Que tal fazer um tour por Chernobyl?

É talvez estranho querer fazer um tour por Chernobyl, região da Ucrânia que ainda tem níveis altos de radioatividade e que pode, a qualquer momento, sofrer outro acidente nuclear. Estranho é sim, mas não deixa de ser fascinante.

Um inglês chamado Danny Cooke, que é diretor e cineasta freelancer, fez o favor de ir até Pripyat, a cidade que foi abandonada após o acidente nuclear e passou a fazer parte de uma “Zona de Exclusão”, e filmou cenas do local.

O resultado não é nada menos do que impressionante, com fortes imagens de uma cidade fantasma da Era Soviética que parece congelada do tempo, com árvores que tomaram conta da paisagem e prédios abandonados ainda cheios de objetos pessoais e máscaras anti-gás.

Postcards from Pripyat, Chernobyl de Danny Cooke

Claro que depois de assistir esse vídeo, eu fiquei me coçando para saber mais sobre o tour. Já tinha lido um relato muito interessante de um jornalista da Newsweek, Alexander Nazaryan, a respeito – recomendo para quem lê em inglês. Então, seguem aqui todas as informações curiosas sobre a visita à Pripyat.

O que foi o acidente nuclear de Chernobyl?

No dia 26 de abril de 1986 ocorreu uma explosão no reator 4 da Usina de Chernobyl, na Ucrânia. O acidente foi uma mistura de falha dos operadores da usina e má engenharia. Mas o fato é que o sistema de segurança do reator não conseguiu segurar o calor da explosão e um incêndio muito tóxico espalhou material radioativo não só na área da Usina, mas pela Europa toda.

Aliás, o Governo da União Soviética não divulgou o acidente logo após o acontecido, tentando esconder o fato do resto do mundo. Mas aí os outros países europeus começaram a detectar níveis altíssimos de radiação na atmosfera, obrigando o governo soviético a admitir o ocorrido  na Ucrânia.

A contagem de mortos após o acidente também é incerta. Houve as mortes diretamente relacionadas à explosão e as 56 pessoas que tiveram contato com alta radiação. Porém, ao longo dos anos, milhares de pessoas da região morreram de câncer. A Organização Mundial de Saúde estima que seriam 4000 pessoas, mas ONGs relacionadas à saúde e meio ambiente acreditam que o número é muito maior.

O reator de Chernobyl. Crédito: Carl Montgomery -CC BY 2.0

Houve duas ações imediatas após a Explosão em Chernobyl. Num período de até 10 dias após o acidente, cerca de 130 mil pessoas foram evacuadas numa área de 30 km em torno da Usina, o que inclui toda a cidade de Pripyat, que foi fundada nos anos 70 por trabalhadores da usina e tinha cerca de 50 mil habitantes. Além disso, durante esse mesmo período, helicópteros jogaram cerca de 5 mil toneladas de areia e chumbo sobre o reator, que não parava de queimar.

Em novembro do mesmo ano foi finalizado o “Sarcófago”, uma estrutura provisória de concreto destinada a conter a radiação e o combustível remanescente dentro do reator. Essa estrutura foi prevista para durar 30 anos. Há um risco iminente da estrutura ruir e causar um acidente muito pior do que a primeira explosão e espalhar no mundo inteiro níveis de radiação altíssimos.

Desde 2007 está sendo desenvolvido um projeto chamado New Safe Confinement (NSC). A ideia é criar uma estrutura que conseguiria conter a radiação com segurança por mais 100 anos. A inauguração está prevista para 2015.

Como é a visita à Pripyat?

Imagem em Domínio Público

Pripyat e a Usina de Chermobyl ficam no centro da Ucrânia, bem perto da fronteira com a República da Bielorrússia. Dizem que é uma área inabitável pelos próximos 20.000 anos. A visita à zona de exclusão só pode ser feita com autorização do governo, que é concedida quando você contrata uma das agências que faz as visitas turísticas à região (não se esqueça que brasileiros não precisam de visto de turista para entrar na Ucrânia – mais informações no site da Embaixada da Ucrânia).

As visitas em geral duram 1 ou 2 dias (algumas duram mais tempo do que isso). Nesse período, você caminha por vários pontos demarcados de Pripyat e Chernobyl, além de ver de longe o Sarcófago. Desde 2008 não é permitido entrar em nenhuma das construções, porque elas têm risco de desabar (26 anos sem manutenção…). Também não é permitido transitar em nenhum ponto da Zona de Exclusão sem a presença de um guia. A Dri, do blog Dri Everywhere fez o tour em 2012, tem muitas fotos e um relato bem interessante.

Você caminha pela cidade com um medidor de radiação (cujo aluguel é pago) para comprovar que não está indo para nenhuma área com altos níveis de radiação. Além disso, na entrada há o checkpoint Dytyatky, onde especialistas medem seus níveis de radiação ao sair da Zona de Exclusão.

