Mochilão de 20 dias pelo Peru, Bolívia e Chile

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Olhos grudados nos livros de história da 5º série, não queria perder nenhum detalhe das pequenas imagens de uma antiga cidade Inca. Quantas noites de sexta privando meu sono para apreciar as belas paisagens da América do Sul no Globo Repórter. Sem a facilidade da internet, tudo se tornava mais impressionante e misterioso. “Quando na vida vou conseguir conhecer esses lugares?”, me perguntava. Cresci com a ideia de que um dia iria conhecer tais lugares, como se uma parte de mim estivesse lá.

Comecei a planejar meu primeiro mochilão para América do Sul. Parece um roteiro clichê, mas acredito que seja um dos mais incríveis da vida de qualquer pessoa que queira se aventurar por aí. Não sei falar inglês nem espanhol, mas este não seria meu problema, daria um jeito. Quero conhecer Machu Picchu, ok. Poxa vida, mas tão perto dali está o Lago Titicaca… Então vamos esticar. Mais perto ainda está Laz Paz e o Salar de Uyuni, como não conhecer? Estica.

Huuum, mas dá pra conhecer San Pedro do Atacama? Estica mais. Por que não encarar 24h de ônibus para conhecer Santigo? Claro que sim. Roteiro: ok. Tempo estimado: 20 dias. Férias para o mês desejado: ok. Mil pesquisas no 360meridianos: ok. Dinheiro: nunca. Nunca? Aperta que dá. E deu.

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Chacaltaya

Preparei minha mochila, separei todos os documentos necessários e enviei cópias para meu email pessoal, reservei todos os hostels pelo Booking.com, comprei jaquetas e roupas térmicas (afinal iria no inverno), separei alguns remédios de uso caseiro, abracei e me despedi a quem de direito.

E fui. Embarquei em Vitória/ES, dia 19/07/14, cheguei em Cusco no dia seguinte. Totalmente perdido, entendi que aquela seria uma oportunidade única para mudar minha concepção das coisas e resolvi me permitir. Conheci os principais pontos turísticos de Cusco, andei e me perdi pelas ruas da cidade.

Acostumado com os 35°C do Espírito Santo, os 5°C foram um baque. No tour ao Vale Sagrado, contemplei aquelas montanhas marrons que nada se comparavam ao que eu imaginava. Examinei as pessoas e seus costumes, gentis e coloridos, muito coloridos. De trem, numa viagem nem tão empolgante (porque já era noite) rumei a Aguas Calientes. Não consegui dormir, a ansiedade era muita.

Machu Picchu - Peru

Às 5h eu já estava de pé, e o café da manhã não desceu a garganta. Tomei um susto ao ver que Águas Calientes é cercada por montanhas quase perpendiculares ao solo. Subindo de ônibus pela estrada íngreme, chorei. Poxa vida, estava a dois passos daquilo que sonhei por tanto tempo. E Machu Picchu se revelou para mim, imponente, misteriosa e energizante.

Me isolei por um momento em um cantinho silencioso e fechei os olhos. Depois de alguns minutos, abri os olhos, e tive aquela sensação louca de estar viajando pelos meus pensamentos. Toquei o chão e era real. Permita-se andar sem pressa, apreciar a paisagem e desfrutar de uma energia única. E, por que não, considerá-la transcendental.

Leia também: Machu Picchu, nossas dicas e relatos de viagem

cusco - Peru

Em um barquinho pelo Titicaca rumo a Isla del Sol, já na Bolívia, tive contato com um tom de azul que jamais pensei existir. Nada de azul turquesa, bebê, piscina… Acho melhor defini-lo como Azul Titicaca. Em meio ao lago, surge a Ilha meio desnuda e aparentemente sem vida. Chegando lá, mochila nas costas e morro pra subir. Sobe, sobe, ufa! Não acaba. Mas cheguei.

Um vilarejo edificado sobre uma encosta de uma ilha no lago mais alto do mundo. Lá estava eu no ponto mais elevado, apreciando o pôr do sol. Por vários momentos o lago se confundia com o céu, num misto de cores. Ao fundo, os Andes, alaranjados. Ali fiz algumas orações e, no meu silêncio, busquei compreender a grandiosidade daquele lugar. Ao acordar cedo para ver o nascer do sol, tive a sensação de ter cumprido minha missão ali.

