Morar em Berlim: tudo que você precisa saber

Um punhado de acasos do destino que me levaram a morar em Berlim. Eu, que sou solar e de malemolência latina, nunca tinha considerado as frias terras germânicas para chamar de lar, até que a vida pareceu dar vários sinais de que eu deveria tentar a sorte por lá. Depois de passar pelo tortuoso processo de obter a cidadania europeia na Itália, meus caminhos estavam em aberto: a minha primeira opção, que era voltar para Barcelona, já não me parecia tão tentadora; eu não estava pronta para voltar para o Brasil e algumas pessoas que eu conhecia estavam de malas prontas para a capital alemã.

Meio no impulso, comprei uma passagem e resolvi experimentar a cidade até dezembro, quando alguns compromissos iriam exigir minha presença em Belo Horizonte. A ideia era que, gostando, eu voltaria e faria da cidade um lar permanente. Deu tudo tremendamente errado – mais por questões pessoais que pela cidade em si -, mas eu aprendi algumas coisinhas sobre o processo de morar em Berlim.

Portão de Branderburgo, em Berlim

Tipos de vistos para estrangeiros em Berlim

Em primeiro lugar, não vá sem um visto próprio.

A ideia pode até parecer tentadora para alguns, eu sei, mas estar sem documentos apropriados vai dificultar muito sua vida na Alemanha. Há diversas opções de visto de estadia prolongada para quem quer viver no país. Os processos, como tudo por lá, costumam ser muito burocráticos, porém não são impossíveis. Algumas das opções são:

  1. Visto acadêmico para estudantes: Quem vai para fazer graduação, mestrado, doutorado ou pós na Alemanha e estiver devidamente matriculado em alguma universidade pode ingressar no país como turista e solicitar, junto ao Departamento de Estrangeiros, e dentro de 90 dias da data de chegada, a autorização de residência. Berlim tem 33 universidades e muitas delas oferecem cursos em inglês e oportunidades de bolsas de estudos. A Humboldt e a Freie University são algumas das mais famosas. Saiba mais sobre o visto de estudante acadêmico.
  2. Visto de estudante para curso de alemão: Funciona da mesma forma que o visto para estudantes acadêmicos. Você viaja como turista e solicita a autorização de residência já no país. Para isso, é preciso estar matriculado em uma escola de idiomas, na modalidade de curso intensivo, que ofereça no mínimo 18 horas/aulas por semana. Cursos noturnos ou de final de semana não se enquadram nessa categoria. O valor dos cursos é um pouco caro, gira entre 170 e 260 euros por cada quatro semanas. Saiba mais sobre o visto para estudar alemão.
  3. Visto de trabalho: Por incrível que pareça, esse é um dos mais fáceis. Basta você conseguir uma empresa que queira te contratar e pronto, seu visto de trabalho é praticamente garantido. Quem é da área de TI então, tá no papo. A cidade é cheia de empresas modernosas desse ramo e elas adoram promover um ambiente multicultural em seus escritórios hipsters. Além disso, o idioma oficial nesses escritórios costuma ser o inglês, então você não precisa nem estar com o alemão na ponta da língua, mas o inglês tem que ser fluente. Você pode se candidatar a vagas de emprego do Brasil ou entrar na Alemanha como turista e começar a enviar currículos quando estiver lá. Só se atente para não exceder os 90 dias de permanência caso você escolha essa opção e não consiga uma vaga antes desse tempo. Há também um visto para quem está buscando emprego, com validade de seis meses, que deve ser pedido ainda no Brasil. O grupo de facebook English Speaking Jobs in Berlin e a newsletter Woholo podem ser um ponto de partida para começar a procurar. Saiba mais sobre os vistos de trabalho.
  4. Visto de Freelancer: Esse é um visto mais complicado de conseguir, que exige muitos papeis e um pouco de paciência, porque ele demora a sair. Mas quem consegue comprovar que tem um trabalho “remoto” prestando serviços para terceiros, por exemplo, produtores de conteúdo, editores de vídeo, programadores e afins, pode solicitar esse visto e usar a Alemanha como base. Nada mais conveniente para um dos destinos favoritos dos nômades digitais. O inconveniente é que você precisa solicitar esse visto no consulado alemão no Brasil. Saiba mais.

Encontrando um lugar para morar em Berlim

Passada toda a burocracia do visto, é hora de enfrentar o pesadelo que é encontrar moradia em Berlim. De uns anos pra cá, a cidade passou por um aumento estrondoso na procura por apartamentos, o que fez com que o preço do metro quadrado fosse às alturas e a competição por qualquer lugar disponível ficasse insana. Mas com paciência e dedicação é possível encontrar algo bom.

O primeiro passo é achar um lugar temporário para morar. Você vai precisar de uma base para dormir no intervalo entre as muitas visitas que vai fazer até conseguir encontrar algo permanente. Algumas pessoas ficam em hostels e hotéis, mas se você prefere algo mais com cara de casa, uma opção são sites que alugam para estudantes ou por temporada, como a Uniplaces, Spot A Home, AirBnB e o Go Easy Berlin. Há também diversos grupos de Facebook com pessoas oferecendo e procurando teto, mas nesses casos é mais fácil conseguir algo quando você já está na cidade, porque as pessoas gostam de conhecer pessoalmente os locatários.

