No dia 21 de janeiro de 1976, um avião levantou voo em Paris e outro em Londres. Em pouco mais que três horas, o primeiro voo pousava no Rio de Janeiro e o segundo no Bahrain. Essas foram as viagens comerciais de inauguração do Concorde, o avião supersônico para transporte de passageiros.
E em 2019, o Concorde completou o jubileu do seu primeiro voo, ainda na fase de testes: no dia 2 de março de 1969, o piloto Andre Turcat, acompanhando de um co-piloto e dois engenheiros, saiu de Toulouse e fez um voo teste de 27 minutos. Em outubro de 2003, o último Concorde pousou, para nunca mais voar novamente.
Concorde voando em 1996. Foto: Por John Selwa / Shutterstock
Os mais de 50 anos de história do Concorde
Uma história de recordes impressionantes. O Concorde atingiu a maior altitude de um avião lá em 1973, com 20 mil metros (a média de um voo transatlântico, até hoje, é 11 mil). Já a maior velocidade veio em 1974: Mach 2.23. Essa é a medida de velocidade do som e 1 representa a velocidade sônica. O Concorde era capaz de voar duas vezes mais rápido que o som – isso significa mais de 2100 km/hora num voo de cruzeiro.
Quando o Concorde foi projetado, em meados dos anos 1950, por um consórcio francês e inglês (que mais tarde acabaria formando a europeia Airbus), era plena Guerra Fria. Os russos também tinham planos para um avião supersônico, o Tupolev Tu-144, que chegou a ser operado comercialmente num curto espaço de tempo, mas acabou sendo aposentado depois de dois acidentes.
A versão russa do avião supersônico. Por Nordroden / Shutterstock
O Concorde foi encomendado por diversas companhias aéreas. Mas entre o início do projeto, os testes e o começo da operação vieram a crise do petróleo, preocupações com os custos de operação e o impacto ambiental. Além disso, logo depois surgiram aeronaves subsônicas como o Boeing 747, que se provaram mais eficientes e de baixo risco. Com isso, na sua curta existência, foram fabricados apenas 20 jatos, utilizados somente por Air France e British Airways.
Fabricar um Concorde, em 1977, custava 23 milhões de libras, o equivalente a 140 milhões de libras hoje. O consumo de combustível na velocidade Mach 2 e a 18 mil metros de altitude era de 22 mil litros por hora. Além disso, seu momento mais ineficiente era a baixas velocidades, e com isso queimava 2 toneladas de combustível apenas no momento de taxiar na pista.
Recordes
O Concorde bateu os recordes de circunavegação da terra. Em 1992, no aniversário de 500 anos da viagem de Cristóvão Colombo, o Air France Concorde F-BTSD cruzou o mundo em 32 horas, 49 minutos e 3 segundos, partindo de Lisboa e parando para reabastecer 6 vezes, em Santo Domingo, Acapulco, Honolulu, Guam, Bangkok e Bahrain.
Em 1995, bateu o mesmo recorde na outra direção do globo. Partindo de Nova Iorque, em 31 horas, 27 minutos e 49 segundos cruzou a terra, parando em Toulouse, Dubai, Bangkok, Guam, Honolulu, e Acapulco.
No aniversário de 30 anos, em 1999, o Concorde já havia acumulado 920 mil horas de voo, sendo que dessas mais de 600 mil foram supersônicas.
Como era voar num Concorde
Cabine do Concorde. Por Anibal Trejo / Shutterstock
Um voo comercial comum leva oito horas entre Nova York e Paris. Já o Concorde fazia o trajeto em três horas e meia, voando a 18,300 metros. Como nenhuma outra aeronave civil voava tão alto assim, a rota do Concorde era exclusiva e seus passageiros praticamente não sofriam com turbulências, considerando que a essa altura há muito menos ventos de alta altitude. Segundo quem teve o privilégio de viajar num desses, dava para ver a curvatura da Terra pela janelinha.
“A única coisa que te diz que você está se movendo é quando ocasionalmente você está voando sobre aviões subsônicos e você pode ver todos aqueles 747s, a 20 mil pés abaixo de você, parecendo andar para trás. Eu entendo, estou indo 800 milhas por hora mais rápido do que eles. O avião é uma grande delicia de voar, ele é controlado belamente. E lembre-se que estamos falando de uma aeronave que foi desenhada no final dos anos 1950 até meados de 1960. Era absolutamente incrível. E aqui estamos nós, agora no século 21, e isso continua sendo único”
— John Hutchinson, Capitão do Concorde, “The World’s Greatest Airliner” (2003)
Um voo Paris – Nova York custava cerca 10 mil dólares. O avião, apesar de estreito e com cadeiras bastante simples se comparado às classes executivas de hoje, era inteiro “primeira classe”: o espaço diminuto para os passageiros era compensado com atendimento VIP desde o aeroporto, da partida à chegada, refeição luxuosa durante o curto voo e outros mimos para os felizardos: “No avião, o banquete continuava: assim que atingíamos a velocidade Mach 2, iniciava-se o serviço de bordo, com um almoço de três etapas e mais vinhos, champanhe, uísque”, disse Shoichi Iwashita, do blog Simonde.
