Um roteiro pelos segredos de Florença em Inferno, de Dan Brown

Algumas vezes você não curte muito um livro, mas continua lendo porque ele tem algo que te interessa muito. Essa é a minha história com Inferno, de Dan Brown. O último lançamento do autor de bestsellers como Código da Vinci e Anjos e Demônios, na minha opinião, passa longe do mistério que te prende e surpreende  dos outros livros.

Provavelmente isso acontece por conta da fórmula novamente repetida pelo autor: simbologista Robert Langdon, mais uma moça, um mistério, um vilão conspirando contra a humanidade, várias obras de arte e uma cidade turística. Você pode não ter percebido, mas eu acabei de te contar praticamente toda a história de Inferno. Mas por que eu continuei lendo o livro?  O motivo não só existe como tem nome: Florença.

Se você tem lido o blog nas últimas semanas, já percebeu meu fascínio com a cidade. Acontece que li Inferno uma semana antes ir viajar e estava ansiosa por conhecer a capital do Renascentismo. A história se passa em Florença porque Langdon acorda num hospital na cidade e tem que desvendar os mistérios que o cercam, guiado por Dante Alighieri e a Divina Comédia.

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Este post é tanto para aqueles que leram e gostaram do livro, quanto para aqueles que não pretendem lê-lo, mas querem saber mais sobre os segredos de Florença que Dan Brown descreve. Se você não leu, mas ama os livros do autor e só está aguardando uma oportunidade, fica um alerta:  há alguns spoilers leves pela frente.

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A Divina Comédia

Poema épico com 14.233 versos que descreve uma jornada pelo Inferno, Purgatório e Paraíso. O inferno de Dante, escrito no século 14, transformou a noção mundial do que seria a punição pós-morte. Tal ideia de um mundo inferior fascinou as massas, uma vez que Dante deu uma visão nítida a um conceito abstrato. Segundo Brown, depois da publicação do livro, a Igreja Católica ganhou muitos fiéis, todos atemorizados com tal ideia de inferno. Grandes artistas, como Botticelli, se inspiraram no conceito proposto por A Divina Comédia para criar imagens da terra do capeta.

A Chiesa di Santa Marguerita dei Cerchi, bastante próxima de onde fica o museu que era casa de Dante, é uma capela onde, aos 9 anos, Alighieri viu pela primeira vez Beatriz Portinari e se apaixonou por ela por toda a vida – além de ser a quem ele dedicou os cantos de seu Paraíso. É nessa Igreja que está o túmulo de Beatriz.

Os Jardins Bobolli e o Palazzo Pitti

Florestas, labirintos, grutas e ninfeus. Assim começa a descrição de Brown sobre os jardins construídos pelos Médici. Dali, ele pretendia chegar ao Palazzo Pitti e cruzar a ponte para a cidade velha. O Palácio Pitti serviu de sede para o grão-ducado dos Médici e possui 140 aposentos que hoje são atração turística.

Os jardins, que cobrem 5 hacres de terra, foram projetados por Giórgio Vasari, Niccolo Tribolo e Bernardo Buontalenti. Ali você pode encontrar, por exemplo, uma lagoa com uma pequena ilha, conhecida como O Isolloto, onde fica uma estátua de Perseu montado em um cavalo, com metade do corpo submerso.

Os jardins são cortados de leste a oeste por um caminho principal conhecido como Viottolone, um caminho largo, ladeado por ciprestes com mais de 400 anos. Uma opção menos aberta para caminhar pelos jardins – e excelente para Langdon fugir – é a La Cerchiata, uma trilha mais fechada, com árvores curvadas formando arcos.

Foto: Ricardo André,  Wikimedia Commons 

No fim da Cerchiata você encontra o mais famoso chafariz dos Jardins de Boboli, uma escultura de bronze de Netuno de Stoldo Lorenzi. Ali perto, descendo uma ladeira, encontra-se o Palacio Pitti. O palácio dos Médici está num vale, e não no topo de um morro. Isso é bastante incomum para época, uma vez que um terreno rebaixado é mais difícil de ser defendido, mas o efeito da construção morro abaixo é bastante interessante. E o fato de ser construído com uma sólida estrutura de pedra permitiu que Napoleão fizesse ali seu quartel general, quando esteve em Florença.

Ponte Vecchio e o Corredor Vasariano

A certa altura em sua fuga nos Jardins Boboli, Langdon segue para uma escultura de um anão obeso e nu montado numa tartaruga gigante. O nome da escultura é Braccio di Bartolo e perto dela há um lance de escadas que leva para uma gruta, onde você pode ver o famoso brasão da família Médici. Nessa gruta, chamada de Gruta de Buontalenti, existem três câmaras e um fluxo constante de água, para criar o efeito de uma caverna de verdade. É ali que se encontra a saída do Corredor Vasariano.

