Por que pagamos para ser voluntários em outros países

Para muitos, a ideia parece um ultraje: “Mas eu já vou gastar meu tempo ajudando de graça, ainda querem que eu pague para trabalhar?”. Há uma ideia equivocada de que, ao se candidatar a um projeto de voluntariado internacional, a pessoa terá por direito seus gastos cobertos pela organização. Ora, amigos, se a vida fosse assim, seria muito fácil! Poderíamos viver viajando pelo resto da vida enquanto ajudamos comunidades carentes.

Mas vamos aprender um novo mantra? Voluntariado não é uma forma de viajar de graça. Essa não é a razão pela qual você deve procurar um projeto. Você deve fazer isso porque se identifica com a causa, porque quer ajudar, porque já se envolve em projetos voluntários na sua cidade e quer continuar a fazê-lo nas suas férias, por um milhão de motivos, mas não porque quer viajar de graça.

É verdade que existem alguns poucos programas que cobrem todos ou quase todos os custos do viajante, mas esses são raros, de acesso complicado e bancados por grandes organizações, como a ONU e o MSF ou por braços sociais de multinacionais (e não, não conheço nenhum para indicar, antes que me perguntem). E para deixar tudo bem desenhado pra vocês, vamos aos porquês.

Foto: Shutterstock

As instituições que mais precisam da sua ajuda não têm grana para te bancar

Parece óbvio, não? Se uma instituição tem grana para te pagar uma passagem de avião, hospedagem e comida, ela não precisa de você. Ela pode muito bem contratar uma pessoa da comunidade na qual atua para fazer o serviço que você faria. O que, do ponto de vista econômico e social, é um milhão de vezes mais vantajoso. Ao pagar pelo serviço de um local, a instituição está gerando emprego e estimulando a economia de forma sustentável. Ao pagar para levar um estrangeiro, ela está apenas bancando suas férias.

E você é uma ajuda cara

Não importa por quanto tempo você pretende voluntariar, a menos que cada centavo da sua estadia saia do seu bolso, você representa um gasto para aquela organização. Pode ser o custo de uma refeição, de um transporte, de produtos de limpeza, de água ou de luz. Pode parecer pouco, mas para instituições que muitas vezes vivem de doações e recebem vários voluntários esse é um pouco que faz falta.

Há melhores formas de empregar o dinheiro da ONG

Por mais que sua ajuda seja importante, o dinheiro suado de uma ONG será melhor empregado se utilizado com outro tipo de recurso, seja melhorando projetos existentes, criando novos, comprando suprimentos e matéria-prima, pagando mão de obra local e uma infinidade de outras coisas.

Lembre-se que muitas dessas instituições vivem de doações, que nem sempre são abundantes, e esse dinheiro deve beneficiar, bem, as pessoas que precisam ser beneficiadas, não você. Além disso, as organizações mais sérias e que mais valem a pena ajudar são aquelas que destinam a maior parte possível de seus recursos às causas corretas, certo?

Foto: Shutterstock

Você dá trabalho

A partir do momento em que você enviou aquele email perguntando sobre as oportunidades de trabalho voluntário para estrangeiros e até o momento em que você for embora para a sua casa, você dá trabalho para a organização. Será preciso te informar sobre os projetos e trabalhos disponíveis, te orientar quanto aos trâmites da viagem, encontrar (ou te ajudar) a encontrar uma acomodação, treinamento, ajuda nos primeiros dias… I

Isso quer dizer que você terá pelo menos outra pessoa trabalhando para te ter ali do outro lado da linha. Muitas ONGs têm orientadores contratados para isso. E quem deve pagar pelo salário deles? Não me parece justo que o dinheiro venha do orçamento da ONG, por isso as taxas de voluntariado são importantes.

Você certamente faz isso pelos outros, mas também por você

Ninguém duvida das suas motivações altruístas ao optar pelo volunturismo, mas isso não é tudo. Quando você escolhe participar de um programa do tipo, também espera ganhar muita coisa com a experiência. Intercâmbio cultural, conhecimento, compreensão de mundo, novas ideias, novos amigos, uma conexão maior com uma cultura diferente, recordações que vão te acompanhar por uma vida inteira.

