Um segredo chamado Espírito Santo

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O pôr do sol, o mar e o horizonte tomado por dunas. Essa é uma das memórias mais incríveis que tenho de viagens pelo Brasil. E, ao contrário do que muitos pensariam ao ler a descrição, não é de uma praia famosa do nordeste. Essa viagem foi para Itaúnas, vila no norte do Espírito Santo.

Uma vila que foi tomada pelas dunas. Nos anos 70, a areia invadiu a cidade, forçando os moradores a mudar a vida toda um pouco para lá. O resultado foi um lugar mágico, que mistura praia e forró como poucos cantos deste país. Mas o Espírito Santo é bem mais que Itaúnas.

Veja também: Onde ficar em Vitória, no Espírito Santo

Dunas de Itaúnas Espírito Santo

Itaúnas

Cercado por alguns dos estados mais ricos do país, o Espírito Santo ainda é um mistério para o viajante brasileiro. E isso é uma pena. Maior que o Rio de Janeiro, dono de belezas indescritíveis, cidades interessantes e culinária rica, o ES merece estar na sua lista de desejos de viajante. Eu já viajei dezenas de vezes para lá e até morei no litoral capixaba por alguns meses, em 2013. É por isso que o 360 faz questão de sempre colocar uma opção de roteiro capixaba quando falamos de viagens pelo Brasil. Sempre.

No entanto, nossa atitude gera surpresa, principalmente por conta do povo capixaba. Já perdi a conta de quantos comentários recebi sobre o assunto, todos mais ou menos assim: “Adorei ver o meu Espírito Santo citado no texto. Isso é raro”.

Conceição da Barra Espirito santo

Conceição da Barra

Tenho uma notícia para você, caro leitor capixaba: o Espírito Santo não merece apenas ser citado num texto de viagens. Merece vários textos apenas para ele. Um guia completo – eu diria que um calhamaço, não estivéssemos numa era de conteúdo digital.

Como não falar de um estado que junta praia e montanha na mesma viagem? Ou de um estado que recebeu tantos imigrantes que sua cultura ficou marcada de forma definitiva e única?

Por que diabos um estado que tem gastronomia e história para viajante nenhum reclamar, que tem o melhor restaurante de pescados do Brasil, o maior  santuário de reprodução de andorinhas do Atlântico Sul, vários pontos de mergulho, uma rota romântica linda e pouco conhecida, um dos maiores manguezais da América Latina e o Pico da Bandeira e o Parque Nacional do Caparaó, por que, repito, por que esse estado não recebe a atenção turística merecida?

Pancas, no espírito Santo

Pancas, uma parte do Espírito Santo que ainda não conheço (Foto: KarlaFPaiva, Wikimedia Commons) 

E essa não é nem a pior parte. Ao contrário do resto do Brasil, mineiros e cariocas conhecem bem os destinos capixabas. E embora muitos deles adorem passar as férias lá, há um certo preconceito contra o Espírito Santo, principalmente por parte dos viajantes com mais dinheiro.

Foi isso que notei quando contei para os colegas da empresa onde eu trabalhava, há alguns anos, que passaria meu Réveillon em solo capixaba. “Por que não na Bahia?”, perguntaram eles. A Bahia é outro estado fantástico, claro, mas por que não no Espírito Santo?

Parque Nacional do Caparaó

Parque Nacional do Caparaó (Foto: Alexhubner, Wikimedia Commons)

O preconceito é tanto que eu costumo causar estranheza ao declarar que avalio a qualidade de uma praia, não importa a região do mundo em que ela esteja, pelas praias capixabas, onde passei todas as férias da minha infância. E que já cheguei em destino turístico do sudeste asiático, praias desejadas por milhões, apenas para olhar para o mar e dizer: “praia por praia o Espírito Santo é melhor”.

Claro, visitar outro país não se resume a pensar em faixas de areia e aquela viagem para o sudeste asiático também foi ótima. Mas algumas das praias que eu vi lá, e que atraem inúmeros turistas por ano, seriam praias normais no Brasil. Seriam praias normais no Espírito Santo.

Se um dia você resolver se aventurar por terras capixabas, meu conselho: desça em Vitória, aprecie a fantástica vista do Convento da Penha, beba uma cerveja no Triângulo das Bermudas, siga para Vila Velha e depois aproveite para conhecer Manguinhos e a Igreja dos Reis Magos (que lembra muito Trancoso, na Bahia), em Nova Almeida.

E corra para Guarapari. Não fecha a cara. Sim, eu disse Guarapari, que, como outras cidades brasileiras, sofreu com o turismo desorganizado e inconsciente. Guarapari tem praias lotadas no verão e muvuca para até eu botar defeito. Mas também tem restaurantes, mergulho, vida noturna, natureza, construções históricas e praias de pescadores onde a vida passa devagar mesmo durante a muvuca do verão.