Isla del sol - Peru

Em La Paz, muda-se o cenário. Cidade grande, muito alta, soroche para lá e para cá, trânsito infernal. Parecia mais uma 25 de Março, ou como se tivesse pegado um pouco de tudo, colocado em saco e chacoalhado. Tcharan, La Paz! E é exatamente esse o ponto chave da cidade, uma mistura de tudo. Em uma rua tem-se a sensação de ter passeado por toda cidade, tamanha a diversidade de gente e coisas. A comida não é tão boa, não sei se por ter vindo do Peru, de culinária impecável. Paga-se muito barato pelas coisas, inclusive comida.

Subi parte do Chacaltaya, não consegui chegar ao cume porque não tinha pulmões para atingir os 5.200m de altitude, estacionei nos 5.000m, o que considerei um feito. Fechei meu pacote de três dias e duas noites pelo Salar, após quase ter que abortar os planos devido a uma greve que ocorria na região de Uyuni, impedindo o tráfego de ônibus. Rezei tanto que a greve acabou no dia que fechei o passeio.

Salar de Uyuni - Bolívia

Talvez o almoço com vista mais inusitada que tive foi no Salar de Uyuni. Sentado em meio ao deserto branco, pegar um pouquinho de sal do chão (de sal!) para temperar a comida e me divertir com miragens ao horizonte. Subir no alto de uma “ilha”, dar um giro de 360° e se perder pela imensidão. O que eu representava em meio a tanta grandeza? Absolutamente nada.

Contemplar lagoas verdes, azuis e avermelhadas, estar perto de flamingos, ver vulcões ativos ao longe, ver neve branquinha em pleno deserto de areia, uma montanha com 12 cores, gêiseres em meio ao nada e encarar um frio de 25° negativos, coisas que marcaram definitivamente minha estadia pela Bolívia. Mais do que isso foi ficar três dias em um jipe 4×4 com dois ingleses, um suíço e dois alemães (depois do 7×1) enrolando no portunhol.

Atividade Vulcânica

A 30 minutos da fronteira com a Bolívia, ali estava um oásis em meio ao deserto do Atacama: San Pedro, com sua temperatura linda de 20°C. Como já era mais da metade da viagem, a tensão inicial passou e resolvi levar as coisas mais tranquilamente, afinal já estava batendo o maior papo as pessoas. Ali andei de bike pelas estradas de terra vermelha e subi em um mirante com vista de todo o lugar.

Cara, quando dei de frente com o vulcão Licancabur (que só lembrava do Rei Arthur e sua espada Excalibur) de 5.500m de altitude e eu estava a apenas 2.500m naquele mirante e essa diferença pouco era notada, mais uma vez me perguntei quem eu era em meio a essa imensidão.

Uma vibe indescritível no pôr do sol na lagoa Tebinquiche, refletindo as montanhas nas águas inertes. Gêiseres incríveis, a 10°C negativos. Vales descomunais, que externam nossa capacidade de comparação com outras coisas. Uma vida noturna super agradável e um vilarejo bem aconchegante. Um céu lindo de encher os olhos. Foi como se sentir em casa, abraçado. San Pedro é daqueles lugares que eu voltarei em breve.

Mirante San Pedro do Atacama - Chile

Poderia ter ido de avião, mas como a grana já estava bem curta, resolvi encarar as 24h de viagem de ônibus até Santiago, afinal não seria o problema, quem tem dramin tem tudo! Chegando lá, fiquei deslumbrado com a vista da cidade do alto do Cerro Santa Lucia, um fim de tarde encantador, amarelado, tornando a Cordilheira do Andes bordada a ouro.

Passeei de bike por vários cantos da cidade, onde pude me sentir mais próximo da vida local. Claro que fui em vinícolas experimentar vinhos e claro que tomei um porre de pisco, sozinho na mesa de um bar. E claro que fui esquiar. Das quatro horas que estive na estação de esqui aprendendo a esquiar, passei 03h59min esborrachado no chão, ops, na neve (ainda bem). Foi muito gratificante ter terminado a viagem ali. Dia 7 de agosto de 2014 voltei pra casa.

Santiago - Chile

Foi uma viagem de extremos. De uma metrópole a um vilarejo em uma ilha. De um quarto bom para um alojamento no deserto. De temperaturas positivas e negativas. Do lago gigante em meio a cordilheira a um enorme deserto de sal cravado na mesma. De desertos com neve. Da cidade perdida. E, o mais surpreendente, do povo feliz e receptivo, sem antônimos.

Ali, olhando ao longe por cima das nuvens no voo de volta, tive a certeza que havia atingido meu objetivo.

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Júlio Dalmazio

Cansado de viajar pelo Google Maps, resolvi sair por aí conhecendo os lugares com meus olhos e pés.

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197 comments

Tb não falo inglês e espanhol… da pra ir tranquilo ou passa dificuldade pra se comunicar???

