Parada bem na metade do mundo, um pé de um lado da linha amarela, o outro do outro, eu me dei conta de que aquela era uma das poucas oportunidades que eu teria na vida de estar em dois lugares ao mesmo tempo. Naquele momento, metade de mim estava no hemisfério norte, metade no sul. Metade no outono, metade na primavera. E a tinta amarela marcada no chão trazia pra realidade uma linha imaginária, geográfica, mas também política.
Com mais de 40 mil quilômetros, dando a volta ao redor do globo bem no local que seria a metade dele, a linha do Equador atravessa oceanos e 13 países, entre eles o Brasil, bem ali na pontinha norte, no estado do Amapá. Mas é no Parque da Metade do Mundo (Parque de la Mitad del Mundo), a 26 quilômetros do centro de Quito, que a gente tem o gostinho de ver, interagir e aprender mais sobre ela.
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Não sei posar pra fotos
A relação do país com o paralelo 0˚ é antiga e rendeu-lhe até mesmo o nome. Isso porque aquele foi o local escolhido por uma equipe de pesquisadores franceses, no século 18, para ser a sede de uma série de estudos para testar a teoria de Newton de que a Terra não era uma esfera perfeita. Para isso, precisavam comparar a curvatura do planeta na metade do mundo com a do norte, na Suíça. Na época, a colônia espanhola era conhecida como Presidência de Quito, e foi eleita o lugar ideal por que, ao contrário dos outros terrenos atravessados pela faixa na América do Sul, era uma região com forte ocupação europeia e, por isso, considerada pelos pesquisadores da época a mais “civilizada” para receber a missão.
Durante os oitos anos que permaneceram ali, os estudiosos fizeram grandes avanços no entendimento do achatamento dos pólos do planeta. Os cálculos influenciaram até mesmo a criação do sistema métrico, que se espalhou pela Europa com as conquistas de Napoleão. Eles também foram os responsáveis por estabelecer a latitude 0º 0′ 0″, ainda que seguramente havia gente de humanas nessa equipe, já que os cálculos não foram precisos.
Em 1992, 250 anos mais tarde, outra equipe de pesquisadores franceses deu de cara com o erro: a linha que está pintada no chão do Parque da Metade do Mundo desde 1979 e que foi estabelecida pelos primeiros cientistas está, na verdade, deslocada 300 metros ao sul de onde de fato passa a latitude 0º 0′ 0″. O curioso é que foi somente no século 20, com todo GPS e o aparato tecnológico, que os cientistas ocidentais descobriram algo que os indígenas que sempre habitaram o Equador já sabiam há tempos: a real linha do Equador passa bem em cima daquilo que os povos originários dali chamavam de “inti-ñan”, ou “caminho do sol” em quíchua.
Latitude 0º 0′ 0″, ou quase.
Mas não fique desapontado pelo erro: a questão é mais simbólica que exata. Afinal, dada as dimensões da Terra, o Equador não é exatamente uma linha, mas uma faixa que se estende por cinco quilômetros. Mesmo com o erro de cálculo dos franceses, dá para sentir o gostinho de atravessar de um lado para o outro do mundo. Mas se você fizer questão mesmo, a linha real e oficial está marcada no Museu Intiñan (Calle Manuel Cordova Galarza), localizado pertinho do parque e que pode ser combinado na mesma visita.
Mas então é isso? É uma linha amarela no chão? Na verdade, o Parque da Metade do Mundo é aquela típica atração inventada para atrair gente para um local com potencial de exploração turística. Você coloca um monumento aqui, um museu ali, umas lojas de lembrancinhas e pronto: tem uma atração pra chamar de sua.
Monumento da Metade do Mundo e bustos dos cientistas
Então sim, tem a linha do Equador, tem o monumento da metade do mundo, que marca também os quatro pontos cardeais e que fica no final de um corredor com o busto dos cientistas franceses daquela primeira missão. Dentro do monumento, há um pequeno museu com curiosidades sobre os povos indígenas nativos do Equador e um andar com atrações interativas sobre ciência. Lá no topo, é possível ver todo o parque e a região ao redor, que é bem bonita, cercada de montanhas. Lá de cima, em dias claros, dá para ver até mesmo os vulcões mais próximos, como o famoso Cotopaxi.
Além dessas atrações diretamente relacionadas à metade do mundo, o lugar ainda conta com pavilhões culturais que valorizam os artistas locais com exposições permanentes e temporárias, entre elas alguns trabalhos do artista equatoriano Oswaldo Guayasamín, um dos mais conhecidos do país. Há também uma arena para os pequenos shows musicais e apresentações de danças típicas do país que ocorrem ali todos os fins de semana.
Outra área interessante é o espaço das Viviendas Ancestrales, que reproduz as casas tradicionais dos povos indígenas, destacando a diferença dos que vivem na costa, na floresta e nas montanhas. Há ainda no complexo um planetário, um museu do chocolate e um pequeno museu dedicado à história colonial de Quito, com uma maquete do centro da cidade
Pelo potencial educativo, o passeio vale muito a pena para quem viaja com crianças, para curiosos e nerds da ciência de plantão. Por outro lado, se você não faz questão de ter sua foto na metade do mundo, talvez a visita te decepcione. Uma boa ideia, se você está em dúvida, é engrenar a visita ao Parque depois da caminhada pelo vulcão Pululahua, que fica ali pertinho.
De ônibus
Saindo da estação La Marín, no centro, é preciso pegar o Central Norte até Ofelia, que é a última estação. O trajeto dura cerca de 50 minutos e custa USD 0,25. De lá, há ônibus saindo para o parque, mas fique esperto ao entrar na fila já que nem todos os veículos que param debaixo do letreiro “Mitad del Mundo” vão, de fato, para a metade do mundo, e eu vi gente entrar no ônibus errado por causa disso. Pergunte ao trocador antes de embarcar. A viagem dura mais meia hora e custa 0,15 centavos. Eu fiz o trajeto dessa forma e foi tranquilinho.
De táxi
A corrida deve custar cerca de 20 dólares e leva uns 40 minutos. Em Quito há Uber e Cabify, pra quem preferir.
Outra possibilidade é contratar um tour organizado por agências, que te pegam e deixam de volta ao hotel e costumam incluir no passeio visitas ao vulcão Pululahua e ao Museu Intiñan.
A entrada que permite ver apenas o monumento custa USD 3,5. A que dá acesso a todas as atrações do complexo sai a USD 7,50. Há mais modalidades de passe, como a que te presenteia com uma barra de chocolate fino produzido no país. Os bilhetes podem ser adquiridos na hora, na própria bilheteria do complexo.
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