Assegure-se de que esse seu lar temporário permita o registro de novos moradores, conhecido como Anmeldung. Isso porque, numa espiral de burocracia que só os alemães são capazes de criar, você precisa de um registro de moradia para encontrar uma moradia. Em alguns casos isso pode ser negociado, especialmente se você optar por alugar apenas um quarto, mas para contratos de longo termo e apartamentos inteiros costuma ser exigido. Por sorte, o processo não é complicado e eu explico mais abaixo.

O que fazer em Berlim: Catedral

Uma vez acomodado, você pode começar a busca permanente. Para isso, eu recomendo os mesmos grupos no Facebook, além dos sites de imobiliária online, como o WG Gesucht, Wohngemeinschaft, WG Berlin e WG Suche. Prepare-se para mandar muitas mensagens e marcar várias visitas. Considere comprar um ticket mensal do metrô. Se você souber alemão ou conhecer alguém que possa ser seu tradutor, vale a pena procurar também as lojas físicas das imobiliárias.

Burocracias para alugar um apartamento

Na Alemanha, você pode sublocar um quarto num apartamento – os chamados WGs, ou no bom português, repúblicas -, alugar um apartamento inteiro por contrato temporário ou alugar por tempo indeterminado. Nos primeiros e segundos casos, a burocracia é menor. Você visita o apartamento e, caso seus futuros colegas de apê ou o proprietário (a pessoa que seleciona varia de caso para caso) te aprovem, você assina um contrato simples e se muda. No caso dos WGs, o processo é mais simples: você conversa com o pessoal da casa e assina um contratinho. O mais importante aqui é eles irem com a sua cara e que você possa entrar no apartamento na data que eles precisam.

Para alugar um apartamento inteiro, seja por curto ou longo prazo, é muitas vezes necessário apresentar provas de que você tem renda três vezes superior ao valor do aluguel. Para acordos de longo prazo, muitos locatários ainda exigem que você apresente um contrato de trabalho com empresa alemã. Por isso, organize todos os documentos antes da visita.

Você também vai precisar tirar a schulfa, um documento bancário que prova que você não tem dívidas no país. Para isso, abra uma conta em algum banco alemão. Eu recomendo o N26, que é um banco 100% digital, sem taxas, sem burocracias e com atendimento totalmente online (use o código nataliap1269 no cadastro para ganhar 10 euros na sua primeira compra com o cartão).

Com a conta bancária aberta, você pode pedir a schulfa. Há diversas formas de fazer isso: por telefone, nas agências de correio ou em sites de imobiliária, mas a mais fácil é no site oficial do governo. Lembre-se de marcar a opção “online download” para receber o documento por email em vez de esperar chegar pelo correio. Em qualquer um dos casos, é preciso pagar uma taxa de 29.95 euros.

Recapitulando, para alugar um de apartamento na Alemanha, você precisa de: 

  • Comprovar renda três vezes superior ao valor do aluguel
  • (Algumas vezes) Contrato de trabalho com empresa alemã
  • Schulfa
  • Conta em banco alemão
  • Anmeldung

Registro de moradia – Anmeldung

Todas as pessoas vivendo na Alemanha por mais de 90 dias precisam, obrigatoriamente, fazer um registro de moradia, conhecido como Anmeldung. O documento equivale ao nosso comprovante de residência e você vai precisar dele para praticamente qualquer procedimento burocrático na Alemanha, desde alugar um apartamento – é, eu sei – até conseguir um emprego, instalar internet em casa e tudo mais. Caso as autoridades percebem que você está no país há mais de 90 dias e não se registrou, você precisará pagar uma multa.

Atenção: embora você tenha até 90 dias da sua chegada para se registrar, o anemldung precisa ser feito em até 14 dias a partir da data de assinatura do seu contrato de aluguel

Ou seja, você tem até 90 dias para encontrar um lugar para morar e assinar o contrato. Porém, uma vez feito isso, você precisa se registrar em até 14 dias.

Para isso, você vai precisar entrar nesse site e agendar um horário em uma das sedes das subprefeituras de Berlim. Não precisa ser na sede do seu bairro, você pode se registrar em qualquer um dos escritórios. O site está todo em alemão, mas a tradução do Google Translator ajuda bastante. Pode ser um pouco difícil de conseguir horários, por isso, o recomendado é atualizar o site várias vezes por dia porque sempre tem alguém que desiste de última hora. Aqui você vê o calendário com os horários disponíveis em todos os escritórios de Berlim.

