Eu adoro parques temáticos, mas nunca vou entender a razão para tanta gente pagar para ter uma experiência de quase morte. Pelo menos foi isso que eu senti na primeira vez que me enfiei numa montanha-russa, no Hopi Hari.
Depois da ansiedade causada pelos 40 minutos na fila, experimentei uma ansiedade ainda pior, a dos intermináveis 40 segundos em que o carrinho da montanha-russa ameaçou subir, parou, só para depois disparar em alta velocidade. Foi ali, ao perceber que segundos podem durar horas, que entendi na prática que o tempo é relativo.
Não, minha experiência passou longe de ser boa. Claro, houve o choque de adrenalina e uma sensação de alívio gigante, assim que botei os pés (bambos) para fora daquele, err, brinquedo. Apesar disso, não gostei, e prefiro evitar montanhas-russas mais radicais, mesmo quando passo por parques famosos, como a Disney ou a Universal – que continuo achando divertidíssimos.
Você acabou de descobrir que eu morro de medo de brinquedos que não assustam nem aquele seu primo de sete anos, mas esse não é o tema do post. A questão aqui é outra: a vida não é uma montanha-russa. E ainda bem (pelo menos pra mim).
Isso pode parecer contraditório, principalmente partindo de alguém que escolheu viver viajando. Mas não é. Mesmo a estrada tem sua rotina. Mesmo o mais frequente dos viajantes tem momentos de ócio, momentos de ler um livro, momentos de ver um filme, momentos de descansar, de trabalhar, de pagar contas e, claro, momentos ruins. Muitos.
Como já dissemos em outros posts, não há viagem perfeita. Muito pelo contrário, todas elas têm um lado nada glamouroso. Mesmo a viagem que parece inesquecível pelas fotos de Facebook envolve dias que, anos depois, você não vai se lembrar como foram.
Minha vida de viagens começou no dia 28 de dezembro de 2010. Foi nessa data que eu embarquei para a África do Sul. Antes daquele dia, tudo que eu conhecia do mundo era minha cidade natal, Belo Horizonte, além de cidades históricas de Minas e algumas praias do Espírito Santo e da Bahia.
Cidade do Cabo, África do Sul
Depois disso foram dezenas de destinos e meses de viagem contínua, uma história que já cansamos de contar por aqui. Não vou mentir pra você: foi fantástico. Viajar me ensinou coisas que eu jamais aprenderia de outra forma, me deu perspectivas diferentes e mudou minha vida. Eu mudei completamente, como fez questão de dizer um colega que reencontrei outro dia, depois de quase oito anos sem conversas que não fossem pelo Facebook. “Você parece outra pessoa. Até fala de forma diferente”.
Pois é. Mudei tanto que percebi que era preciso mudar novamente. Enquanto estava na Argentina, parei pra pensar nas coisas que viajar tanto me impedia de fazer. Tipo estar perto da família e amigos. Pode parecer um problema pequeno perante o desafio que é a rotina do escritório, de 9h às 18h, mas a verdade é que dava um aperto no coração toda vez que eu estava longe de pessoas queridas durante datas especiais. Como o período de festas de fim de ano. Ou um aniversário. Ou um encontrão da turma. Ou até mesmo um bar no fim de semana. Dói não estar perto.
Buenos Aires
Além disso, viajar por tempo indefinido também se torna um impeditivo em outros aspectos da vida. Mesmo adotando o estilo mais preguiçoso de viajar, a falta de um lugar para chamar de casa, para ser uma base, impedia planos mais demorados. Tipos os cursos que eu sempre quis fazer.
Foi por isso que, ao voltar da Argentina, dois meses antes do previsto, resolvi alterar meu estilo de vida. Aluguei um apartamento em Belo Horizonte. Com isso, pude me dedicar a uma atividade que eu queria desde que estava na faculdade – estou fazendo um curso de fotografia. Depois dele, virão outros, provavelmente de cinema e de edição de vídeo.
