Igrejas e cassinos em Macau, um pedaço de Portugal na China

Macau só não é a Las Vegas do Oriente porque Las Vegas é a Macau do Ocidente. Essa antiga colônia portuguesa, cheia de casarões, igrejas e calçadas em estilo lusitano e onde a língua de Camões ainda é oficial, começou a traçar seu destino no século 19, quando o governo português liberou a jogatina no território. Chegou o século 21 e Macau, desde 1999 de volta ao comando chinês, aproveitou essa vocação: o dinheiro movimentado ali com cassinos e outros jogos de azar já supera o de Las Vegas. E por muito. Assim como na cidade norte-americana, shows permanentes, espetáculos e afins também ajudam a fazer de Macau um hub do entretenimento. Mas, no fim das contas, há muito o que fazer em Macau além da jogatina. E o melhor programa passa pela história colonial da região.

Os portugueses chegaram em Macau em 1553 e resolveram por ali ficar, um ponto de descanso na rota das grandes navegações. Alguns anos mais tarde, Portugal conseguiu o controle da região – e começou assim um período de colonização que durou quatro séculos. O resultado de tanto tempo de domínio português pode ser visto nas ruas, nas construções e no idioma. Embora atualmente poucos habitantes falem português, a língua segue como uma das oficiais, o que significa que toda informação pública, em placas de trânsito, por exemplo, é feita também em PT-PT. Nos ônibus, avisos sonoros em português. E com sotaque europeu.

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Junte tudo isso com uma região de 600 mil habitantes e tipicamente chinesa, a apenas uma hora de barco de Hong Kong. Pronto, está feita a receita para um bate-volta.

Como chegar em Macau a partir de Hong Kong

Macau tem um aeroporto internacional que oferece conexões com várias cidades da China, Taiwan e também do sudeste asiático. Apesar disso, a maior parte dos turistas chega mesmo a partir de Hong Kong, que está a cerca de 70 quilômetros de distância, do outro lado do Delta do Rio das Pérolas.

A viagem de ferry entre Macau e Hong Kong leva cerca de uma hora. Há saídas ao longo de todo o dia, de pontos diferentes de HK e que desembarcam no porto de Macau. Existem outras empresas operando o trecho, mas eu fui e recomendo a TurboJet. Embora seja possível comprar a passagem na hora, vale a pena garantir com antecedência, pela internet, caso você esteja viajando na alta temporada, como o Ano-Novo chinês. O site tem versão em inglês e o passo a passo é simples. Outra empresa que faz a viagem é a Cotai Jet Ferry.

Antes de comprar seu ticket, veja se o destino escolhido é o que você pretende: o porto de Macau deixa perto do centro histórico, enquanto o de Taipa fica bem mais afastado, na região dos cassinos. Só compre um bilhete para lá se os cassinos forem seu foco.

Nas compras online, o e-ticket é enviado para o seu email, com QR code, que é o necessário para o embarque. Veja com atenção também o local de partida da balsa. Em HK há um no Kowloon, o China Ferry, que fica na Canton Road, no prédio do The Royal Pacific Hotel & Towers, e outro na Ilha de Hong Kong mesmo, próximo a estação Sheung Wan do metrô. Os meus bilhetes custaram 385 dólares de Hong Kong, ida e volta por pessoa, o que deu aproximadamente R$ 160, já com as taxas.

O porto de Macau é um pouco afastado do centro histórico, mas é fácil chegar lá de transporte público. Basta pegar o ônibus do lado de fora da hidroviária – as linhas 3, 3A, 10, 10A deixam no Largo do Senado. Você pode pagar no próprio ônibus e com dólares de Hong Kong, mas não espere troco, por isso é bom ter o dinheiro contadinho, em moedas ou notas de pequeno valor. Avisos sonoros, em português, deixarão claro quando é hora de descer. O Octopus card, cartão do transporte público de Hong Kong, não é válido em Macau. O Ferry Terminal fica a 2,5 km do Largo do Senado, então quem tem tempo (e um mapa) pode até tentar ir a pé.

Alguns hotéis mais centrais oferecem shuttle gratuito a partir do terminal, mesmo para quem não é hóspede. Verifique essa possibilidade no quiosque de informações turísticas.

Quanto tempo ficar em Macau

A não ser que você curta o programa cassino, um bate-volta a partir de Hong Kong é tempo suficiente para ver todas as atrações. Essa parece ser, inclusive, uma diferença entre os turistas chineses, que entram no barco de mala e cuia e passam mais tempo em Macau, aproveitando o lado do entretenimento, e os estrangeiros, que em geral vão e voltam no mesmo dia. Se essa for a sua opção, pegue um ferry cedo, por volta das 8h da manhã, e volte no fim do dia – foi o que eu fiz. Mas quem tiver mais tempo certamente achará o que fazer com ele.

Se resolver dormir lá, os hotéis seguem a lógica de Las Vegas e são pontos turísticos, shoppings, casas de shows (e por aí vai). O The Parisian Macao faz justiça ao nome e tem uma réplica enorme da Torre Eiffel, enquanto o The Venetian preferiu investir numa representação da Praça de São Marcos, em Veneza. Veja aqui mais opções de hospedagem em Macau, para todos os bolsos.