O Corredor foi projetado por Vasari em 1564, a pedido de Cósimo I de Médici, para ligar o Palácio Pitti ao Palácio Vecchio, atravessando a Ponte Vecchio e a Galeria Delli Ufizi. O que antes era uma passagem secreta, hoje é um museu bem exclusivo, que abriga, entre outros, a maior coleção de autorretratos do mundo. Das janelas panorâmicas no Corredor, é possível ver a Ponte Vecchio logo abaixo.

Dan Brown conta que em 1216, um nobre chamado Buondelmonte recusou um casamento arranjado e acabou sendo brutalmente assassinado na Ponte Vecchio. O crime foi o estopim para um conflito sangrento entre duas facções políticas em Florença, os Guelfos e os Gibelinos. Foi essa disputa que causou o exílio de Dante. Em A Dívina Comédia, ele diz: “Ó Buondelmonte, por desventura desse ouvido à voz alheia e teu noivado não honraste, causando um mal tamanho!”. Hoje você pode encontrar na Ponte Vecchio duas placas com citações do Canto XVI do Paraíso, próximas ao local onde ocorreu o crime.

Palácio Vecchio

A Batalha de Marciano, de Giorgio Vasari, fica no Salão dos Quinhentos, dentro do Palácio Vecchio. O que atrai Langdon para esse mural de 17 metros de largura e três andares de altura, são as palavras Cerca Trova (ou Buscas e Encontrarás) escritas em letras miúdas perto do topo do quadro, descobertas há somente 30 anos. Mais precisamente, você pode ver a expressão em um estandarte de batalha verde. Reza a lenda que as palavras são pistas sobre um afresco perdido de Leonardo da Vinci que estaria escondido naquela parede.

A história de Vasari também é muito importante para a humanidade. Além de pintor e arquiteto brilhante, ele escreveu um livro intitulado “Vida dos Artistas”, que trata-se de uma coletânea de biografias dos grandes artistas da época e é leitura obrigatória para qualquer pessoa que estuda história da arte.

O Salão dos Quinhentos já foi o maior do mundo. Foi construído em 1494, como sala de reuniões do Conselho da República Florentina. Cosimo I pediu que Vasari ampliasse o salão. O arquiteto aumentou o pé direito, criando caixilhos envidraçados que permitem a entrada de luz natural. São 1200 metros quadrados que abrigam esculturas e pinturas. Foi nesse salão também que dois grandes rivais, Leonardo da Vinci e Michelangelo, foram convidados a fazer murais em paredes opostas – nenhum dos dois terminou a tarefa.

O Palácio Vecchio também tem diversas passagens secretas, que podem ser descobertas num tour particular. Langdon busca o Studiolo, um ateliê secreto projetado por Vasari. Muitas das passagens secretas no palácio encontram-se atrás de quadros nesse estúdio. De lá, ele parte para uma parte do Museu do Palácio Vecchio que conserva uma a máscara mortuária de Dante. A máscara foi feita em gesso, a partir do rosto morto do poeta, e é guardada em Florença, o local que ele nunca pôde retornar, seu Paraíso. Outra passagem secreta se encontra na Sala dos Mapas Geográficos. Mais exatamente, atrás do mapa da Armênia. O Palácio Vecchio espertamente oferece um tour pelo Inferno de Dan Brown, incluindo as áreas secretas. Clique aqui para mais informações.

A Piazza del Duomo

Langdon passa admirado pela Catedral de Santa Maria del Fiori, com seu Duomo construído por Brunelleschi, depois cruza com o Campanário de Giotto, onde reflete sobre como a construção sobreviveu durante séculos a terremotos e guerras. No entanto, ele está em busca do Batistério de San Giovanni, um prédio construído em octógono perfeito, número que representa renascimento e criação: Deus criou o mundo em seis dias, descansou no sétimo e no oitavo os cristãos renasciam por meio do batismo. Foi nesse batistério que Dante e muitos outros cidadão proeminentes de Florença foram batizados.

As portas do Batistério são chamadas de Portões do Paraíso. Foram feitas em bronze foleado a ouro, com 5 metros de altura e decoradas com 10 belos painéis de figuras bíblicas. Foi Michelangelo quem deu esse apelido carinhoso. O livro conta que as portas que vemos na Piazza del Duomo são, na verdade, cópias. As originais estão sendo restauradas no Museu dell’Opera del Duomo. Um exame cuidadoso vai perceber, ainda, que não há maçanetas nos Portões do Paraíso. Acontece que elas abrem por dentro, para evitar distrações na bela obra de arte que são.