Setiba, Guarapari

Setiba, Guarapari (Foto: Shutterstock)

E falta falar das cidades dos imigrantes, como Venda Nova ou Santa Teresa, falta falar da Pedra Azul, de Domingos Martins, de Aracruz e do Rio Piraquê-Açu. Falta falar de Conceição da Barra, de São Mateus e de Guriri. Do turismo religioso, seguindo os passos de Anchieta, do ecoturismo e do agroturismo. Falta falar de um monte de lugares que eu não conheço, porque mesmo com dezenas de viagens eu não consegui esgotar o Espírito Santo.

Ainda bem. Assim sobram motivos para voltar.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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63 comments

Aqui é lindo mesmooooo! Uma pena que os próprios capixabas possuem preconceito com o estado. Na próxima aventura, bora pro Campestre! 😀

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Obrigada Rafael
O Espírito Santo é uma delícia.

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É um prazer enorme ler coisas legais do nosso estado , ver que a Serra sendo lembrado por sua vila gastronómica ( manguinhos), e a riqueza da igreja dos reis magos .
Temos outros cantinhos aqui no município que valem a pena conhecer ,coloque na sua busca ; ruínas da igreja dos queimados ,que foi a maior enssureiçao da época da escravidão no ES .
O morro mestre Álvaro , uma das maiores elevações montanhosas da costa brasileira com 833 mts de altura , e que guarda uma das poucas areas de mata atlântica de altitude do estado .
Em jacaraipe tem a vila das artes onde se encontra a casa de pedra do artista plástico neuso ,a lagoa do juara onde se serve a melhor moqueca de tilapia da grande vitória .
A norte de manguinhos tem a praia mole que pertence a praia de carapebus ..
Igreja matriz da serra sede e igreja de são José de carapina. ..
Gratidao Man

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Adorei o post, Rafa!

De fato, nós aqui de São Paulo quase não lembramos do Espírito Santo na hora de eleger um destino nacional, mas já tem um tempo que eu tenho vontade de me debandar p/ lá nas férias! Agora tenho ainda mais motivos!

Valeu pelo post!

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Ah! O que dizer da nossa terrinha. E você, Rafael, contou muito bem os nossos segredos. Aliás, há muitos segredos a serem desvendados ainda rs. Não conhecia o blog e já me apaixonei, principalmente lendo um texto que apresenta tão bem a minha terra. Ainda quero desvendar muitos outros cantos do Espírito Santo, mas me sinto feliz em já ter passado por Itaúnas, curtido um forró com os nativos e observado, nas dunas, as estrelas. Já curti muitos carnavais em Conceição da Barra, literalmente, amor de verão. Coisa boa, viu! Espero que o mundo conheça, por meios dos textos aqui publicados, o meu Estado, a minha raiz, a minha culinária e a verdadeira moqueca, é óbvio. Parabéns!

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Gostei ainda mais, porque as minhas melhores memórias do ES estão fortemente atreladas aos tempos que passamos juntos lá, Rafa! Sdds memes, brigas às 23h56 do dia 31 de dezembro, “essa não é a meaipe que eu conheço” e tantas outras coisas haha.

=)

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Não preciso nem dizer o quanto gostei desse post, né Rafael? 😉
Que orgulho ver o ES por aqui mais uma vez e de uma forma tão carinhosa. Tomara que isso ajude a despertar o interesse das pessoas a vir pra cá.
E sabe o que me deixa mais mordido? Saber que muitos capixabas não conhecem o seu próprio Estado. O que eu tenho de amigos que nunca foram a Itaúnas… Caparaó, então, eu nem considero…
Obrigado por ajudar a desvendar esse segredo! E obrigado também por linkar o Rotas!

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Gostei demais!
Vou ler mais sobre ES, e é fácil chegar,né!
Eu começo pelo texto e por ultimo vejo quem é o autor …e eu sabia que era você desde o primeiro parágrafo.

🙂

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<3 ES! Mandou ver, Rafa!Deu dicas que um legítimo capixaba! – Nem no meu blog citei isso tudo. Parabéns!

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Cara, que felicidade ver um texto assim sobre meu Estado. Acho que tal “distanciamento” talvez seja por estarmos sufocados entre vários estados de tirar o fôlego também: sua linda e saudosa Minas, o Rio e seus predicados e Bahia com seus vários sinônimos. Mas aqui no ES, tem alguma coisa diferente que não sabemos explicar, mas tanto eu quanto você podemos sentir 🙂

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