Visita à cidade do trovão, a zona arqueológica do Tajín

Uma vez, em Roma, me revoltei com o comentário de dois argentinos sobre o Fórum Romano: “é só um monte de pedras”, disseram. Eles, no entanto, tinham um ponto. Quando não se conhece o simbolismo de uma ruína, é difícil imaginar o que aquilo poderia representar para a história ou a importância que um dia aquele lugar teve para seu povo. Tudo vira pedra.

Sem conhecer nada sobre os totonacas, o Tajín poderia ser só mais uma ruína antiga no México. Podemos caminhar por ali sem ter nenhuma ideia de que, centenas de anos antes, uma civilização inteira invocava o sol, a chuva e o tempo do alto daquelas pirâmides. Que sacrifícios ocorriam ali para honrar deuses que hoje estão mortos ou que um imperador chamado 13 Coelho foi seu habitante mais ilustre, devido a sua grande força política. Sabendo de tudo isso, no entanto, a visita ganha cor e o lugar ganha vida.

Quando pensamos na história do México, é impossível não se lembrar das grandes civilizações pré-hispânicas. As ruínas mais famosas remetem a dois desses grandes povos: as imponentes pirâmides astecas de Teotihuacán, perto da Cidade do México, e a bela Chichen Itza, a cidade maia no litoral atlântico. Aquele território, no entanto, era habitado por dezenas de outros povos, cada um com sua história, cosmovisão, língua e cultura. A zona que compreende os estados de Veracruz e a serra de Puebla era de domínio dos totonacas e até hoje é conhecida como Totonacapan.

Na língua pré-hispânica falada na região, tutu significa três, e naku, coração. O Tajín formava, junto com as cidades de Zempoala e Xihuitzlan, os três corações desse império. Ali viviam reis, governantes, sábios, doutores, sacerdotes, políticos, enfim, apenas a classe mais alta e intelectual da sociedade totonaca. Seu nome significa cidade do trovão, porque sua zona cerimonial – a parte aberta a visitação, onde ficavam os templos -, era dedicada aos deuses da chuva e do trovão.

Por quinhentos anos, o Tajín permaneceu abandonado e seus dias de glória foram esquecidos sob a era que tomou conta dos edifícios sagrados. Só foi redescoberto no século 20 e, depois de intensos trabalhos de escavação e restauração, reaberto ao público em 1977. Foram encontrados 128 templos dentro dos limites do que antes era a principal cidade do mundo totonaca. Desses, apenas 40 compõem o circuito de visitação turística. Dentro do parque do Tajín ainda vivem comunidades totonacas que preservam muito de sua língua, tradições e cultura. Muitos deles trabalham na área arqueológica, vendendo água, refrigerante e lanchinhos típicos para os turistas, mesmo falando apenas um espanhol rudimentar.

O redescobrimento do lugar também marcou o renascimento de seu simbolismo religioso para os totonacas. Todos os dias 21 de março, dezenas de milhares de pessoas fazem sua peregrinação ao Tajín para celebrar o equinócio de primavera, data em que os dias e noites têm a mesma duração. A festa tem uma grande importância na concepção totonaca de universo desde tempos ancestrais e eles acreditam que visitando a cidade sagrada podem recarregar suas energias. Hoje, a festa também é chamada de Cumbre Tajín, ou Festa da Identidade, pois celebra as tradições do povo com música, dança, apresentações e conferências, tudo isso durante cinco dias.

Um povo artístico, estético e pacífico, os totonacas imprimiram sua personalidade na arquitetura do Tajín. O principal templo ali é o Templo de los Nichos. Com 18 metros de altura, a pirâmide é toda enfeitada com 360 nichos decorativos, que representam os 360 dias de trabalho do ano. Os cinco dias que sobram na conta eram os únicos em que eles descansavam no ano, geralmente comemorados com festa – a única oportunidade de se embebedar um pouquinho que era socialmente aceita em tempos pré-colombianos, com pulque e mescal.

O Templo dos Nichos

Os templos ali são como matrioskas – aquelas bonequinhas russas -, construídos em cima de templos antigos, a cada 52 anos. Isso porque eles acreditavam que esse era o tempo de vida útil de tudo no mundo. Nem mesmo as pessoas completavam 53 anos: os poucos que chegavam a essa idade tinham erros e dívidas perdoadas e a contagem de anos começava outra vez, como se renascessem. O simbolismo do número tem um motivo, já que é o tempo que demora para que os calendários solar, de 360 dias, e o lunar, de 260, recomecem seus ciclos ao mesmo tempo.

Os diversos campos esportivos espalhados pela zona arqueológica podem passar desapercebidos se você não souber o que procurar. Era no descampado que se realizavam as partidas de Tlachtli, um jogo que podia durar horas ou dias, até que um dos jogadores conseguisse passar a bola de borracha por um estreito aro, utilizando o quadril. Aos vencedores era concedida a honra mais alta naquela cultura: se juntar aos deuses.

O campo do jogo de bola meso-americano, no Tajín

Como visitar a zona arqueológica do Tajín

Como chegar: Dá para visitar a zona arqueológica do Tajín facilmente desde Papantla de Olarte. O parque fica a cerca de 15 minutos de táxi do centro da cidade e o trajeto sai por 80 pesos (R$ 16). Há também ônibus que saem de Papantla ou Poza Rica. É possível fazer o passeio estando em Veracruz, porém a distância é maior. Há agências que vendem o passeio saindo de Veracruz e incluem também uma visita à Papantla.

Quanto custa: 70 pesos (R$ 14). O ingresso pode ser adquirido na bilheteria do parque, sem necessidade de comprar com antecedência.

Dicas espertas: Contrate um guia na entrada da zona arqueológica. Eles não cobram muito caro e dão à visita todo um novo significado com as informações que compartilham. Os guias no Tajín são totonacas legítimos e têm muito a dizer sobre sua cultura. Do lado de fora do Tajín há um mastro no qual se realizam diariamente apresentações dos voadores de Papantla. É uma boa oportunidade de ver o espetáculo se você não viu em outros lugares.

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones e no Youtube. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

Ver Comentários

  • muiiito obrigada mesmo pelas dicas. eu viajo em junho e já estava louca para conhecer el tajin. depois de ler teu texto...não perco esse passeio de jeito nenhum. abraços.

    • Nossa, Sandra, que bacana! O Tajin é um passeio menos usual entre turistas no México, ainda mais brasileiros! Espero que você goste. Aproveite para aprender mais sobre o povo totonaca :)

      Abraços!

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Natália Becattini

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