Uma igreja para o povo e feita pelo povo. “Olhe ali, acima do portão”, apontou a Cris, minha amiga e guia de turismo do blog Sol de Barcelona. Ela mostrava as figuras esculpidas acima do portal da Basílica Santa Maria del Mar. A igreja, também conhecida como Catedral do Mar, tem nessas figuras uma das várias homenagens ao povo que financiou e trabalhou para que o templo fosse construído.
Inaugurada oficialmente em 1391 e de pé até hoje no coração do bairro El Born, a igreja ganhou esse apelido carinhoso graças ao romance de Ildefonso Falcones, que usa a história de sua construção como fundo para a trama envolvente de “A Catedral do Mar”. E, quando você olhar para a Santa Maria, tenha em mente que cada pedra ali foi carregada nas costas de um homem. Tamanha devoção está refletida no portal em bronze e dentro da igreja em relevos de pedra e mármore que representam esses carregadores portuários.
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Até o século 18, Barcelona ficou confinada dentro de muros e portões. Essas muralhas, inicialmente do período romano, foram se expandindo. Mas foi em “A Catedral do Mar” que eu aprendi que o El Born, que já foi chamado de bairro da Ribeira do Mar, ficava fora das antigas muralhas e era habitado por pescadores, estivadores e gente proveniente de classes sociais mais baixas. Ali, havia uma pequena igreja, Santa Maria das Areias, onde estariam enterradas as relíquias de Santa Eulália, uma mártir do ano de 303. Mais tarde, com a construção dos portos de Barcelona e o afastamento da praia, essa igreja passou a ser Santa Maria do Mar.
Com o tempo, a burguesia de Barcelona cresceu e precisava de um lugar para viver. E foi ali, nos limites da cidade, onde passava o tráfego do porto, que eles decidiram se estabelecer. Os artesãos e mercadores fizeram do bairro sua residência, o que se traduz, me explicou Cris, nas ruas com nome dos ofícios que ali eram praticados, como Rua dos Ourives ou Rua dos Padeiros.
Hoje, El Born é um bairro de ruelas estreitas e prédios antigos, que é mais charmoso e tranquilo que o Bairro Gótico. Enquanto caminhávamos por essas ruas, entre as elegantes boutiques e bares hipsters, a Cris me indicou o tal livro “A Catedral do Mar”, que eu corri para ler.
Trata-se de um romance que narra a história de duas gerações: um pai camponês catalão que foge com o filho para a cidade de Barcelona em busca da liberdade e a história do filho até a vida adulta. Como pano de fundo, Barcelona, a construção da catedral, e também acontecimentos como a peste negra, a inquisição, o ódio aos judeus típicos do século 14, as guerras, as relações comerciais e as disputas entre nobreza, burguesia e camponeses.
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O autor estudou bem a história da cidade, fazendo com que a narrativa seja não só interessante do ponto de vista literário, mas também muito rica historicamente. Em 2018, estreou uma série espanhola baseada no livro, disponível na Netflix Espanha.
Segundo Falcones, o motivo de Santa Maria ser uma igreja do povo é porque a antiga igreja romana dos pescadores ficou pequena para os novos habitantes do então próspero e rico bairro da Ribeira do Mar. Só que, nesse mesmo período, no século 14, os esforços econômicos de Barcelona estavam focados na reconstrução da Catedral da Cidade, que hoje fica no Gótico. Assim, tanto paroquianos ricos, quanto pobres, unidos pela devoção à virgem, solicitaram a permissão para erguer um novo monumento.
Quando a autorização foi dada, os burgueses mais ricos pagaram pela construção e os com menos dinheiro trabalharam por ela. Os bastaixos eram os homens que carregavam as pedras nas costas, da pedreira em Monjuic, até o local da obra. Era um exercício de fé e penitência que lhes rendeu as homenagens que vemos hoje na igreja. Vários personagens do livro exercem essa função.
Outra característica única da Basílica Santa Maria do Mar é a forma como a igreja foi pensada. A catedral do mar foi construída sob a igreja antiga, de forma a não interromper os serviços religiosos. Suas obras foram executadas e finalizadas num período de 50 anos, com uma só influencia arquitetônica e com poucos elementos acrescentados.
Mas sua principal virtude e aquilo que sentimos quando entramos é exatamente o que Berenguer de Montagut, o construtor original, planejou para a Igreja. Que ela fosse enorme, mas simples. Que as luzes mediterrâneas e o espaço encantassem mais do que esculturas ou decorações. Que o povo pudesse assistir as celebrações lado a lado na enorme nave
A imagem da Virgem do Mar, que hoje você vê ao visitar a catedral, é a mesma que foi colocada ali no período medieval e é venerada pelos personagens do livro. Ela sobreviveu ao terrível incêndio de 19 de julho de 1936, quando a basílica ardeu por onze dias seguidos. Os muros, colunas e algumas das janelas também sobreviveram ao fogo e têm um tom escurecido por conta disso.
Como visitar a Catedral do Mar
A Basílica Santa Maria do Mar fica aberta de segunda a sábado, das 9h às 13h e de 17h às 20h30. Nos domingos abre de 10h às 14h e de 17h às 20h. Porém, as visitas turísticas ficam limitadas aos horários da tarde, gratuitamente.
Para quem deseja assistir a uma missa, há celebrações todos os dias, às 19h30. Nos domingos também há missa às 12h.
Há visitas guiadas as torres, telhado e cripta de Santa Maria, num tour que dura cerca de uma hora. Custa 10 euros, com descontos para crianças, estudantes e idosos. O tour que leva apenas as torres e telhado custa 8 euros.
Dicas para visitar o bairro El Born, em Barcelona
Dá para passear no El Born por conta própria e explorar os vários bares, restaurantes, lojas e boates da região. Um bom ponto de partida é a charmosa avenida Passeig del Born, além da basílica. A Natália Becattini, autora do blog que morou em Barcelona, já deu algumas dicas sobre a noite em Barcelona.
Também é no Born que ficam o Museu Picasso, o Museu Têxtil, o Mercat del Born (que é um centro cultural) e o Palau de la Musica Catalana, que merecem a visita.
Se você tiver vontade de conhecer mais detalhes e curiosidades históricas sobre o bairro com uma guia brasileira, que é doutora em história, recomendo fazer um tour com a Cris, do Sol de Barcelona.
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Emocionante a série !! Porém com muitas questões que me deixaram um tanto abalada, da forma como os judeus eram tratados!! Acredito que por isso Jesus veio até a terra!! E morreu por todos nós, o nosso salvador ! E ainda o que está escrito na Bíblia, escreva rei do judeus…
Acabei de assistir a série. E como devota que sou de nossa senhora. Fiquei com sede de saber mais da história, por isso procurando na internet, achei esse texto. Agradeço a quem escreveu. Magnífico história. Vida nossa senhora.
obrigada por comentar Aline!