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Quero fazer o Roteiro Chile e Peru, mas assim como o Julio tb não falo nem inglês e nem espanhol… Dá pra ir sem medo??? pq é a unica coisa q tá me prendendo de cair no mundo e fazer meu primeiro mochilão

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Ei Cris!
Na boa, vá sem medo de ser feliz!
Pra você ter ideia, no Chile existem placas escritas em Espanhol (claro), Inglês e Português!
Dá pra se virar muito bem, vai ser mais complicadinho nos dois primeiros dias, depois você já vai estar batendo papo em Portunhol fácil fácil… rs

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Como que eu faço pra fazer um relato da minha viagem neste blog??

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Oii!!
Queria muito saber como voce comprou suas passagens!!

Estou querendo fazer o mesmo roteiro ano que vem em julho, comecei a dar uma olhada e estou achando muito caro!!
Queria ir de FLN para Santiago/Cuzco e voltar de Cuzco/Santiago.

Qual o truque pra conseguir esse trecho barato?? Quanto voce gastou nas passagens?

Tbm acharia muuuuito interessante e me daria um adianto muito grande se você postasse uma lista dos custos (hospedagem + comida +traslados)

Obrigada! Parabéns pelo blog, muuita informação legal e útil aqui!

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Olá Michelle!
Veja bem, olhava sempre pelo Decolar, até descobrir a TAM não colocava lá o preço mais em conta das suas passagens. Como iria por 20 dias, então fui manejando as datas de ida e volta de acordo com minhas férias, selecionando a opção de “vários trechos”, desta forma comprando ida e volta no mesmo site. Da uma olhada porque as passagens saindo do GALEÃO costumam ser bem mais em conta, as vezes compensa comprar ida e volta por lá e depois olhar o trecho pra FLN.Como fui exatamente nas semanas mais caras do ano pra lá, que são as duas últimas de julho, acabei por pagar R$ 1.300,00.
Neste relato no Mochileiros eu tenho uma planilha de custos, olha lá:
https://www.mochileiros.com/peru-bolivia-e-chile-jul-ago-2014-20-dias-de-experiencias-unicas-com-custos-t103235.html

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Olá Michelli, no Mochileiros deixei um relato com custos:
https://www.mochileiros.com/peru-bolivia-e-chile-jul-ago-2014-20-dias-de-experiencias-unicas-com-custos-t103235.html

Quanto a passagem, vale olhar direto no site da empresa, pois quando olhava no Decolar o preço era bem mais caro. Paguei R$ 1.300,00 na TAM, no Decolar tava R$ 2.400,00 durante os 6 meses aneriores que pesquisei. Escolha a quantidade de dias e vá manejando no site até encontrar uma boa tarifa. Programe-se, porque julho é o mês mais caro em de passagens por lá, já que é alta temporada em ambos.
Vale dar uma olhada das passagens de ida e volta pelo GIG ou pelo GRU, geralmente GIG é mais em conta, aí depois vc olha os trechos pra FLN.

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Adorei a descrição do sentimento sobre Machu Picchu,,, esse lugar já está na minha lista há tempo…

Abçs

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A-D-O-R-E-I!!!! Estou inspirada a fazer meu primeiro mochilão em breve: junho!!! E já vou colocar na lista o Dramin, rs.

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Não esqueça o dramin, é item obrigatório! kkkkkkkkkkkkkkk

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Uauu..show seu post.mas como vc se comunicou sem saber ingles e espanhou e como e o processo de visto.tipo:eu li no 360 que para ir a Tailandia nao precisa de visto mas para a india sim.entao se eu quiser ir a Tailandia e resolver esticar meu passeio a india como eu faco?vc deu varias esticadas cpmo foi esse procrsso de visto?att Elaine Rangel

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Olá Elaine!
Veja bem, como Rafael disse, não há necessidade de visto nem passaporte para América do Sul, apenas RG. Mas como sou precavido, fiz sim o passaporte, até porque já facilita quando eu quiser sair do país naquela promoção louca que sempre surge.
Quanto a comunicação, o espanhol fui tentando enrolar. As pessoas são muito solicitas e buscam te ajudar quanto ao idioma. Levei um guia de bolso com frases prontas, mas na hora do vamo ver não adiantou muito não. Lá pelo 10º dia eu já estava batendo o maior papo! rsrs

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Muito bom e inspirador! Em setembro vou fazer exatamente o mesmo percurso, só que o inverso.

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Adorei as fotos e realmente o azul do lago Titicaca é especial! Amo a Bolívia.

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Relato maravilhoso!

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