Passei os últimos meses mobiliando um apartamento e transformando as áreas entre algumas paredes num lugar que seja possível chamar de lar. Veja bem, isso não significa que estou parando de viajar. Em breve vou para Porto Alegre, onde fico por alguns dias. E no mês que vem passo por mais três estados brasileiros: Maranhão, Alagoas e São Paulo.
Bangkok, Tailândia
As viagens vão continuar. A diferença é que eu tenho um lugar para voltar, um endereço para chamar de meu, não apenas a casa da minha família. Ter um armário para guardar minhas roupas, um travesseiro próprio, uma cama conhecida, enfim, uma casa – tudo isso tem suas vantagens.
Algumas das coisas que aprendi durante esses quatro anos viajando não mudaram. Tipo a opção por uma vida simples, sem gastos desnecessários. É por isso que nem me passa pela cabeça ter um carro, por exemplo. Ou investir em bens que eu não preciso. Ou voltar para uma vida que não me permita ter a liberdade de fazer minha própria rotina.
Além de casa, o novo apartamento funciona também como escritório, um lugar em que é possível trabalhar sem dor nas costas, afinal cadeira e mesa são pensadas para um home office, não para servir o café da manhã do hostel. E isso faz diferença.
É uma nova fase da vida, que permitirá, entre outras muitas coisas, conhecer mais o Brasil. Tenho certeza que será mais uma aventura.
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Penso que o lado bom de viajar é poder voltar para seu canto, por mais que demore!
Sei como é a sensação de querer viajar e também ter o local com os livros que você não pode levar na viagem!
Vocês sabem que essa etapa será tão prazerosa quanto a outra.
Bons fluidos onde quer que estejam.
Abraços
Cleci, de Morro Reuter, RS
Pois é, Cleci.
E a vida é feita de etapas, todas têm o seu valor. 🙂
Abraço e obrigado pelo comentário.
Que bom perceber que minhas angústias são compartilhadas por outras pessoas! E não me refiro apenas à montanha russa. (que também me apavora, rss!)
Por mais que a viagem tenha sido incrível, a sensação de entrar na MINHA casa e jogar a mochila em cima da MINHA cama, é única!
Bem-vindo ao mundo seminômade!
Adorei o texto!
Pois é, Juliana. É importante saber que temos um lugar para voltar.
Agora, por exemplo, estou viajando. E está ótimo, mas vai ser ótimo poder voltar pra casa.
Abraço.
Julia Faria,
Não, você não está sozinha. O que eu acredito que mude quando se viaja muito é a habilidade de ponderar entre os pontos positivos e negativos que as fotos no Facebook não mostram. Mesmo fazendo viagens incríveis e conhecendo muitos países, em um momento da minha viagem eu passei a pensar na rotina do dia-a-dia nostalgicamente. E não adianta explicar que por hora meus maiores prazeres não vem de viagens e sim de coisas mais simples (como não ter que compartilhar um quarto ou estar em família), poucas pessoas entendem.
Fala Rafa, acompanho o 360meridianos há um tempo mas esse é meu primeiro comentário. Fico impressionado como gosto tanto de ler os posts sobre “largar tudo” e cair na estrada como gosto muito também dos posts que dão um “choque de realidade”. De fato, é bem complicado decidir entre colocar a vida em uma mala e sair por aí ou colocar uma parte da vida em uma mala e deixar a outra parte te esperando para quando voltar.
Estou iniciando um projeto com minha esposa e tomar a decisão entre deixar tudo ou deixar uma parte não está sendo nada simples. Mas enfim, grandes decisões não costumam ser simples mesmo! Parabéns pelo trabalho de vocês três aqui no blog, tenho certeza que ajudam e inspiram muitos a se mover e tirar os planos do papel. Abraço e sucesso na nova empreitada de seminômade.
Oi, Adriano!
Antes de mais nada, obrigado por comentar! 😉
Fico feliz de saber que você gosta desses dois tipos de post, afinal a mensagem que queremos passar é a de equilíbrio. Sim, dá para largar tudo, dar a volta ao mundo, mas essa não é a única forma de ser feliz. E ninguém pode tomar essa decisão além de você.
Grandes decisões são assim mesmo. Complicadas.
Boa sorte para vocês! Depois contem pra gente o que vocês decidiram.