Dentro da cabine. Por Marbury / Shutterstock
O último voo do Concorde
Em julho de 2000, o voo Air France 4590, que partiu de Paris para Nova York, caiu ainda na França, em cima de um hotel em Gonesse. Morreram 100 passageiros, 9 membros da tripulação e 4 pessoas em terra. Esse foi o único acidente fatal envolvendo o Concorde, que até então era considerado muito seguro por não ter causado a morte de nenhum passageiro desde o início das operações.
A explicação para a tragédia foi uma peça que caiu na pista durante um voo da Continental Airlines. Durante a decolagem do Concorde, que ocorreu em seguida, a tal peça furou o pneu do avião supersônico, que explodiu, atingindo o tanque de combustível e iniciando um incêndio, que levou o avião a cair.
Toda a polêmica entorno do acidente, fora os altos custos para manter os Concordes e o fato de que a Airbus tinha tomado a decisão de não produzir mais peças da aeronave para troca, fizeram com que, em abril de 2003, a Air France e a British Airways anunciassem que iriam aposentar o avião.
O último voo aconteceu no dia 24 de outubro de 2003, numa jornada de despedida que saiu de Nova York para Londres, levando como passageiros antigos pilotos da aeronave.
Atualmente, há 18 Concordes espalhados no mundo como peças de museu: na Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, Barbados e França. Eu tive a chance de ver dois Concordes de pertinho no museu Aeroscopia, em Toulouse: um fica na entrada e outro dentro do prédio – e dá para entrar na aeronave.
Saiba mais: O que fazer em Toulouse, na França
O futuro da aviação supersônica?
Nunca mais existiu um avião comercial como o Concorde e hoje é impossível cruzar um oceano em três horas, a não ser que você esteja num jato militar.
Ao mesmo tempo, temos que reconhecer que os custos desse tipo de aeronave para o nosso planeta são mais caros do que podemos pagar. Em 1995, um cientista americano chamado David Fahey avisou que uma frota de 500 aviões como o Concorde – que produzem gazes muito tóxicos em sua combustão – poderia causar uma queda de 2% nos níveis da camada de ozônio. É preciso ter em mente que cada 1% de diminuição da camada leva ao aumento da incidência de câncer de pele em 2%.
Turbinas do Concorde. Por Piotr Przyluski / Shutterstock
Isso sem contar a poluição causada pela quantidade de combustível necessário para esse tipo de avião voar, que implica no aumento expressivo do CO² na atmosfera, contribuindo para o aquecimento global e outros efeitos negativos da poluição do ar. E ainda, o problema da poluição sonora.
Um novo Concorde só seria possível com o desenvolvimento de energias renováveis, eficientes e não poluentes. E, também, da diminuição dos custos de produção para justificar a operação. Há um projeto da NASA para uma aeronave que atenderia essas especificações. Resta saber se e quando o protótipo sairia do papel.
Inscreva-se na nossa newsletter
A foto do Flight Deck é de um Airbus A300 e não do Concorde.
Interessante
Parabéns pelo texto. Mas há uns equívocos. O TU-144 não foi uma “versão russa” do Concorde. Apesar das semelhanças, são aeronaves distintas, tanto em tamanho, como em alcance. E esse avião entrou em atividade comercial sim, na rota Moscou-Alma Ata, apesar de ter sido um fracasso.
Logo, não foi o Concorde “o único avião supersônico para transporte de passageiros que já existiu.” O TU-144 sofreu dois acidentes fatais: um em Paris, em 1973, no show aéreo, e outro após ter sido retirado da rota comercial, realizando apenas voos do tipo “correio supersônico”, e 1978.
Obrigada por apontar os equívocos Manoel. Vou corrigir no texto!
Luiza, por gentileza, informe se já tem alguma viagem programada para 2020. Quero me organizar. Estou de férias mas infelizmente ainda não os conhecia.
Um abraço
Roseli
Oi Roseli,
Não, não temos nenhuma viagem para 2020, ainda. Mas assim que tivermos avisaremos!
E ainda tem gente que acha que a terra é plana.
hahahah melhor comentário