Ano-Novo chinês em Macau

Dinheiro e imigração

Assim como Hong Kong, Macau tem o status de Região Administrativa Especial da China. Para o turista isso tem duas implicações práticas. A primeira é que há imigração para entrar e sair, seja seu destino Hong Kong, seja a China, seja outro país. Leve seu passaporte e guarde com você o papel que é entregue na entrada – ele deve ser devolvido na saída. Brasileiros a turismo não precisam de visto para passar por Macau e Hong Kong por até 90 dias, ao contrário do que ocorre no restante da China. Reserve tempo, ao programar seu roteiro, para os procedimentos de imigração, na entrada e na saída de Macau e de Hong Kong.

Além disso, o dinheiro usado em Macau não é o mesmo que circula na China – e oficialmente também não vale por ali o dólar de Hong Kong. Em Macau, a moeda corrente é a pataca. Nas prática isso não tem efeito para o viajante, já que todos os estabelecimentos aceitam a moeda de HK, inclusive o transporte público. O único porém é que o troco pode ser fornecido em patacas, que não são aceitas em HK, então garanta que você gastará esse dinheiro por ali mesmo. Cartões de crédito também são largamente aceitos.

O que fazer em Macau: roteiro de 1 dia

O ponto alto do roteiro é o centro Histórico de Macau, que foi declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco e que guarda a mistura portuguesa e chinesa da região. Não há passeio obrigatório, apenas caminhar, admirar as igrejas e casarões – e com direito a muitas placas em português. A lista abaixo tem alguns dos mais importantes pontos turísticos de Macau (falarei de cada um deles em seguida).

  • Largo do Senado
  • Avenida Almeida Ribeiro
  • Catedral da Sé
  • Praça e Igreja de Sto. Agostinho
  • Teatro Dom Pedro V
  • Largo e Igreja de São Domingos
  • Cassinos, Cotai Street e shows
  • Macau Tower
  • Templos de A-Ma e Ku Iam

Comece seu roteiro pelo Largo do Senado, que é o centro de Macau e antiga sede do poder colonial. Era ali que as pessoas se reuniam, nas grandes ocasiões, o que pouco mudou com o passar dos séculos. Ali já aparecem os letreiros em português, como o da Santa Casa da Misericórdia e do Edifício do Leal Senado.

Muitos desses prédios foram erguidos ao longo do século 18, quando Macau ocupava posição importante no comércio entre oriente e ocidente e o português tinha se convertido numa espécie de língua franca da Ásia. A Santa Casa é ainda mais antiga, tendo sido criada em 1569. Destaque também para as calçadas portuguesas, que tanto lembram o Brasil. Já a Avenida Almeida Ribeiro é a principal do centro histórico e está cheia de restaurantes, lojas e comércio em geral.

Vale a pena pelo menos passar na frente da Igreja da Sé, transformada em Catedral em 1623 e que era onde os governantes portugueses eram empossados, até devolução de Macau para a China, no final do século 20.

A construção da Igreja de Santo Agostinho começou em 1586, mas o prédio atual é mais novo, do começo do século 19. Nesse largo fica também o Teatro Dom Pedro V , um dos primeiros da China. Uma curiosidade: O Pedro V, monarca de Portugal homenageado no prédio, era neto de Dom Pedro I, o do Brasil. Por fim, com as paredes amarelas contrastando com as calçadas portuguesas, a Igreja de São Domingos é outra que tem história: o primeiro prédio, que era de madeira, foi erguido em 1587.

Mas a grande atração, o cartão-postal máximo de Macau, é uma igreja que quase não existe mais. São as Ruínas de São Paulo, da Igreja da Madre de Deus e do Colégio de São Paulo, um complexo religioso do século 16 que foi destruído por um incêndio em 1835. Só restou a fachada da igreja, que foi revitalizada. Nos fundos fica uma cripta e ao lado está a Fortaleza do Monte, construída em 1606 e usada na defesa da cidade, principalmente contra o ataque de holandeses. Hoje, do alto da Fortaleza é possível ter uma das melhores vistas de Macau, com um panorama que reúne prédios coloniais, casas e arranha-céus, cassinos e a Torre de Macau e seus 338 metros.

Por falar em cassinos, a maior parte deles está em Taipa, uma ilha ligada à parte continental de Macau por uma longa ponte. Um cassino que fica perto do centro é o Lisboa, um prédio icônico que lembra uma flor de lótus. Templos não cristãos, como o A-Ma e o Ku Iam, esse com uma linda estátua budista, são outros passeios interessantes.

E reserve um tempo para comer bem. Tantas influências criaram uma gastronomia rica, que mistura as cozinhas portuguesa e chinesa. Não faltam lugares vendendo pastel de nata, não faltam padarias, bacalhoadas e pratos à portuguesa. Os restaurantes chineses também estão por ali aos montes. Escolha um (ou dois, três) e use e abuse do seu tempo assim, provando de tudo um pouco.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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