Se bobear, até hoje tem gente esperando o rei voltar. Não, não estou falando do Elvis. Nem do rei Arthur. O rei que os portugueses (e alguns brasileiros) aguardavam a volta era Dom Sebastião de Portugal. Neste texto, você descobre a história do rei que desapareceu no século 16 e o mistério do sumiço, que reverberou até no Brasil.
Tudo começou quando o príncipe João Manuel morreu subitamente. Até aí tudo bem, príncipes morriam com alguma frequência naquela época. O problema é que seus oito irmãos tinham morrido também. Com isso, o rei Dom João III não tinha mais herdeiros, só uma esperança. O filho falecido, de 15 anos, tinha deixado a esposa grávida e a duas semanas de dar a luz.
Colocaram a princesa de repouso, fizeram uma vigília e esperaram. Assim que começaram as dores do parto, fizeram uma procissão de fé que movimentou toda Lisboa. Na manhã de 20 de janeiro de 1554, dia de São Sebastião – aquele santo católico que morreu com flechas por se recusar a negar Cristo -, nasceu o menino.
Deram a ele o nome do santo: Dom Sebastião, Primeiro de seu nome, o Desejado, o Encoberto, o Adormecido, o Salvador da Pátria – o primeiro e o último títulos são por minha conta.
D. Sebastião, recém-nascido em 1554 (possivelmente por António ou Francisco de Holanda)
Quando o infante Sebastião fez 3 anos, seu avô morreu, e ele tornou-se rei de todo o Império Português, que na época chegou ao pico da expansão territorial, com a conquista de Macau, em 1557, e Damão, em 1559. Sua avó, Catarina de Áustria, e depois seu tio-avô, o Cardeal D. Henrique de Évora, assumiram a regência do reino enquanto o menino não alcançava a maioridade.
Em 1567, foi fundada a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em homenagem ao jovem rei. Seis anos depois, o rei fez da cidade a capital das colônias portuguesas no Brasil.
Sebastião de Portugal aos 17 anos, quadro de Cristóvão de Morais
Tanto a educação de D. Sebastião quanto o governo de Portugal foram marcados pela forte presença da Igreja, especificamente dos jesuítas. A inquisição foi consolidada e as colônias ganharam bispados. Aos 14 anos, D. Sebastião alcançou a maioridade e assumiu o trono.
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Com uma mistura de mania de grandeza, fervor religioso e noções militares duvidosas, Dom Sebastião se lançou num plano infalível de uma nova cruzada no Norte da África. Entre a maioridade de Sebastião e a saída para a campanha no Marrocos, passaram-se 10 anos.
O jovem rei português estava preocupado com a ocupação do Império Turco Otomano no Norte da África – de fato, eles conquistaram toda a região, exceto o Marrocos.
Na sua “Jornada de África”, Dom Sebastião prometia o apoio a Mulei Maomé, sultão deposto, contra seu tio, Mulei Moluco, que tinha apoio otomano. Para o confronto, o jovem rei português levou para o Marrocos uma força militar de 18 mil soldados.
A expedição de D. Sebastião culminou na Batalha de Alcácer Quibir, também conhecida como a Batalha dos Três Reis, que terminou com os três governantes mortos. Mas foram os portugueses que levaram a pior.
O lado vitorioso, apesar da morte do debilitado sultão Mulei Moluco, manteve a mesma dinastia no poder, com seu irmão, Amade Almançor, assumindo o trono. Para comemorar a vitória, ele mandou construir o Palácio El Badi, em Marrakech, inspirado no palácio de Granada.
Palácio El Badi, em Marrakech. Saiba mais sobre as histórias da cidade
Do lado perdedor, os portugueses terminaram com cerca de 9 mil homens mortos (incluindo boa parte da nobreza) e um rei desaparecido.
Dizem que a última frase de Sebastião no campo de batalha, antes de liderar um ataque desesperado contra o exercito inimigo, teria sido: “Senhores, a liberdade real só há de se perder com a vida”. E então, teria investido seu cavalo contra as linhas inimigas.
A realidade é que ninguém sabe o que aconteceu: sem corpo, não há provas da morte, certo? E o que não faltaram foram boatos e conversas sobre o que teria sido do Rei perdido. Teve quem viu ele morrer, teve quem viu ele fugir, teve quem encontrou ele em Veneza anos depois, teve quem fingiu ser o rei desaparecido.
A verdade é que Sebastião, de fato, nunca voltou. O tio-avô, D. Henrique, assumiu o trono, mas acabou morrendo em dois anos. Enquanto os portugueses ainda lamentavam sua perda, a nobreza europeia disputava o comando do país e suas colônias. Afinal, havia muitos nobres portugueses espalhados pelas cortes.
Foi o espanhol Felipe II que levou a melhor, conseguindo subir ao trono português e unir os governos da Península Ibérica. Era o fim da independência de Portugal – e todo seu império, incluindo o Brasil – pelos próximos 60 anos.
