Já ouviu falar no Djibuti? Caso a resposta seja negativa, não se envergonhe. Eu mesmo não conhecia muito sobre esse pequeno país africano até que um djibutiense apareceu numa festa lá em casa. Ele chegou de moto, junto com um sérvio. E também foi um cara do Irã. E gente do Egito, Polônia, Hungria, Japão, Indonésia, Estados Unidos, Alemanha, Índia… Quase toda sexta-feira nossa casa ficava tão cosmopolita quanto uma reunião da ONU – a diferença é que lá os representantes do Irã e dos Estados Unidos bebiam juntos. Cerveja barata, claro, afinal intercambista costuma ser um bicho pobre, principalmente quando ele é pago em rúpias.
Nós morávamos em Chandigarh, cidade planejada em estilo modernista que fica onde menos você esperaria existir uma cidade planejada em estilo modernista: no norte da Índia e pertinho do Himalaia. Dizem que lá até neva de vez em quando, mas nós não demos a sorte de ver Chandigarh coberta de branco. Pena.
“Qual foi a melhor parte do seu intercâmbio na Índia?” – costumam me perguntar desde que eu voltei ao Brasil. A resposta é fácil: as festas. E como nós fazíamos festas. Logo na primeira eu aprendi uma das lições mais importantes da Índia: “Tomarás cuidado com a Kingfisher Strong”, me avisou um nigeriano no dia em que coloquei os pés em Chandigarh.
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“Oi? Tomar cuidado com cerveja? Meu amigo, eu nasci em Belo Horizonte, a capital mundial dos botecos. A única coisa que a gente faz lá é tomar cerveja. E muita.”
E comecei a beber a tal da Kingfisher Strong. Uma garrafa, duas garrafas, três garrafas…
– “Por Shiva, é o mundo que está girando mais rápido ou eu que não consigo ficar em pé?”.
Era eu. Não consegui dar dois passos em linha reta. Azar da moita, que recebeu três garrafas de Kingfisher Strong de uma vez.
A culpa, é claro, foi do churrasco. Ou de quem teve a ideia de fazer um churrasco na Índia e convidar dezenas de pessoas. Resultado: uma asinha de frango para cada convidado e um monte de gente bêbada. Depois da primeira festa a gente aprendeu a temer a cerveja indiana. Os indianos, por outro lado, caiam de boca nela. Uma garrafa de 600ml é long neck por lá, então não espere compartilhar com os amigos uma garrafa de cerveja gelada. Eu disse gelada? Esqueça isso também.
Pelo menos meu choque cultural foi com a cerveja. Um amigo meu, indiano, também não escapou de um susto ao conviver com estrangeiros. É que homens indianos dançam entre si, sem nenhum interesse além da diversão. E ele dançava tranquilamente, até que um alemão (que no começo da festa parecia tão frio como o Kimi Raikkonen) resolveu pular fora do armário. “Tirem o indiano dali, ele não tem ideia do que está acontecendo!”, disse alguém, quando o alemão começou a transformar a dança numa coisa sensual demais.
E teve Anna Julia. Não alguém com esse nome, mas aquela música que nem os Los Hermanos gostam de tocar mais. E quem colocou a música no som não foi um brasileiro, mas um alemão, que cantou a letra inteira em português, para a alegria dos brasileiros. Oh Anna Juliaaaaa…
Algumas selfies e fotos das várias festas que fizemos na Índia
Mas nem tudo era bebederia. Antes do efeito Kingfisher, nós conversávamos. Foi assim que eu descobri que muitos iranianos se declaram persas e duvidam que o país deles tenha condição de fazer uma bomba atômica. E que no Irã tem muitas, mas muitas coisas legais para conhecer. E que quem nasce numa pequena ilha africana perto de Madagascar, chamada La Réunion, é francês. E que os sérvios acompanham a situação política do Brasil. E que qualquer festa fica melhor quando os drinks são servidos em tubos de ensaio. E que os jovens não são tão diferentes assim. Mesmo as jovens que usam burca ou os caras que vestem – com orgulho – seus turbantes. Quando deixamos os problemas políticos e as diferenças culturais de lado, todos querem mais ou menos as mesmas coisas.
