Outro dia, arrumando meu armário, encontrei meu diário de viagem da volta ao mundo. Era um caderno verde, feito com folhas recicladas e capa de tecido, que eu comprei em uma lojinha em McLeod Ganj só para ajudar os monges tibetanos. Quando eu acabei de preencher as últimas folhas do bloco estilo moleskine que eu tinha levado do Brasil, ele se tornou meu companheiro pelo resto do caminho.
Eu passei as páginas até o final, lendo de relance algumas frases aqui e ali. De repente, um pedaço de papel se soltou dele e caiu no chão. Era uma nota de 5 rúpias nepalesas, o equivalente a nada, que eu nem me lembrava que tinha guardado ali. Nesse momento, um novo arrependimento surgiu: o de não ter conseguido levar a cabo a missão de escrever até o final da viagem.
Mais ou menos na altura em que eu estava na Nova Zelândia, os relatos pararam. A loucura de mudar de cidade a cada poucos dias e o cansaço causado pelo movimento incessante acabaram me tirando a vontade de escrever e eu abandonei o caderno no fundo da mala até chegar ao Brasil.
Foi um erro. Ao ler as minhas palavras outra vez, tive uma nova dimensão de como essa viagem e tudo o que eu vivi desde então me transformou. Pude comparar a forma como eu via as coisas na época e como eu vejo hoje. Com certeza muita coisa mudou. Quase três anos depois, eu já tive tempo mais que suficiente para digerir tudo, mas também muita coisa se perdeu. As primeiras impressões, o choque ao ter meus princípios confrontados com outras culturas, a confusão da estrada, sensações que evaporam com o tempo e que, de alguma forma, eu consegui preservar naquelas páginas.
É claro, as fotos ajudam. E eu tenho várias, cerca de 30 mil. Mas, embora elas sejam ótimas para me lembrar de lugares, falham na hora de reconstruir diálogos, o nome das pessoas que eu conheci e todo o pano de fundo para aquelas imagens. Eu me sinto reconfortada por saber que não dependo da minha memória para saber o nome daquele pequeno restaurante no terraço no meio do Himalaia.
Mais do que isso, meu diário funcionou como uma terapia, um espaço secreto que eu criei no meio de uma viagem com amigos, em que eu raramente ficava sozinha. Era ali o lugar onde eu podia colocar meus pensamentos em ordem e tentar lidar com os meus momentos de frustração, de encantamento, de coragem, de auto-conhecimento, estresse, medo, tédio e vulnerabilidade.
No momento em que eu empunhava a caneta, eu me obrigava a focar no que eu sentia, em dar atenção para as coisas que me impressionaram, em descobrir o que tudo aquilo significava para mim. Era quando eu parava o mundo um pouquinho para que eu pudesse pensar. Um diário de viagem é um souvenir personalizado, que não vai te lembrar apenas dos lugares em que você esteve, mas de quem você era enquanto estava lá.
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Bom, quanto a isso não posso reclamar. Tenho meus diários de viagem registrados desde o primeiro mochilão. Criei o hábito de sempre escrever à noite ou no dia posterior quando sobra um tempinho.
Escrevo num caderno e depois da trip concluída digito tudo e guardo em arquivos do word. 🙂
Que legal! Queria ter essa disciplina!
Abraços
Natália, adorei!
Eu não tenho arrependimento maior que não ter escrito minhas histórias de viagem. O mesmo vale para as fotos que não foram tiradas. Com o tempo, as lembranças ficam menos precisas e a gente precisa de um “empurrão” para matar as saudades.
Mas… muitas viagens virão e a dica está bem guardada.
Não deixe de escrever daqui pra frente, então! =)
Abraços
Por isso que amo ter blog, mesmo que só eu leia..haha. Posso sempre reviver meus sentimentos “far away from home”.
Blog ajuda, mas eu gosto de ter um registro só meu tbm.
Abraços e obrigada por comentar.
Lindo!
Já tentei fazer algumas vezes mas nunca consegui manter até o final da viagem. Vou repensar… Até porque depois de um tempo a memória falha e a gente acaba perdendo pequenos preciosos detalhes!
Vai tentando, Marcela! Se não der para escrever sempre, escreva quando puder. É ótimo ter esse registro!
Abraços
Oi, Natália!! Adorei o post!!! Eu era super adepta de diários na minha adolescência e dps acabei largando o hábito, mas seu post despertou a vontade de retomá-lo e também de reler os diários! Adorei mesmo! Bjos!
Que legal, Bárbara! Obrigada por comentar!
Abraços
Exatamente assim que eu penso!
Um diário de viagem serve para relembrarmos não só a viagem, mas a nossa perspectiva daquilo tudo à época, e isso a gente não lembra! Me arrependi muito na primeira viagem internacional, pois não escrevi. Da segunda em diante eu não parei mais…
A gente “perde” um pouco de tempo, mas garanto que compensa =D
Pois é Felipe, eu me arrependo muito de todas as viagens que não escrevo. Agora estou tentando sempre tirar um tempinho para isso.
Abraços e obrigada pelo comentário
Diários de viagem: adoro! Esse tema foi justamente um dos primeiros, se não o primeiro post do meu blog, afinal foi a partir de um desses que tive a ideia de construir um blog de viagem. <3
Que legal saber disso, Adriana! Mostra o post pra gente =)
Abraços
Amei o post, acabei de voltar de NY e no meu primeiro dia lá comprei um pequeno diário de viagem no Chelsea Market e fiz dessa viagem mesmo!
Me identifiquei demais porque também tenho um caderninho que comprei no templo budista dos refugiados do tibet em mcleod, mas o meu é rosa e tem uma cordinha colorida que prende a capa numa bolinha de madeira 🙂
Muitas saudades !!
Caderninhos do Chelsea! Aposto que é fofo! (PS. Tenho tara com cadernos)
Que legal que você também comprou um caderno nos monges!
Abraços
Simm, lindo! Depois se quiser entrar tem um site dai lá tem várias capas, chama R. Nichols a marca! Mas só da pra viagens curtas porque nao é grande!
Nem fala eu tenho mania de cadernos, blocos.. Tanto em comprei esse em McLeod em 2013 e ele está em branco até hoje hahaha
hahah eu comprei um caderno da Maria Antonieta em Versalhes em 2011 e ele tava em branco até mês passado. Então te entendo muito bem!
Abraços!
Que texto lindo, me convenceu a fazer um diário na minha próxima viagem! 🙂
Legal, Gabriela! Fico feliz! =)
Concordo muito com o seu texto.
É interessante perceber como escrever sobre si mesmo e as experiências vividas – na estrada ou fora dela – pode se tornar um exercício singular de autoconhecimento e, quem sabe, evolução.
Além disso, reler coisas escritas por nós mesmos depois de alguns anos sempre dá aquela sensação diferente, que mistura muita coisa e não dá pra explicar: saudade, vergonha, alegria… Assim, um simples caderno, aliado à lembrança – um pequeno kit de viagem no tempo – tem um valor muito maior do que qualquer bem de consumo, inclusive os materialmente mais caros.
Adorei seu comentário, Michael! Obrigada por passar por aqui.
Abraços