Dentro do Batistério, o mosaico no teto é outra obra de arte e representa Jesus julgando redimidos e condenados. Os pecadores eram devorados e torturados por Satã. Langdon, aos observar o mosaico, imagina o jovem Dante observando aquele teto, que anos depois pode tê-lo inspirado a escrever seu Inferno.

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Luiza Antunes

Luiza Antunes é jornalista e escritora de viagens. É autora de mais de 800 artigos e reportagens sobre Viagem e Turismo. Estudou sobre Turismo Sustentável num Mestrado em Inovação Social em Portugal Atualmente mora na Inglaterra, quando não está viajando. Já teve casa nos Estados Unidos, Índia, Portugal e Alemanha, e já visitou mais de 50 países pelo mundo afora. Siga minhas viagens em @afluiza no Instagram.

Ver Comentários

  • Luiza, muito obrigado pela sua postagem. Está excelente. Já li INFERNO, três vezes. Pena que o filme está completamente deturpado . Até alguns nomes trocaram, assim como a lourice e peruca da Sienna.

    • Oi Marcelo,

      Nunca vi o filme, acredita? Como não curti tanto o livro, acabei nunca procurando o filme para ver. Seu comentário me convenceu de que fiz uma boa escolha rs

  • Gostei!!! Se eu tivesse meios financeiros com certeza eu estaria lá agora! Eu amo descubrir histórias e coisas misteriosas, um dia irei pra lá.

  • Sou fã de Dan Brown e ontem assisti mais uma vez *inferno*.
    Confesso que com muitas coisas apresentadas no filme sobre os segredos de Florença,eu descobri seu post.
    Cara muito bacana, a gente vai lendo e sem querer está envolvido.
    Parece uma história *Browinna*.
    Gostei de sua maravilhosa dica.
    E gostaria de segui-la no face

    Gosto demais de assuntos desse tipo.
    Obrigado querida Luiza

  • Um dia vou ganhar na loteria e vou conhecer tal lugar.... Assistí o filme e me interessei pela historia, procurando no google sobre, vim de cara nessa página. Adorei o post. Me fez interessar ainda mais para conhecer a Itália com minha esposa e meu filho de 2 anos. Espero um dia conhecer tudo isso. Legal, muito legal sua matéria. Parabéns!!!!

    • Oi Anderson,

      Não precisa ganhar na loteria. Desculpe falar isso sem conhecer suas condições de vida, mas para viajar não precisa gastar uma fortuna. Uma viagem econômica para Itália sai mais ou menos a 65 euros por dia, por pessoa. Isso daria, para uma viagem de 10 dias pela Itália com a sua mulher e seu filho um total de 13 mil reais. É bastante grana, eu sei, mas também não é um sonho impossível se vocês tentarem economizar por um ano.

  • Passei por florença.. vi varios desses lugares.. mas como não estudei antes...agora que estou vendo onde realmente estive.. isso é uma experiência muito boa, mas somente os desatentos vão tê-la

  • Parabéns pelo post..li fortaleza digital, o codigo da Vinci, o símbolo perdido, anjos e demônios e Inferno..gostei d todos, fico admirado pelo trabalho d pesquisa feito pelo Dan Brown

  • Oii, gostei muito do teu post! Estou planejando uma viagem para a Itália apenas para visitar Florença, tudo por causa deste livro... Queria saber se você conhece alguém que já fez o roteiro do livro em Florença... Eu estava a fim de ir nos lugares na ordem que o personagem no filme vai... O que você acha?

  • Ola Luiza, muito bom o post!
    O livro realmente é muito bom...
    Farei uma viagem a Italia em abril, e ficarei 4 dias em Florença.
    tenho uma dúvida: como faço para visitar o corredor Vasari?
    Não encontro muito coisa sobre o assunto. Encontro em alguns sites a opçao de tour guiado, porém são muito caros, e não sei até que ponto são sites confiáveis. Podes dar uma dica?

    Muito obrigado,
    Matheus

  • Este post é parada obrigatória para quem está lendo o livro.
    O livro realmente empolga menos, mas a vontade de conhecer Florença é imensa!
    Depois de Código e Anjos, tive que ir à Roma, Florença com certeza será um destino nos próximos anos.
    Logo venho apanhar mais dicas de lá.
    Obrigado Luiza!

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Publicado por
Luiza Antunes

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