Quando eu penso na Índia, fica a saudade das festas. E da casa onde morávamos, que compensava a falta de móveis com variedade de nacionalidades. Como disse o escritor inglês Aldous Huxley, “viajar é descobrir que todos estão errados a respeito dos outros países”. Viajar é encarar preconceitos.
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Oi Rafael,
Li seu post com o coração apertado. Me lembrei do meu primeiro intercâmbio (work experience) em uma cidade miúda dos EUA.
Eu ainda era uma menina, mas a casa já vivia cheia de gente de todos os cantos. Depois disso, nunca mais fui a mesma. Ainda bem. No fim, essas viagens que fazemos quando jovens, transformam a gente.
Transformam mesmo, Hery.
Saudades daquele tempo. 🙂
Abraço.
Rafael , vim morar na india por seis meses em um programa de estagio tambem . Cheguei ontem e nao da pra contar o meu susto pois eh indescritivel . Estou morando em bagalore , alguma dica ? Sobre tudo , como morar como encarar esse desafio ? Juro pensei em desistir no primeiro minuto
Oi Bárbara! Olha, primeiro de tudo fica calma, que vai dar tudo certo. Sei bem como é a sensação de chegada na Índia. Nós entramos em pânico! E olha que a gente vinha de 20 dias na Europa, então tivemos um baita choque cultural. A dica mais importante é: esteja pronta para entender que você está em outra cultura e que aí as coisas são diferentes. Fora isso, não ande sozinha à noite e evite lugares ermos. Tome cuidado com a comida e em especial com a água (sempre beba água de garrafinha e verifique se ela está lacrada). Tenho certeza que você vai fazer muitos amigos aí e que não vai faltar gente com quem você viajar, então aproveita seu tempo para conhecer a Índia, que é um país incrível. =p
Estive em Bangalore só por um dia, então não conheço muito sobre a cidade. Sei que é das mais modernas da Índia e que tem uns parques e museus legais. Enfim, acho que você escolheu uma cidade legal para morar.
E tenha certeza de uma coisa: o desafio é grande, muitas vezes você vai sentir falta do Brasil. Mas vai chegar o dia que você vai estar em casa de novo e vai sentir saudades dessa confusão aí. Acredite, aconteceu com a gente.
Se divirta! =p E pode perguntar o que quiser, que estamos sempre dispostos a ajudar.
Abraço!
Oi Rafael,
Adorei suas dicas da India! Estou indo agora em março e gostaria de saber o que levar de presente do Brasil num jantar indiano numa casa de família. Alguma idéia do que eles adoram daqui? Obrigada!
Oi Julieta! Que bom que você gostou! Acho que o melhor é levar coisas típicas do Brasil, algo que eles não tenham lá. Não sei em qual região você vive, mas pense em levar alguma coisa que seja uma marca da sua cidade, entende? Levar uma bebida típica do Brasil, tipo cachaça, é sempre uma boa também. Ou alguma sobremesa, tipo doce de leite. Enfim, pensa que para eles o Brasil é novidade, então eles tendem a gostar de presentes assim. E as famílias indianas são muito hospitaleiras. Tenho certeza que vão adorar o seu gesto. =) Espero ter ajudado!
Adorei o post! Meus primeiros anos em Londres foram assim. Festas que mais pareciam torre de Babel. E os churrascos intermináveis na nossa casa minúscula que viravam quase uma rave e duravam dias,hahaha. Comidas e sotaques de todos os lugares. Eu e meu marido nos casamos há mais de 8 anose ainda gostamos de festa como nos nossos 15 anos. Mas quando chegamos aqui tivemos uma segunda adolescência que durou anos,mas acabamos com ela antes que ela acabasse conosco! Aqui a cerveja também é forte mas pelo menos não tem briga por asa de galinha,rs.
Essas festas com gente do mundo todo são ótimas, não é Liliana? Inveja de você que fez isso em Londres. Afinal, muito melhor uma festa estilo Torre de Babel em que ninguém tenha que brigar por uma asa de galinha. =)