Histórias e narrativas: storytelling para blogs de viagem

Demorou um tempo até que eu descobrisse que o que eu realmente queria fazer da minha vida era contar histórias. Eu passei anos meio perdida e nublada, experimentando uma coisa ali, outra aqui, dentro da minha ainda curta carreira profissional. Até que um dia eu entendi: eram as histórias que faziam meu olho brilhar. Histórias de verdade, histórias de mentira, minhas e dos outros.

Eu acredito no poder transformador das narrativas. E eu mesma já tive minha vida chacoalhada por algumas delas, para ser sincera. As histórias fazem a gente se conectar com pessoas que parecem totalmente diferentes, pois nos mostram sua humanidade. Se tem uma coisa que nos separa dos outros seres vivos nesse planeta, é a nossa habilidade de trocar histórias. E reinventá-las todos os dias.

Por que storytelling?

Histórias mudam a forma como nosso cérebro processa informações. Eu posso sentar aqui e escrever um ensaio enorme sobre, sei lá, as crenças espirituais do antigo Egito – para ligar o gerador de aleatoriedades – e tudo o que eu vou conseguir é deixar vocês com sono. Mas se eu coloco um personagem aqui, um arco narrativo ali, um desfecho acolá e transformo isso em uma lenda ou uma outra forma narrativa qualquer, pimba!, você será fisgado com bem mais facilidade. E isso acontece porque histórias têm o poder de nos envolver e gerar empatia.

As narrativas são capazes de fazer com a gente se coloque no lugar dos personagens que as conduzem e, com isso, facilitar o entendimento de seus conflitos, medos, alegrias e toda a infinita gama de sentimentos humanos. Nós somos programados até a última célula dos nossos corpos para expressar-nos através de narrativas. Desde que nascemos, nosso cérebro associa “histórias” a algum tipo de recompensa mental.

Comece a prestar atenção em conversas de bar e vai ver como tudo começa e termina com uma história. E isso não é de hoje, começou lá nos primórdios da humanidade, com desenhos nas cavernas e reuniões tribais ao redor da fogueira. Hoje, consumimos histórias todo o tempo, nas séries, nos filmes, livros e, claro, nos blogs que a gente coleciona no feed de notícias.

Num blog de viagem, usar a narrativa como ferramenta na construção dos seus posts pode trazer as culturas mais distantes para perto do leitor e tornar experiências mais vivas, mais reais para ele. Ensinar como visitar o Louvre não é nem de longe tão emocionante quanto contar o que você sentiu diante daquela pintura, ou da conversa interessante que você teve com o segurança do museu que era apaixonado por arte e que trabalha todos os dias cercado por aquelas obra-primas.

As pessoas que leem um blog de viagem, em especial aquelas que se tornam visitantes fieis, estão interessadas em viver experiências como as que o autor teve. Elas querem sentir as mesmas emoções, e isso você não passa com dicas práticas e listas de atrações imperdíveis. Isso você só transmite com histórias.

Storytelling para blogs de viagem

Nem tudo é sobre SEO

Nenhum blog – de viagem ou não – marcante, que se destaca, é apenas um compilado de listas de top 10 de atrações ou manuais para visitar determinado lugar. Ele também é formado pelas histórias que podem mudar a percepção dos leitores sobre o tema abordado. O poder das narrativas é tão grande que elas podem até mesmo afetar a forma como as pessoas veem determinado destino ou acontecimento e se relacionam emocionalmente com ele.

Os guias e dicas de viagem têm seu propósito e são úteis. São úteis para o leitor e para levar gente para o seu blog, para aumentar suas pageviews e te dar bons resultados nos mecanismos de busca. Há uma coisa, no entanto, que eles sozinhos não conseguem: fazer com que o leitor retorne, coloque seu site nos favoritos, entre semanalmente porque ele quer ler o que você escreveu. E esse tipo de leitor é tão ou mais importante que os leitores do Google que caíram ali de paraquedas, porque são eles que formam a comunidade do seu blog e ajudam a levar suas palavras para ainda mais longe. A gente se apega aos blogs que nos fazem sentir alguma coisa, que nos mostram outros pontos de vista nunca antes explorados por nós, que nos inspiram. E isso um conteúdo meramente útil nunca vai conseguir. Por outro lado, um post não precisa ser nada útil para envolver e emocionar pessoas.

E mais: como blogueiros e exploradores que potencialmente podem alcançar centenas de milhares de pessoas, é nossa responsabilidade mostrar mais que simples dicas de viagem. É nossa responsabilidade prover os leitores com histórias sobre os diversos pontos do planeta para que, de narrativa em narrativa, eles colecionem um monte de histórias, montem um panorama muito mais complexo das culturas e destinos, evitando, como disse Chimamanda Ngozi Adichie na sua palestra “Os perigos da história única“, visões estereotipadas e unilaterais do mundo lá fora.

Histórias estão por todas as partes

Para um bom escritor, qualquer coisa vira história. Você não precisa esperar que algo incrível ou absurdo aconteça com você durante uma viagem para que aquilo vire tema para o seu blog. As histórias estão por todos os lados, mas às vezes a gente precisa olhar por outro ponto de vista para enxergá-las. Com um pouquinho de talento e técnica, você pode transformar uma conversa durante um café em um texto interessante. Ou fazer com que sua experiência – que a princípio poderia parecer exatamente a mesma de todas as outras pessoas – em um relato único, apenas usando a sua voz e a sua forma única de contar suas histórias. Você pode transformar um post super chato sobre como visitar não sei o que em uma grande peça de storytelling que vai ser útil e divertida ao mesmo tempo.

