O último prédio da rota pela Pampulha é o Iate Clube, que tem a forma de um barco ancorado na lagoa. Esse clube era gerenciado pela prefeitura até a década de 60, quando foi privatizado. Já foi sede de três clubes de regatas e ancoradouro para barcos e iates.
Com a poluição da Lagoa, principalmente a partir dos anos 90, os passeios de barco foram abandonados, mas a promessa é que retornem em breve, com a despoluição da água. O prazo para cumprimento da promessa, claro, já foi adiado várias vezes.
Se você estiver no centro ou nas proximidades da Savassi, a forma mais barata é ir de ônibus. Para isso, a melhor opção é o 5106, que cruza a cidade inteira, saindo do Bairro Belvedere (no ponto ao lado do BH Shopping, desce a Avenida Nossa Senha do Carmo, entra na Cristóvão Colombo e tem pontos na Savassi e na Praça da Liberdade, quase em frente ao Centro Cultural Banco do Brasil. Depois, o ônibus desce a Avenida João Pinheiro e pega a Afonso Pena, passando em frente ao Parque Municipal e na Praça Sete, antes de seguir para a Pampulha usando os corredores exclusivos do Move, já na Avenida Antônio Carlos.
A passagem custa R$ 4,05. Você pode descer na frente do Mineirão ou continuar no ônibus e descer em algum ponto da Orla – o 5106 passa em frente à igrejinha e sai da Orla um pouco antes do Parque Ecológico, já na altura do bairro Bandeirantes. Espere gastar 45 minutos no trajeto Savassi – Pampulha.
Você também pode ir de táxi (de R$ 37 a R$ 45) ou de Cabify e Uber (R$ 24 a R$ 30).
Como disse antes, o Xapuri é o restaurante mais badalado da região e um dos mais famosos da cidade. Fica numa parte isolada da lagoa, depois do zoológico e algumas quadras atrás da orla (Rua Mandacaru, 260). Se desejar algo menos afastado, o Restaurante Juscelino fica entre o Mineirão e a Igreja da Pampulha, de frente para a orla.
Também há bares e restaurantes na esplanada do estádio – inclusive um fast food de tropeiro do Mineirão, que funciona todos os dias e não exige que você esteja num jogo para provar o prato. Também existem bares em alguns pontos ao longo da orla e no Parque Guanabara, que fica em frente à Igreja. E, claro, quintas e domingos levam todos para a Feira do Mineirinho.
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Mas é um pouco depois da Igreja, entrando na Avenida Fleming, que está a maior concentração de bares e restaurantes da região, já no bairro Ouro Preto. Um lugar super agradável nessa área é o Bistrô Vila Rica, que fica no número 900 da Fleming. Ali você vai encontrar vários restaurantes e opções de comidas num lugar charmoso e bem tranquilo. Quem preferir alternativas mais econômicas pode buscar pelo Siri, pelo Bar e Boi, pelo Barril e pelo Filé, já quase na ponta oposta da avenida e perto das moradias de estudantes da UFMG.
Por fim, a Wals Cervejaria está no meio do caminho entre a Pampulha e o centro e só funciona aos sábados (até às 17h), mas também é uma ótima opção e fácil de ser encaixada no roteiro. Saiba mais aqui.
Em geral eu acho que é melhor procurar por hospedagem no eixo centro/Savassi e passar um dia na Pampulha, mas muita gente tem optado por já ficar perto da orla da lagoa de uma vez. Além dos prédios, os motivos podem ser um jogo ou show no Mineirão, algum evento na UFMG, ficar um pouco mais próximo do Aeroporto de Confins ou mesmo querer conhecer melhor outra região de BH.
O Pampulha Design Hotel fica na orla, tem estacionamento gratuito e, o melhor, diárias por a partir de R$ 120 o casal. Outra opção interessante é o San Diego Concept Pampulha, que está a 15 minutos de caminhada do Mineirão e perto do Iate, também na Orla. Achei diárias por a partir de R$ 160, para duas pessoas. É um hotel novo, daquela leva Copa do Mundo. Ainda mais perto do estádio está o Da Orla Pampulha Hostel, que tem dormitórios e quartos para famílias e grupos de amigos.
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