É praticamente impossível sonhar com viagens, projetos pessoais e até largar o emprego para investir numa inciativa nômade, sem esbarrar na questão do dinheiro. Ao mesmo tempo, lidar com dinheiro, saber poupá-lo, investi-lo e cultiva-lo de forma saudável não são coisas que costumamos aprender na escola e nem em casa. Alguns podem aprender na marra, com as durezas do dia a dia, e outros podem se sofrer nas parcelas do cartão a perder de vista.
“É difícil fazer algum plano de vida que não passe por planejamento financeiro. É complicado uma pessoa conseguir se dedicar a construção de um pequeno ou grande sonho sem se planejar financeiramente antes. É uma base que perpassa todas as questões”, nos disse Eduardo Amuri. Consultor financeiro, autor de dois livros e cursos com o mesmo nome, “Dinheiro sem Medo” e “Finança para Autônomos“, o Amuri ajudou a estruturar algumas contas do 360meridianos.
E o seu livro nos ensinou a cuidar do nosso próprio dinheiro sem ter que anotar todo o gasto, desde as balinhas da padaria até as passagens aéreas. A Natália Becattini, autora aqui no blog, inclusive, conseguiu se reorganizar a ponto de se livrar de umas dívidas e formar uma reserva de emergência que a salvou do seu azar eterno com perder equipamentos eletrônicos na velocidade da luz.
O Amuri, que é um cara muito ponderado, não acredita em grandes discursos de enriquecimento por meritocracia ou fórmulas que dizem funcionar para todo mundo. Eu me baseei nos ensinamentos dele e bati um papo para levantar algumas dicas importantes para quem está nessa jornada de cultivar e cuidar melhor da sua própria grana – e quem sabe conseguir realizar projetos e tirar sonhos do papel.
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1. Retrato da sua vida financeira
Uma das grandes dicas do livro “Dinheiro sem Medo” é que você deve fazer um retrato da sua vida financeira pensando em gastos fixos – como aluguel, contas e taxas recorrentes; gastos variáveis – que são aqueles aleatórios, porém razoavelmente constantes ao longo das semanas, como almoço, mercado, transporte e bares; e gastos sazonais – que englobam aqueles que só vêm de vez em quando, como roupas, equipamentos eletrônicos, presentes e viagens.
Segundo o Amuri fala no seu podcast, “anotar todas as suas contas pode dar certo para quem no início não tem a menor noção de quanto gasta, mas isso tem que ser apenas uma fase”.
Ele sugere, então, uma vez por semana, tirando os gastos fixos (aluguel, conta de luz, etc), pensar nos gastos do dia a dia. Tente estimar quanto você precisa na semana de forma razoavelmente confortável – almoço, mercado, transporte, bares. Saque esse dinheiro e coloque na carteira. Assim você acompanhará a sua vida financeira e dosará quando vale a pena gastar ou não. “A gente consegue se planejar melhor com um período de tempo mais curto, de 7 dias, ao invés dos 30, que é tempo demais”.
2. Dinheiro de papel, cartão de crédito e a dor do pagamento
Existe um conceito chamado “dor do pagamento”, que é aquele desconforto que sentimos ao pagar alguma coisa e ver nosso dinheiro indo embora. Segundo o Amuri – e baseado em diversos especialistas e pesquisas – o cartão de crédito ameniza essa dor. Logo, uma das sugestões dele para quem quer dar um jeito na vida financeira e gastar menos é deixar de usar o cartão.
Mas como fazer isso? “O cartão de crédito não é a única maneira de pagar as coisas”. O exemplo do Amuri são contas digitais e mesmo o serviço de grandes bancos, de atribuir um número de cartão para compras pela internet, que serve a todas as comodidades de um cartão, mas debita na hora da conta corrente.
No cenário das viagens, por exemplo, isso funciona desde a compra da passagem até a reserva do hotel. “O único cenário em que isso não funciona é no aluguel de carro”. E, acrescento, em qualquer situação que você precisa deixar um depósito caução. Nesse caso, ele sugere a possibilidade de utilizar um cartão de crédito pré-pago. “Tem alguns mais famosos, como o acessocar.com.br. Além disso, grande parte das despesas dá para pagar de outra forma, colocando no débito, como o Uber ou a Netflix.
3. O mito das milhas do cartão de crédito
Deixar de usar o cartão gera um grande ponto de interrogação na cabeça dos viajantes: mas e as milhas? Segundo o Amuri fala no podcast “Uma horinha sobre grana”, a relação valor da anuidade x o preço das milhas e passagens muitas vezes não justifica usar o cartão de crédito para tentar viajar mais.
Perguntei como fazer essa conta, para saber se as suas milhas realmente estão valendo a pena. “Um jeito interessante de começar essa reflexão seria pegando as últimas 12 faturas do cartão – o que é fácil via internet banking – e a partir daí a pessoa calcular quanto já pagou, converter para milhas e pontos ganhos e entender o quanto ganhou de fato”. Basicamente, seria formular a seguinte frase: “Eu gastei 20 mil reais e por conta disso ganhei X milhas – o que equivale a uma passagem para o lugar Z – que custa, normalmente, Y” Só pensar nessa frase já é uma reflexão interessante, explica o especialista.