Portugal só conseguiu recuperar sua independência com a ascensão de outra dinastia de bastardos, a Dinastia de Bragança. Mas essa é uma história para outro texto, que eu já contei aqui.
Retrato de D. Sebastião, pintado cerca de 30 anos após sua morte
Absolutamente ninguém, exceto os espanhóis, ficou feliz com a mudança na coroa. O mito talvez tenha surgido por conta do nacionalismo e da perda da independência para a Espanha: Dom Sebastião voltaria para liberar o país. O sonho cresceu e virou um movimento, chamado de Sebastianismo. Algumas revoltas foram levantadas em nome do rei desaparecido.
O messianismo relacionado a Sebastião também chegou no Brasil, embora um tanto quanto atrasado. Revoltas nos séculos 19 e 20, como Canudos, na Bahia; e Contestado, no sul do país, traziam elementos do sebastianismo e a crença de que um rei português restauraria a monarquia, a moral e os bons costumes.
O caso mais emblemático e curioso, no entanto, é o da Ilha dos Lençóis, no Maranhão. Por lá, até hoje acreditam em Dom Sebastião, como mostra um documentário da TV Câmara – há quem diga que ali existe um palácio encantado do rei e que os moradores atuais seriam descendentes dele. E outros mistérios envolvem a ilha, como o fato de grande parte da população ser albina.
O mais célebre dos reis portugueses foi uma figura extraordinária. Viveu apenas 24 anos, mas se transformou em mito. Foi ele que deu origem ao sebastianismo. Para reconstituir essa intrigante história, o autor visitou a maioria dos locais por onde passou o Sublime Rei, debruçou-se sobre documentos antigos, preciosos livros e cotejou as diferentes versões dos fatos para tirar suas conclusões.
Este é um romance histórico, baseado em fatos reais, aos quais Aydano Roriz acrescentou sua magistral e peculiar interpretação. De leitura agradável e envolvente, “O Desejado” é um daqueles romances chamados no jargão internacional de page turner. Um livro tão excitante, que não se consegue parar de ler. Saiba mais aqui.
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Tenho pena que Sebastião tenha falecido, mas se ele existisse, eu nao existia, nem joao iv, pedro ii, joao v, nao existiamos, nao.
A mae de Sebastião era a Joana da Áustria filha de um antepassado meu e com o meu sobrenome e o ADN y de Sebastião é igual aos Philippus de Espanha i, ii, iii e iv.
Estes vem de um irmao do conde henrico pai de d. Afonso Henriques rei de Portugal, e esse irmao era Conradus imperator da Germaniae e tras o meu sobrenome e o mesmo ADN y
Portanto o Sebastião esta em Portugal, eu é que ainda nao me dei a conhecer.
Existem provas em latim, genetica e este site tem o meu email e responda me que eu lhe faculto dados
Em 1567, foi fundada a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em homenagem ao jovem rei. Seis anos depois, o rei fez da cidade a capital das colônias portuguesas no Brasil.
Isso aqui não procede.
Boas, Luísa Antunes
Só tenho curiosidade numa situação, o João IV era filho de quem para restaurar Portugal ? Era neto de quem esse João IV?
Será mesmo que existiu restauração do reino de Portugal ?
Existe prova da morte de D. Sebastião, das missivas do rei de Fez ao Rei Português D. Pedro II que trás o corpo e sua espada para entregar os restos mortais, existem registos.
Pode me facultar dados em latim, como é Jornalista e apreciadora da história.
Só uma curiosidade, D. Afonso Henriques tinha o mesmo cromossoma y Rb1 U106 Z305+, de uma casa de Limburg na Bélgica e não da Bourgonha, o mesmo ADN da casa da Austria, Habsbourg, João IV, Philippe I, II, III e IV tinham todos o mesmo cromossoma y paterno. É estranho não é ?
O Sebastião quando morreu, e D. António de Crato, não transmitiram o sangue via paterna, mas o Philippus I de Espanha tinha o mesmo, não é estranho.
Os meus cumprimentos,
João
Olá, Luiza! Parabéns pelo seu texto, gostei bastante do modo como expôs a história e a personagem de Dom Sebastião. Gostaria de fazer apenas uma correção: São Sebastião - citado no texto como onomástico do rei desaparecido - não morreu a flechadas, mas sobreviveu ao martírio das flechas sendo posteriormente espancado até a morte por ordem de Diocleciano.
Saudações desde o Brasil,
João Victor Vilas
Obrigada pelo comentário João
Oi Luiza!
Como portuguesa, jornalista e amante de história, quero dar-lhe os parabéns pelo texto. Fico mesmo contente por ler algo sobre a História de Portugal escrito de forma correcta, fundamentada e atractiva. Como sabe, nem sempre é o caso.
Beijinho e bom trabalho!
Vera
Travel Content Creator, blog: portoenvolto.com
Obrigada pelo carinho Vera! Adoro encontrar portugueses por aqui.
Vou ir lá visitar seu blog! abraço