Crédito: Timm Suess – CC BY-SA 2.0

O nível de radiação nas áreas que os turistas frequentam é muito baixo, não apresentando um risco para a saúde. O problema, na realidade, é você carregar com você (ou dentro de você) elementos radioativos através do ar, água ou alimentos. Por exemplo, é bom evitar as áreas cobertas com vegetação, porque é nesse lugares que é mais alta a contaminação e mais difícil evitar tocar ou inalar alguma coisa perigosa.

Estudos recentes mostraram que as árvores caídas na Zona de Exclusão ainda estão lá de boas até hoje porque a radiação inibiu a decomposição microbiológica e que toda camada de solo nessas áreas está altamente contaminada. Ugh!

O passeio de dois dias costuma levar as pessoas para visitar uns velhinhos que decidiram por própria conta e risco voltar a viver nas vilas da Zona de Exclusão. Eles são chamados de samosels e vivem numa condição de pobreza e vulnerabilidade, afinal, além da radiação, estão em uma área proibida, isolada e sem assistência do governo. Enfim, acho má ideia esse tipo de zoológico humano, até porque se você visita a casa de um samosels precisa levar um presente ou dinheiro.

Crédito: Taras – CC BY-SA 3.0

A estrutura “turística” da Zona de Exclusão é bem razoável. O governo mantém uma cantina na área, onde são oferecidas refeições diárias (com alimentos trazidos de fora), que atende aos visitantes e guias. As visitas partindo de Kiev, capital da Ucrânia, levam cerca de 8 horas. Os medidores de radiação indicam que é seguro comer essa comida, mas muita gente internet afora diz que é melhor levar sua própria água e sanduíche. Aí vai da coragem e confiança de cada um.

O governo também tem dois hotels dentro da Zona de Exclusão, o Hotel Desyatka e o Hotel Pripyat (teoricamente há uma terceira opção, mas está temporariamente fechada). Além disso, há uma opção de hotel mais confortável, chamado Countryside Cottage “Chernobyl Hotel”, localizado fora da Zona de Exclusão, a cinco quilômetros de distância do checkpoint.

Quanto custa um passeio por Chernobyl?

Crédito: Timm Suess – CC BY-SA 2.0

Como eu disse, várias agências fazem esse Tour por Chernobyl. Encontrei três sites que achei mais confiáveis e que têm os tais bons reviews no Trip Advisor: a Chernobyl-tour (com os 111 comentários excelentes), a SoloEst Travel (indicada por todos os veículos de mídia internacional) e a CHERNOBYLwel.come.

O passeio de um dia, com ida e volta de Kiev, custa a partir de 115 dólares, mas esse valor varia muito de agência para agência e de acordo com a temporada. É necessário reservar com pelo menos 15 dias de antecedência para conseguir a autorização do governo.

*Imagem Destacada: Printscreen do vídeo Postcards from Pripyat, Chernobyl de Danny Cooke

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Luiza Antunes

Luiza Antunes é jornalista e escritora de viagens. É autora de mais de 800 artigos e reportagens sobre Viagem e Turismo. Estudou sobre Turismo Sustentável num Mestrado em Inovação Social em Portugal Atualmente mora na Inglaterra, quando não está viajando. Já teve casa nos Estados Unidos, Índia, Portugal e Alemanha, e já visitou mais de 50 países pelo mundo afora. Siga minhas viagens em @afluiza no Instagram.

Ver Comentários

  • Um dia ainda vou visitar Pripyat. É um lugar que me despertou muito interesse desde que comecei a pesquisar sobre isso. Muitos me chamam de louco em querer visitar uma cidade fantasma radioativa. Um dia, não sei quando, mas vou.

  • Pretendo conhecer Chernobyl em maio deste ano, minha namorada é ucraniana de Kiev, o problema da guerra na Ucrânia é no sul e parte do leste do país, ma região da Criméia. No oeste, na parte central e principalmente no norte onde está Chernobyl, não há problemas. O país é lindo.

  • Luiza,
    A Adriana Miller do Drieverywhewre fez esse passeio. Para mim foi um dos posts mais incríveis do blog dela. Tenho muita vontade de conhecer!

    • Ei Lili,

      Vou olhar lá no blog dela e indicar no post! Obrigada pela dica.

      Ps. pena que não deu para a gente encontrar mais, foi tão corrida a passagem por Londres. Se vier em Portugal, não esquece de me avisar =)

      bjs

      • Caros amigos, Vou visitar Chernobyl em maio com minha noiva que é Ucraniana.
        O problema da guerra no país é no sul e lete, na região da Criméia. Na parte central, Oeste e Norte onde estar Chernobyl, não há problemas. O país é lindo para se visitar, e principalmente barato. Para quem vai boa viajem!!!

  • Segundo o site da embaixada da Ucrânia que vocês linkaram, Brasileiros não precisam de visto para fins de turismo, que seria o caso de visitar Chernobyl

    • Oi Yan,

      Você está certo, me confundi na hora de escrever. Obrigada pelo alerta, vou corrigir no post.

      ps. Desculpe a demora para responder, eu estava viajando/de férias.

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Luiza Antunes

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