Narrativas de viagem para blogueiros

Fotos também contam histórias

Nem tudo é sobre palavras. A fotografia também é uma ferramenta poderosa para construir uma narrativa. E uma boa foto às vezes dá conta de fazer isso sozinha, sem nada escrito para acompanhar. Mas quando aliamos uma boa foto a um bom texto, a história ganha ainda mais força. Tente ilustrar os seus posts com imagens que falem por si, cheias de significado. Palavras podem descrever, mas as imagens mostram. Escolha fotos que complementem o que você disse e construa seu arco narrativo também com auxílio delas, e não como mera decoração. Pense nisso quando estiver com a câmera na mão.

Se você está mesmo levando a sério essa coisa de ser blogueiro de viagem, talvez até compense estudar um pouco de fotografia. Você não precisa pagar um curso para isso. Aprender a controlar a câmera, as regras básicas de composição e um pouco de narrativa visual é fácil e grátis nessa grande biblioteca pública que é a internet.

Explore outros meios

Você pode transportar os princípios da narrativa para outros canais que não apenas o seu blog. Aplicá-los nas redes sociais, seja Twitter, Instagram, Facebook ou qualquer outra rede nova do momento (já cansei de acompanhar, admito) vai ajudar a levar mais engajamento, transformar seguidores em leitores e também acaba atraindo mais gente para os seus canais. E isso acontece porque, como já vimos, storytelling funciona em qualquer momento, a qualquer hora.

Evite os “euzismos”

Você pode e deve compartilhar suas histórias e experiências pessoais, mas cuidado para não debandar para o euzismo exagerado. “Eu” para lá, “eu” para cá, um festival de selfies ali e logo você é mais um blogueiro egocêntrico que só quer saber de mostrar pra todo mundo como é legal, bonito e tem uma vida incrível. Há uma grande diferença entre compartilhar uma experiência que pode interessar aos leitores e tornar o seu blog um inflador de ego. Você é o narrador, mas na maior parte das vezes não é o protagonista. O protagonista é o destino e as pessoas que vivem nele. Só assim escrever sobre viagens vale a pena.

Melhore sempre: links e recursos para contadores de histórias

Essa foi apenas uma introdução ao grande tema que é o uso de storytelling em blogs e social media. Se você se interessa e quer continuar aprendendo sobre o assunto, pode começar com esses links abaixo. Eu vou atualizar a lista sempre que encontrar um bom texto dando sopa por aí.

Migraciones – Não sei se você sabe, mas eu tenho uma newsletter de viagens, escrita e criatividade
TED Talks sobre Storytelling
Narrativas visuais

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones e no Youtube. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

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12 comentários sobre o texto “Histórias e narrativas: storytelling para blogs de viagem

  1. Estou cativada pelo conteúdo do que vocês apresentam!
    Faz parte da minha leitura diária.
    PS: Comecei a pesquisar sobre fezes de ratos e de alguma maneira acabei chegando aqui

  2. Uma excelente abordagem e também uma grande inspiração para todos os que escrevem blogs pela internet, obrigada por dar uma aula bastante pedagógica sobre a forma como escrevemos uma história, vou colocar nos meus favoritos

  3. Natália, que texto bacana! A parte do “euzismos” merece uma atenção especial mesmo – realmente há maneiras mais criativas e menos egocêntricas de se falar de um destino. Post muito bom!!

    Um abraço!

  4. Ontem eu fui dormir bem tarde e meio aflita, depois de uma conversa que eu e meu marido tivemos sobre o futuro do nosso blog. Hoje acordei e, ainda deitada na cama, fui dar aquela olhadinha no feed do face e lá estava esse post incrível. Lendo o post eu descobri que é isso que eu quero, mas não estava sabendo como explicar. Quero continuar escrevendo e desenvolver essa arte que é contar histórias e envolver pessoas!
    Muito obrigada, Nat! Primeiro o 360 me inspirou a viajar o mundo e, agora, me ajuda a perceber o que eu quero e me dá ferramentas para aprender 🙂

    1. Thais, fico feliz que a gente tenha te inspirado não só uma, como duas vezes! Sucesso com o seu blog e qualquer outro projeto!

      Abraços!

  5. Olá Natália, parabéns pelo texto, ele está simplesmente perfeito. Você conseguiu sintetizar com maestria o que penso sobre os blogs de viagem e ainda me mostrar outros horizontes.
    Creio que todos que embarcam nesta aventura deliciosa que é divulgar para o mundo suas histórias de viagens, experiências, perrengues, dicas interessantes, fatos engraçados e informações que poderão contribuir para que outros viajantes, realmente quer externar despretensiosamente suas emoções em ter conhecido lugares realmente inesquecíveis e não ficar com tudo isso para si.
    Em meu blog, também convido os nossos leitores, sejam os experientes ou aos casuais que escrevam… divulguem suas experiências para contribuírem nesta grande biblioteca pública e gratuita. Convido a você e todos que que leem seu blog, a conhecer também o meu projeto: https://lugaresinesqueciveis.com.br/conte-sua-historia/

    Um grande abraço e mais uma vez obrigado pelo maravilhoso texto.

    1. Oi Luiz,

      Obrigada pelo comentário, fico feliz que você gostou do texto. Estou de acordo com você sobre nossa “missão”como blogueiros de viagem…

      Abraços

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