Quando eu era adolescente, odiava axé (era modinha na época) e o carnaval de BH ainda era inexistente. Eu passava os quatro dias do feriado no Carnaval Revolução, um encontro de jovens fãs de Hard Core e de ideias anarquistas. Além de shows com bandas do cenário underground da cidade, a gente também participava de palestras e oficinas de grafite, estêncil e outras formas de intervenção urbana. Na época, eu nem sabia que aquilo tinha um nome, mas esse foi o meu primeiro contato com a Arte de Guerrilha. Anos mais tarde, durante a minha última viagem a Berlim, acabei entrando em contato mais direto com esse tipo de intervenção urbana e os ideias dos artistas.
Nem balas, nem pólvora. A Arte de Guerrilha é uma forma de transformar os espaços públicos com obras de arte – seja isso legal ou não. Como armamento, fios, adesivos, plantas, projeção de vídeos, ideias e palavras. Na linha de frente, artistas de todos os tipos que esperam, com seu trabalho, levar mais consciência cidadã para as grandes cidades.
De acordo com Keri Smith, autora de livros como “Destrua esse diário”, “Como ser um explorador do mundo” e “Guerrilla Art Kit”, esse tipo de intervenção urbana é uma forma divertida de compartilhar visões de mundo, através da colocação de obras de arte em lugares públicos. Isso pode ser feito por uma infinidade de razões, como passar uma mensagem, compartilhar ideias, embelezar as cidades ou apenas por diversão.
Embora não existam regras e arte possa e deva ser feita apenas pelo bem da arte, as guerrilhas são muito conhecidas por serem usadas como uma forma de ativismo político para combater a desumanização dos espaços urbanos através de pequenas ações reivindicativas e de métodos pouco convencionais. É por isso que a maior parte dos artistas de guerrilha prefere não assinar suas obras: para eles, ser anônimo permite mais liberdade para serem controversos ou extremos em suas mensagens, fazendo com que elas cheguem a uma grande audiência.
Os coletivos e artistas que se dedicam à Arte de Guerrilha se inspiraram nas lutas armadas revolucionárias da segunda metade do século 20. Encontraram, no entanto, uma forma pacífica – mas não menos subversiva – de reivindicar o uso das cidades pelas pessoas e espalhar sua visão de mundo. O movimento se espalhou por todo o mundo, mas foi em metrópoles como Berlim, Londres e São Paulo que encontrou terreno mais fértil para florescer. É difícil morar em alguma dessas cidades e nunca ter cruzado com uma ação de arte de guerrilha pelas ruas.
Algumas ações têm alcance global e aparecem em diversas metrópoles, como as bombas de semente, também conhecidas como “Guerrilla Gardening“, que consiste em plantar diferentes plantas e flores em qualquer espaço da cidade que apresente condições propícias para que as sementes se desenvolvam. Os alvos podem ser desde recipientes abandonados – como banheiras e jardineiras – até grandes espaços abandonados. O movimento teve início em Nova York, quando, em 1973, a artista Liz Christy passou a enviar balões repletos de sementes de tomate e fertilizantes em terrenos baldios e outros espaços descuidados em uma tentativa melhorar a aparência de bairros e vizinhanças.
Outro movimento muito conhecido dentro da Arte de Guerrilha é o Culture Jamming, uma tática usada por movimentos anti-consumistas para subverter as mensagens da mídia de massas, incluindo a propaganda corporativa, e expor os métodos de controle e manipulação utilizados por esses meios. Eles podem, por exemplo, questionar imposições de beleza e de comportamento, ironizar a moda e reconfigurar logos para passar mensagens contra o domínio de multinacionais no mercado. O grafite e os adesivos são as táticas mais comuns dos adeptos desse movimento, embora protestos, festas de rua e intervenções musicais também sejam formas de culture jamming muito utilizadas.
O importante da Arte de Guerrilha é que ela te faz pensar. As mensagens, que muitas vezes abordam temas polêmicos de forma incisiva, podem nos mostrar outra face de problemas sociais, mas, mais do que isso, também nos ajudar a transformar nossa relação com as cidades. E em cidades que quase nunca são feitas para pessoas e que transformar muros em paredões cinzas é bandeira de campanha, reivindicar e embelezar nossos espaços públicos é cada vez mais urgente.
Fotos: Shutterstock
Diz uma lenda que uma antiga civilização condenada pelo pecado foi enterrada sob as areias…
“Preparem-se para curtir o dia de hoje como um verdadeiro Rockstar”, disse o guia do…
Perdido nas águas turquesa do Caribe, o arquipélago de Guna Yala, ou San Blás —…
Nesse texto você descobre a história do Parque Vigeland em Oslo, na Noruega. Trata-se de…
Nas encostas da Sierra Nevada de Santa Marta, na Colômbia, um povo luta para preservar…
Você já ouviu falar na Santeria Cubana? Mas é muito provável que você esteja familiarizado…
Ver Comentários
O problema dessas intervenções é a privatização de espaços públicos, como acontece mto na Vila Madalena/SP, por exemplo. Esse debate sobre a colisão entre liberdade de expressão e direito à propriedade dá mto pano pra manga.