4. A aposentadoria e o futuro não tão distante
Eu quis saber do Amuri se ele teria uma dica para alguém que junta todas as economias para viajar, mas também quer poupar dinheiro para o futuro. Segundo ele, a questão da aposentadoria tem um ponto fácil e um ponto difícil.
“O ponto fácil é que você tem muito tempo para se preparar. Se você começar a se preocupar com isso relativamente jovem, tem aí algumas décadas. Pensando numa vida produtiva de 30, 35 anos, você tem bastante tempo. Uma contribuição pequena, porém recorrente, tem um impacto muito grande lá na frente. Poupe com constância e regularidade, valores pequenos, que o resultado vai ser significativo”.
O lado difícil é que poupar para daqui a 30 anos não é uma coisa muito sedutora, explica. Você não vai pegar nesse dinheiro, só lá na frente, o que torna fácil postergar. Por isso, conta o Amuri, “essa poupança para a aposentadoria tem que ser recorrente, tem que ser automática, e também não pode pesar demais no bolso, se não você vai dedicar mais esforço e mais trabalho para daqui a 30 anos do que vivendo agora. Não quer dizer que a poupança não tenha que ser feita. Tem que ser recorrente e automática, porque se depender do seu bom humor, todos os meses, não vai acontecer”.
5. Como se planejar para realizar a viagem dos sonhos
Mais uma vez, o planejamento financeiro entra no jogo. Em primeiro lugar, o Amuri sugere dedicar um tempo e se divertir com esse sonho. “Essa é uma etapa muito subestimada do planejamento financeiro, que é a brincadeira de sonhar com os objetivos, detalhar eles”. Não basta dizer: eu quero viajar. É preciso também pensar: Para onde? Quando? Quanto tempo vai durar essa viagem? Quais lugares você gostaria de visitar?
“Quanto mais palpável for esse sonho, mais fácil de encontrar a motivação necessária para se manter na linha por meses ou anos. Quem fala eu quero viajar, mas não se dedica a esmiuçar esse sonho, dificilmente vai conseguir a força de vontade necessária para manter o desejo vivo até que a coisa se concretize”.
Além disso, ele completa: “Na minha opinião, no geral, todas as formações de poupanças deveriam ser de forma recorrente e automática, para não dependerem das nossas oscilações de humor”.
6. As finanças para freelas, blogueiros e nômades digitais
Para finalizar, aproveitando que o Amuri tem um livro e um curso focado em finanças de autônomos, eu perguntei a ele como que quem trabalha pela internet ou sem chefe pode organizar o dinheiro, pensando em reserva de emergência, aposentadoria e ainda realizar outros planos e metas.
“A grande batalha financeira inicial dos autônomos é conseguir simular algumas regalias que os assalariados têm. Uma delas é uma data fixa e um valor fixo de salário”, explica. “Uma vez que esse autônomo consegue algum nível de organização para simular a sensação de salário, todo aquele discurso de planejamento financeiro para assalariados passa a ser aplicável para ele também”.
Claro que há questões mais complexas, conta o Amuri, porque o autônomo acaba lidando com problemas que o assalariado não enfrenta, como a renda variável, calotes, falhas nas datas de pagamentos e imprevistos profissionais. Segundo ele, “isso é contornável com planejamento simples e pé no chão. Assim dá para montar reserva de emergência e projetos de longo prazo.” E ele garante que é, sim possível: “eu acompanho centenas de pessoas que conseguem uma vida financeira estável mesmo sendo autônomos”.
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Isso das milhas é bem verdade mesmo. Quando fui me informar pras milhas do meu cartão no Brasil desisti por causa da anuidade que ia pagar. Era mais fácil só economizar não gastando no cartão de crédito.
Nem fui saber como funciona em Portugal, acabei concluindo que o bom mesmo é só economizar, não tem erro.
#adesiludida ahahhahah
Achei o posicionamento sobre milhas de cartão meio reducionista. Porque se você usa o cartão para pagar por coisas/serviços que ia precisar ou querer de qualquer jeito, mesmo em cash, e se você paga a fatura inteira, sem fazer dívidas, as milhas acabam sendo uma vantagem. Cartão só é perigoso pra quem o trata como um “dinheiro a mais” que você não tem, e não como o substituto do dinheiro vivo que você já tem.
Oi, Caroline! Eu explico tudo (com destaque para esse ponto que você levantou) no episódio do podcast que a Lu citou no texto, cê chegou a dar uma olhada? Beijo! 🙂
Desculpa a análise superficial! Ouvi seu podcast e achei muuuito bacana e sensato! De verdade, a pain of payment é real e o cartão faz a gente gastar o que não gastaria em dinheiro vivo. Pessoalmente, eu tenho um controle bem sólido no uso cartão, mas tenho certeza que caio vez ou outra na compra supérflua frictionless! Não sei se tenho coragem de fazer o teste do dinheiro vivo, não…. hahahah