“Olhe bem Vossa Mercê – disse o escudeiro – que aquilo não são gigantes, são moinhos de vento; e os que parecem braços não são senão as velas, que tocadas do vento fazem trabalhar as mós.” (Dom Quixote, cap.VII)
Sancho até tentou impedir, mas Dom Quixote investiu enlouquecido contra os moinhos de vento, que pensava ser gigantes, apenas para ser lançado para longe, com a força da vela e do vento, pelo campo afora.
É compreensível por que o louco Quixote imaginou nos trinta ou quarenta moinhos verdadeiros gigantes. De perto, um moinho, com suas antenas e velas, chega a ter 13 metros de altura. Em funcionamento, com a força do vento e movimento de suas engrenagens, produz uma força comparável a um terremoto.
Infelizmente, campos com esses gigantes não existem mais, nem na Espanha de Miguel Cervantes, nem na Grécia. No segundo país, por exemplo, as paisagens com moinhos duraram até o século 19, quando a revolução industrial (e eventualmente a globalização) modificou num rumo sem volta a forma de produzir farinha.
Não se sabe ao certo qual foi o povo que inventou os moinhos de vento, mas o nome moinho teria origem grega, segundo orgulhosos gregos me contaram. “Mill” teria origem no rei “Milis” de Peloponeso, que descobriu a mó, as pedras redondas e planas que servem para moer os cereais. A palavra seguiu para o latim como “mola” e daí vieram as expressões nos idiomas europeus modernos. Comprovadamente, Heron de Alexandria, no século 2 a.C. foi a primeira pessoa na antiguidade a descrever moinhos de vento.
Segundo o Visit Greece, foi nos séculos 12 e 13 que os moinhos se popularizaram na Grécia. Mas é preciso ter em mente o quanto era difícil e caro fazer e manter um moinho. Não só a localização precisava ser ideal. Eram necessários, segundo o meu guia do moinho de vento de Antimachia, mais de 800 trabalhadores, como carpinteiros, pedreiros e ferreiros, trabalhando dia a noite.
Os carpinteiros de um moinho tinham que ser especialistas em cortar a madeira da forma certa e de acordo com os princípios da física para suportar, como contei ali em cima, a força de um gigante. Assim, com medo da competição, muitos construtores só ensinavam seus segredos e saberes para os filhos.
E para completar, um moleiro de sucesso precisava de um talento que estava a anos-luz da realidade da época: a capacidade de previsão do tempo para girar as velas e antenas corretamente.
Logo, não é surpresa que na Grécia de hoje não existam muitos modelos funcionais. A ilha de Kos, por exemplo, uma das ilhas do Dodecaneso com melhores condições climáticas – muito vento, pouca chuva – para a existência de um moinho de vento, teve, até o século 19, quarenta moinhos operacionais. Hoje, apenas um sobreviveu.
O moinho de vento de Antimachia, uma pequena vila bem no meio da ilha de Kos, sem vista para o mar, opera incansável até hoje – mais para o turismo do que para a alimentação do povo, é verdade. É uma propriedade de gerações da mesma família. Em 1933, depois de um grande terremoto, o padre ortodoxo Ioannis Amallos restaurou o moinho e o manteve em funcionamento até o final dos anos 1970.
“As pessoas vinham, com seus burros, de todas as partes da ilha, despejando trigo e cevada para que o moinho de vento as transformassem em farinha para as famílias. Ao invés de dinheiro, o pagamento era deixar uma parte da produção para o moleiro e seu assistente”.
Descendente desse padre, o sr. Elpidoforos Amallos decidiu, há cerca de uma década, por conta própria, restaurar o moinho da família. O primeiro desafio foi o fato de não haver nenhum trabalhador em Kos, em seus 30 mil habitantes, com os conhecimentos necessários para a construção.
Felizmente, na ilha de Naxos, onde a tradição dos moinhos se mantém, Amallos encontrou um engenheiro. O problema é que os moinhos do Dodecaneso funcionam de forma diferente dos das Ilhas Ciclades, aquelas onde estão Santorini e Mikonos. O que significou ainda mais trabalho para estudar os mecanismos e manter a autenticidade do lugar. Para completar, a madeira necessária para reconstruir o moinho de vento teve que ser importada da África.
Minha visita guiada por um dos únicos moinhos de vento operacionais na Europa começou com eu descobrindo que o prédio é dividido em três níveis. A parte inferior, explicou o guia, era exclusivamente de uso do moleiro. Hoje, ali ficam fotos da família Amallos, dona do moinho.
No nível intermediário fica a fundação do mecanismo que regula as pedras de moagem, as mós. E também é onde a cevada e o trigo ficam armazenados. E, finalmente, na parte superior acontece o processo de moagem.
A engrenagem de madeira ocupa quase todo o espaço. Duas grandes pedras maciças são atadas a um eixo de madeira vertical, que por sua vez é conectado ao impulsor e às antenas e velas do lado de fora. Também nessa parte superior fica o mecanismo de rodagem, que permite girar o teto e direcionar todo o mecanismo de acordo com a direção do vento.
O moinho de vento de Antimachia pode moer, em condições normais, entre 600 e 700 kg de cereais por dia. Parte do que eles produzem vai para a pequena loja do moinho, onde eles fazem biscoitos e pães para degustação e venda para os turistas. Parte da farinha também é vendida para os comércios e hotéis da ilha.
Serviço
O Moinho de Vento de Antimachia fica na vila de Antimachia, em Kos, na Grécia. Abre todos os dias, nos meses de verão, das 9h às 17h. A entrada custa 2,50 euros e inclui a visita guiada e degustação.
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...quixote, louco. destemido, no fundo uma lição de perceverança em que nós quando garotos e meninas tinhamos muito mais leitura dos que as crianças de hoje, criando imagens particulares e não já vindo prontas como nas tvs, facilitando o raciocínio e criando robôs teleguiados, como acontece no Brasil com este ensino que nos coloca na rabada do ensino mundial. Parabens por vcs motivarem o Sentido Crítico neste Website.
Sempre tive a curiosidade de saber como funcionavam essa maravilhas. Pensava que fossem complicados mas observei que eram muito mais complicados do que pensei.
Obrigado pelas informações. Parabéns!
De nada Paulo! Obrigada por comentar
Maravilhosa essa informação. Sou apaixonada por Quixote e moinhos de ventos. Já li o livro três vezes e me impressiona sua loucura.
Só não sabia que ainda existia muinho funcionando.
=)