Ao trabalhar como voluntário em outro país, você terá contato com aquela cultura que nenhum turista jamais terá. Você vai conhecer pessoas que provavelmente não conheceria de outra forma e terá uma visão mais completa da realidade do país. E se essa experiência será tão grandiosa para você, qual o problema em investir algum dinheiro nela?

Leia todos os nossos textos sobre voluntariado internacional clicando aqui.

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones e no Youtube. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

Ver Comentários

  • boa noite Natália , gostei muito do seu artigo estou pesquisando algumas agencias , vc indicaria alguma , poderia ser off, para na causar nenhum desconforto ....

  • Oi, Natália,
    As perguntas que não querem calar em mim: essas instituições precisam realmente do meu tempo? Minha presença é realmente desejada? Se o dinheiro os ajuda de fato e damos tanto trabalho, não seria mais proveitoso enviar o dinheiro, considerando que seja uma instituição de confiança?
    Tenho certeza que o ganho pessoal é incalculável e o valor que se paga é um detalhe, mas acho que no caso de ir para o exterior, o tempo dedicado para ajudar deve ter mais valor que o dinheiro investido. Parabéns pelo blog.

    • Olá Alessandra, são muito válidos seus questionamentos.

      Olha, eu acho que depende muito. Algumas sim, precisam, outras não precisam tanto, poderiam se virar sem você lá. Enviar o dinheiro seria uma opção, mas as pessoas não querem apenas enviar o dinheiro, né? Querem se envolver, ter uma experiência diferente também, aprender com isso. O que é, de certa forma, positivo. Por isso creio que muitas abrem as portas para receber o dinheiro e a ajuda. Em alguns casos, como no hospital que eu voluntariei a primeira vez, eu não era tão importante lá, mas ele era mantido por doações e os estrangeiros que iam pra lá acabavam, de certa forma, sendo uma peça chave para ele por causa da taxa de intercâmbio. Eu não faria esse mesmo projeto outra vez, mas tampouco acho que ele era um projeto irrelevante. Por isso eu sempre digo que o melhor mesmo é pesquisar bastante e refletir antes de ir. Escolher bem a instituição, estar atento às necessidades, é o que vai separar de uma experiência benéfica para todos de algo meia boca.

  • INCRÍVEL! Sou voluntária em uma organização que vende intercambio social e sempre temos que fazer essa explicação, ter algo publicado, por um não membro, é muito importante pra nós, muito obrigada por tirar um tempo pra escrever sobre isso. Muitos movimentos foram frutos de intercambios voluntários e esse é nosso objetivo, é um dos melhores investimentos que fiz na minha vida, recomendo a todos!

    • Jacqueline, a AIESEC foi a organização que me levou para a Índia. Fico feliz que o texto vá ajudar de alguma forma.

      Abraços!

  • Além da óbvia importância do tema (o conteúdo), vim aqui elogiar o texto (a forma). Bom demais, naty =) Melhor conjunto de 3 pessoas que escrevem bem.

  • Mais uma vez vocês do 360 Meridianos quebrando tudo!! Trazendo reflexões importantes e que são geralmente deixadas de lado...
    Eu assumo que sou uma das pessoas que nunca entendeu o motivo da cobrança de taxas (muitas vezes bem altas) para voluntários. Eu sou bastante cética pra algumas coisas e, nesses casos, fico sempre com a pulga atrás da orelha, questionando se esse dinheiro está mesmo sendo investido no projeto ou se acaba sendo desviado para bolsos interesseiros. De qq forma, adorei ler seu post - me mostrou um outro ponto de vista. Bjs

    • Ei Carol, tem que ser cética mesmo, porque tem muito programa por aí que é picareta e só quer lucrar em cima dos intercambistas e pouco faz para ajudar as organizações, por isso é importante pesquisar bem antes de viajar. Nos outros textos sobre trabalho voluntário e falo mais sobre como encontrar um programa que valha a pena.

      Abraços :)

  • Muito bom o artigo!! Eu sempre me incomodei com essa visão (quase que interesseira) que se tem sobre o trabalho voluntário, mas nunca havia visto ninguém falando tão bem sobre isso :) adoro todas as postagens que vocês fazem sobre questões sociais vinculadas ao ato de viajar, parabéns!

    • Ei Carina, também me incomodava muito essa visão, por isso resolvi falar sobre isso. Obrigada por comentar!

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Publicado por
Natália Becattini

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