Na data marcada, compareça ao escritório com pontualidade alemã e levando os seguintes documentos:

  • Passaporte Brasileiro ou Documento de Identidade válido de algum país da União Europeia
  • Formulário de candidatura, disponível para download no site. Caso você esteja registrando mais de uma pessoa no apartamento, os dados de todos os moradores devem constar no mesmo formulário
  • Formulário com os dados e assinatura do seu senhorio, também disponível no site

Custo de vida em Berlim

verão em berlim slide

Embora tenha vivido um aumento do custo de vida nos últimos anos, Berlim continua sendo uma capital europeia relativamente barata. O seu maior gasto será, sem dúvidas, com o aluguel. Espere pagar entre 400 e 750 euros por um quarto em apartamento compartilhado; entre 550 e 900 por um estúdio ou entre 900 e 1200 euros em um apartamento simples de dois quartos.

Para amenizar os gastos com moradia, uma boa ideia é fugir dos bairros da modinha, como Friedrichshain, Mitte e Kreuzberg. Lugares como Moabit, Pankow, Wedding, Litchtenberg e outros bairros mais afastados do centro costumam ter aluguéis menos insanos.

Com supermercado, espere gastar entre 20 e 30 euros por semana. As redes Lidl e Audi costumam ter preços bastante baixos. O bilhete de transporte público custa 2.80 euros, mas você pode comprar um passe mensal de 59 euros na modalidade a partir das 10h ou 81 euros para usar a qualquer hora. Há ainda a opção de comprar 4 viagens por 9 euros.

Com relação ao lazer, os custos vão depender muito do seu estilo de vida. Há uma infinidade de parques e lagos nos quais você pode se divertir de graça nos meses mais quentes. Uma cerveja nos spätis – pequenas mercearias que funcionam como boteco – custa entre 1 e 2 euros. Nos bares, entre 3,50 e 7. Boates e casas de show – um dos pilares da vida noturna de Berlim – cobram entrada e o valor varia conforme a fama do lugar. Uma refeição em um restaurante simples custa entre 6 e 15 euros.

Eu conseguia viver com relativo conforto com um orçamento de 1000 euros por mês, morando em apartamentos compartilhados.

Seguro de saúde

Ao contrário do que muitos podem pensar, não existe sistema de saúde público e gratuito na Alemanha. Se você pretende morar no país por um período prolongado, ter um plano de saúde é obrigatório, caso contrário você pode ficar sem atendimento quando precisar e pode até mesmo ter o visto negado.

Há planos de saúde públicos, criados pelo governo, e planos oferecidos por empresas privadas, mas em ambos os casos você precisa pagar um valor mensal para ter acesso ao sistema. O seguro estatal só pode ser contratado por quem ganha até 60.000 euros por ano e é proporcional ao seu salário: custa 14,6% do que você ganha e esse valor é dividido entre você e o empregador. Ou seja, você entra com 7,3%. Dependentes não têm custo adicional nessa modalidade.

Quem ganha mais que isso ou não pode trabalhar no país – estudantes, freelancers e outros vistos de longa estadia – deve contratar um seguro privado. Algumas empresas conhecidas internacionalmente oferecem planos na Alemanha, como a Allianz. Já a Axa tem planos flexíveis, voltados para estudantes, nômades e outras pessoas que não sabem que rumo a vida vai tomar num futuro próximo.

Caso você vá entrar no país com visto de turista, é obrigatório contratar um seguro de viagem. O documento pode ser exigido no momento da imigração. Veja aqui como conseguir o melhor custo/benefício (e com cupom de desconto!).

Aulas de alemão

Dá para se virar muito bem em Berlim falando apenas inglês: essa é praticamente a língua oficial da cidade. Mas se você quiser ficar por lá por um longo período, é recomendável se matricular em uma aula de alemão. Caso você não tenha tempo ou dinheiro para fazer o curso intensivo, há outras opções mais baratas e flexíveis.

O próprio governo alemão oferece programas para estrangeiros a baixo custo nos cursos de integração. Algumas ONGs também oferecem esse tipo de serviço, e diversas escolas de idiomas têm planos noturnos, aos fins de semana ou com horários flexíveis.

Nessa linha, a mais barata é a VHS, uma espécie de centro de estudos comunitário, com cursos que custam a partir de 69 euros. Quem tiver mais dinheiro para gastar sempre pode dar uma olhada nos programas do Instituto Goethe. Além disso, nos grupos de Brasileiros em Berlim do Facebook sempre tem alguém oferecendo aulas particulares, e muita gente aprende as primeiras palavras no idioma com aplicativos como o Duolinguo.

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones e no Youtube. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

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6 comentários sobre o texto “Morar em Berlim: tudo que você precisa saber

  1. Aqui vcs dão dicas de como alugar quarto em WG. Gostaria de saber se vcs têm conhecimento de como sair deste quarto que foi alugado. Se existe legislação especifica, se isso depende de cada contrato.
    Obrigada

  2. Olá, tudo bem?
    Excelente artigo! 🙂
    Mesmo quem possui cidadania italiana precisa de um visto ou, neste caso, pode-se morar normalmente na Alemanha?

    1. Olá Cayo, quem possui cidadania italiana não precisa de visto para morar na Alemanha, mas precisa passar pelos procedimentos burocráticos como se registrar na cidade em até 3 meses.

      Abraços

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